Temer cai?

Temer cai?

 

Por que Temer não cai?

O vazio das ruas, é claro, aumenta as chances de o pemedebismo se manter no poder. O fato de Temer possuir hegemonia no Congresso assegura ainda mais isso, permitindo que o pemedebista continue impondo goela abaixo a agenda neoliberal

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João Miranda*, Pragmatismo Político

A última pesquisa Ibope mostra que o governo Temer tem aprovação de apenas 5% dos brasileiros e a maioria acha que seu governo é pior do que o de Dilma Rousseff. O histórico desse Instituto aferiu também que essa é a pior aprovação que um presidente já teve desde o fim da ditadura.

Motivos para a queda de Michel Temer não faltam: altos índices de rejeição; destruição de direitos trabalhistas; flagrantes de corrupçãoaumento de impostoscongelamento dos investimentos sociais por duas décadas; deturpação da educaçãocrise econômica.

A versão barata do Nosferatu não pode, então, nem sair da tumba, tamanho repúdio que inspira. E não cai. Por quê?

Numa crise tudo se concentra; todas as mudanças ocorrem quase que instantaneamente. Alguns dos componentes dessa soma que podem ser apontados para explicar a permanência desse governo no poder são: a hegemonia de Temer em relação as três maiores bancadas no congresso – as chamadas “BBB” (Boi, Bala e Bíblia); o papel da Lava Jato tanto para o sistema político, quanto para a população; o recuo de uma grande parcela da oposição (sindicatos e movimentos sociais).

As principais frentes parlamentares da Câmara dos Deputados, que se organizam para defender temas ligados ao agronegócio, à segurança pública e à religião, dispõem de quase a metade dos votos da Câmara. Além de serem em maior número, são capazes de formar maioria com tranquilidade, por ocuparem postos-chave na estrutura do poder da Casa. Temer é líder dessas três bancadas. Para assegurar esse apoio, o peemedebista tem reforçado o seu comprometimento com as necessidades do agronegócio, da indústria do armamento e das igrejas-empresas neopentecostais; ele recebeu mais de uma centena de deputados, distribuiu emendas parlamentares, atendeu a reivindicações, além de ter dado mostras de que poderá apoiar outras demandas históricas dos grupos.

Os dados do sistema de acompanhamento do orçamento federal mostram que, enquanto que nos meses de janeiro a maio foram liberados 88,4 milhões de reais em emendas aos parlamentares, em junho e julho a cifra ultrapassou 3,4 bilhões de reais. Exemplos disso são os deputados Altineu Côrtes (PMDB-RJ) e Paulo Pereira da Silva (SD-SP).

Juntos, receberam a liberação de 14 milhões de reais em emendas nos últimos meses – 8 milhões para Côrtes e 6 milhões para Silva. Temer, então, mexe mundos e fundos para atingir o “número mágico” de 342 votos em seu benefício na votação que ocorreu nesta quarta (02) no Congresso. Tudo a peso de ouro (o nosso ouro).

A hegemonia de Temer é reforçada pelo fato de que grande parte dos parlamentares estão sendo investigados pela Lava Jato. Diante das investidas da Justiça, é mais interessante para o sistema político manter na cadeira da presidência alguém que também está numa das listas da operação, porque aquele que está sendo investigado fará o que for possível, enquanto presidente, para barrar as investigações, como Temer faz. Logo, será suicídio dos investigados se chegar ao comando do Executivo alguém que não está sendo investigado – e que, por isso, não fará nada para conter a Lava Jato.

Além de possuir esse papel para com o sistema político, a operação Lava Jato tornou-se uma válvula de escape para a crise de representação. Atualmente, essa operação atende à grande parte dos anseios de mudança e da rejeição generalizada da política que percorrem de alto a baixo a sociedade brasileira. Isso explica o porquê do “sumiço” das pessoas que se manifestam com a camisa da CBF e que realizam os chamados “panelaços”; hoje quase não se vê mais manifestações delas, diferentemente de 2015, quando esses manifestantes inundaram as ruas em prol da queda de Dilma. O fato é que a promessa de que “tudo vai ficar bem” após a queda da petista não se cumpriu. Tudo piorou.

Assim, após essa experiência do impeachment, a desconfiança em relação ao sistema político aumentou enormemente, pois uma parcela da população, sobretudo os apoiadores do impeachment, se sentiu enganada. Um vazio de representação foi ampliado, então, e quem em grande medida o ocupou foi a Lava Jato.

A desmobilização da população também se deve a postura das organizações da sociedade civil, como muitos sindicatos e movimentos sociais que se submetem mais aos interesses dos grandes partidos, do que os da sociedade.

Muitos desses partidos, visando as eleições de 2018, preferem não organizar protestos contra Temer no momento em que está mais frágil. Consequentemente, aquelas organizações, por se submeterem a esses partidos, adotam a mesma posição, preferindo jogar o jogo dos poderosos, deixando o governo Temer definhar, ao invés de mobilizar a população para convocar eleições diretas e para o debate de um programa que não passe ao largo do crivo das urnas.

Diante das ruas vazias e com grande apoio das frentes parlamentares, provavelmente Temer continuará no poder até as eleições de 2018. Ou, então, caso caia, precisarão eleger indiretamente alguém que também esteja sendo investigado, como o Rodrigo Maia, para que a obstrução da justiça continue. O mesmo se aplica para 2018. Para os grupos políticos investigados, não importa muito a sigla de quem será eleito para ocupar a cadeira de presidência, desde que seja alguém que também está sendo investigado pela Lava Jato e que, para se salvar, fará algo para barrá-la, beneficiando consequentemente aqueles mesmos grupos políticos.

A questão, então, é que temos de um lado do espectro um sistema político-institucional composto em sua maior parte por indivíduos que estão mais preocupados em aniquilar a Lava Jato para salvar a pele; do outro, uma parcela considerável da população insatisfeita que deposita as suas esperanças nessa mesma operação; e, no meio, a própria operação que tem como característica fundamental a constante desestabilização do sistema político.

As organizações da sociedade civil poderiam ter o papel fundamental de mobilização da população para pressionar os políticos a promoverem eleições diretas. Mas, essas organizações, como a CUT, preferem estar atreladas aos interesses dos poderosos e, por isso, recuam para que o candidato preterido pelo partido aliado tenha maiores chances em 2018. E os movimentos contra corrupção, como o MBL, não parecem preocupados em convocar recorrentes manifestações contra o atual governo.

Alguns movimentos isolados até tentam mobilizar a população, mas, por serem recentes e não terem uma organização em nível nacional, não conseguem convocar grandes atos; a transformação da Lava Jato em válvula de escape da crise dificulta ainda mais a construção de manifestações da mesma proporção que vimos em 2015 e 2013.

Por essas razões, é muito provável que as ruas só voltem a encher se a Lava Jato for aniquilada pelos grupos investigados.

O vazio das ruas, é claro, aumenta as chances de o pemedebismo se manter no poder. O fato de Temer possuir hegemonia no Congresso assegura ainda mais isso, permitindo que o pemedebista continue impondo goela abaixo a agenda neoliberal. Tudo isso evidencia que, além de eleições diretas, do debate de um novo programa e de uma reforma política, precisamos que a nossa cultura política mude num sentido que permita que as organizações da sociedade não se submetam mais ao jogo dos grandes partidos. Muitos destes se consideram “donos dos portões institucionais” e simplesmente afirmam que não há alternativa à institucionalidade e que todo o impulso vital da base da sociedade deve ser canalizado para a eleição dos velhos nomes da política.

*João Miranda é acadêmico de História na Universidade Estadual de Ponta Grossa, foi colunista do Jornal da Manhã e colaborou para Pragmatismo Político.

 

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