Divida do Estado do RS

Divida do Estado do RS

"Nossa dívida do Estado já estaria paga", diz especialista. Saiba por que

Josué Martins, presidente do sindicato de auditoria públicos externos, diz que povos e nações são exploradas pagando juros excessivos de dívidas públicas e que parte delas nem existe

 

"Nossa dívida do Estado já estaria paga", diz especialista. Saiba por que Deni Zolin/Agencia RBS

Foto: Deni Zolin / Agencia RBS

Josué Martins, presidente do Sindicato dos Auditores Públicos Externos do Tribunal de Contas do Estado, é um dos coordenadores do grupo da chamada Auditoria Cidadã, que defende uma auditoria das dívidas do Estado e da União. Ele deu palestra em Santa Maria, na sexta à tarde, a convite da Sedufsm. O colunista Deni Zolin fez uma entrevista com ele, que avalia que estamos pagando dívidas que nem temos e que o Estado e o país são explorados. Assim, falta dinheiro para o essencial. Confira abaixo os principais trechos da entrevista:

Diário - Alguns países já fizeram auditoria da dívida?
Josué Martins - Sim, no Equador, o resultado foi que a dívida diminuiu em 70%. Porque o que é a essência da auditoria é verificar dentro de aquilo que se alega como devido pelo Estado, o que é realmente devido. Afastar dali o que é ilegal, irregular, dívida prescrita. O presidente Rafael Correa montou um grupo de especialistas. Nos títulos do governo, eles constataram que o Equador não devia mais nada. Tinha dívida prescrita, dívida cujo contrato não apareceu. Não se sabia o que estava se pagando, então o Correa chamou os credores e disse “Vou pagar 30% do valor de face desses títulos”, e 95% dos credores aceitaram. Só 5% discutem na Justiça.

Diário - Mas como o Equador estava pagando dívidas e juros, se nem sabia ao certo o que devia?
Martins - Essa que é a questão. O que tem de mais pesado no mundo da corrupção são as altas finanças. Então, é certo que alguém estava ganhando alguma coisa com isso. Espoliando a nação equatoriana.

Diário - E aqui no Brasil e no Rio Grande do Sul, acontece a mesma coisa?
Martins - Aqui no Estado, é diferente. Ele tem um contrato com a União, um contrato pesado. De 1994 a 1998, a dívida do Estado cresceu algo como R$ 20 bilhões e, em 98, fizemos o contrato com a União, e ela se estabilizou, mas lá em cima, na ordem de R$ 50 bilhões (em valores atualizados). No ano passado, ela ficou em R$ 54 bilhões. Esses contrato de 98 consolidou essa dívida que cresceu, a União assumiu a dívida do Estado e disse “Eu vou assumir, vou pagar os credores de vocês, e vocês vão me pagar por ter esse contrato”. Resumo da ópera, esse contrato tem um limite de pagamento mensal, de 13% do orçamento. A diferença desse contrato é que no final, depois de 30 anos, fica um resíduo. Ele não consegue pagar a prestação calculada. Bate nos 13%, e o que excede, vai para o resíduo. Hoje ele já é metade do que a gente deve. E quando chegar em 2028, não vai estar pago. A diferença é que vai ter mais 10 anos para pagar o resíduo, sem o limite dos 13%, o que será pior.

Diário - A renegociação de 1998 foi boa ou ruim?
Martins - Em 1999, os auditores fiscais do TCE fizeram uma relatório e disseram, tem problemas aqui. O principal é que o contrato tira a autonomia da gestão financeira do Estado, pelo volume de recursos que subtrai. De 91 a 97, gastamos com a dívida, 8% do Orçamento anual, em média. O contrato definiu 13%. Só ali subiu 5 pontos. De 98 a 2014, a média foi 16%. Então, dobrou o gasto com a dívida. O contrato de 98, que era para nos ajudar, está nos garoteando. Foi péssimo. Em 2013, o que a União arrecadou de todos os Estados com as dívidas foi R$ 28,59 bilhões. O que a União gastou com a dívida que assumiu foi de R$ 81 milhões, é milhões, não bilhões. É lucro de 84.862% de lucro à União.

Diário - O Estado deve quanto para a União?
Martins - Para a União, R$ 47,1 bilhões, no final de de 2014. A dívida total do Estado é de R$ 54,1 bilhões. Disso aí, já se sabe que tem uma irregularidade grave, que é a de juros sobre juros. Isso significa R$ 7,1 bilhões. Então, essa dívida de R$ 47,1 bi baixaria para R$ 40 bilhões. Não é pouco.

Diário - Tem mais outras irregularidades?
Martins - Aí tem de auditar. É preciso identificar por que, de 1994 a 1998, ela subiu de R$ 30 bilhões para R$ 50 bilhões (valores atualizados), pois isso impacta no resto. O Estado está pagando de custo da dívida, de R$ 240 milhões a R$ 260 milhões por mês.  O problema desse contrato com a União é que ele é corrigido pelo IGPDI mais 6%. A gente tem dito que numa relação de parceria entre entes federados, não cabe lucro, e esses 6% são lucro. Tem de tirar isso e recalcular o contrato desde o início, pois dá juro sob juro e mudar o IGPDI. De 1999 a 2014, cresceu 876%. Disso, 601% são juros, que a União lucrou sobre o Estado. A gente defende que se pague só o IPCA desde o início, o que dá 178%. Se isso for aplicado, e tem um projeto de lei no Senado, dos três senadores gaúchos, nós já teríamos pago a nossa dívida com a União em 2013 e teríamos crédito de R$ 5,9 bilhões.

Diário - Qual a chance de esse projeto ser aprovado?
Martins - Só tem chance de acontecer se tiver uma ampla mobilização nacional, pois o governo federal não tem feito nada em relação a isso. Quanto à dívida da União, o Orçamento Geral da União executado em 2014 foi de R$ 2,168 trilhões, sendo que R$ 978 bilhões foi o que a União gastou em 2014 para pagar com juros e amortização da dívida, que é de R$ 3,7 trilhões. Dá quase 45% do Orçamento só com os gastos com a dívida. E daí vem toda a discussão com a previdência, mas os gastos com a previdência são de 21,76% do Orçamento. Com saúde, os gastos foram de 3,98%, e com educação, de 3,73%.

Diário - Por que a União não faz o que o Equador fez?
Martins - Porque está se tratando aqui daquilo de mais poderoso no mundo, que é o setor financeiro. Ele domina de forma avassaladora, comanda governos e formadores de opinião, financia campanhas. Esse é o enfrentamento de que estamos falando. A auditoria cidadã divulga isso, porque é preciso que a população tome consciência do que significa a opressão da dívida sobre nações. Hoje, a grande discussão aqui é o superávit primário. Educação? Saúde? Saneamento? Não. Então, tudo em função do superávit primário para pagar a dívida.

 

http://zh.clicrbs.com.br/rs/noticias/noticia/2015/11/nossa-divida-do-estado-ja-estaria-paga-diz-especialista-saiba-por-que-4897295.html




ONLINE
14