Olimpíadas na Grécia Antiga
Religião e rivalidade: as Olimpíadas na Grécia Antiga
Do uso político dos jogos à diversidade de atrações e origens dos competidores, de torcedores descontrolados ao espírito competitivo, já estava tudo lá na Grécia antiga, nas Olimpíadas originais. Realizadas ao longo de quase 1000 anos, sempre no santuário de Olímpia, os primeiros jogos foram a inspiração dos eventos atuais
A identidade grega
Em 2008, quando promoveu a Olimpíada de Pequim, a China não economizou recursos para se mostrar ao mundo como potência, dentro e fora do esporte. “Os Jogos são uma chance para o resto do mundo descobrir o que a China realmente é”, disse à época o presidente do Comitê Olímpico Internacional, Jacques Rogge. Quatro anos depois, na vez de Londres, os britânicos repassaram vários séculos de cultura e história em uma abertura que teve de Shakespeare às Spice Girls. Quando o Rio foi anunciado como sede dos Jogos, em 2009, o então presidente Lula disse que “os mesmos que pensavam que nós não tínhamos condições de governar esse país vão se surpreender com a capacidade do país de fazer uma Olimpíada”.
Traço marcante das Olimpíadas modernas, o uso do evento olímpico como vitrine de cultura, progresso e grandeza não é uma ideia recente. As Olimpíadas originais, na Grécia antiga, tinham como um de seus propósitos exaltar valores e aspectos culturais da Grécia, incluindo características como língua, costumes e religião.
A motivação tinha muito de geopolítica: o mundo helênico se expandia Mediterrâneo afora, alcançando uma diversidade grande de lugares e povos. No seu auge, no chamado Período Clássico, chegou a contar com 1.500 cidades-estado, da Península Ibérica até onde hoje fica o Afeganistão. “Era nesse contexto que os símbolos que evidenciavam as características comuns eram ressaltados. Caso dos Jogos Olímpicos e de outros similares a eles”, observa o professor Gilberto da Siva Francisco, que leciona História Antiga na Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) e é pesquisador associado à École Française d'Athènes.
A ideia de “ser grego” ganhou força à medida que cresciam os contatos com outros povos. Nesse tempo não havia um país chamado Grécia (a ideia de nação ainda não existia), apenas cidades-estado (“pólis”). Mesmo distantes geograficamente, estavam unidas pela mesma língua, os mesmos deuses e alguns costumes e práticas artísticas. Os Jogos eram, assim, “a ocasião em que gregos de todas as partes do Mediterrâneo se reuniam para celebrar seus laços de identidade e para competir”, explica Elaine Hirata, professora associada do Museu de Arqueologia e Etnologia da Universidade de São Paulo.
O que definia esses laços mudou com o tempo: se antes eram mais baseados em características étnicas, depois se tornaram mais culturais. “A participação nos Jogos Olímpicos era um exercício constante de etnicidade, considerando a avaliação de quem poderia ou não participar, e a própria compreensão do que significava ser grego, o que poderia mudar de época para época”, observa Francisco.