Sobre o Pacote do Sartori
Estudo preliminar da Assessoria Jurídica do CPERS/Sindicato sobre o Pacote do Sartori.
O Governo do Estado encaminhou para a Assembleia Legislativa um conjunto de projetos de restruturação do Estado que preveem a fusão de Secretarias, a extinção de Fundações, Autarquias e Companhias Públicas, aumento da Contribuição Previdenciária, além de uma série de medidas que atingem diretamente os direitos dos servidores públicos estaduais.
Estão previstos nos projetos a fusão de Secretarias, a extinção de 9 Fundações (CIENTEC, FCP – TVE, FDRH, FEE, FEPAGRO, FEPPS, FIGTF, FZB E METROPLAN), a extinção de uma Companhia (CORAG) e a extinção de uma Autarquia (Superintendência de Portos e Hidrovias).
Entre os projetos está previsto também a retirada de exigência de plebiscito para a privatização da CEEE, Sulgás, CRM, além da CESA que já passou por alteração legislativa retirando a necessidade de plebiscito para privatização ou federalização.
Inobstante as medidas neoliberais que alteram a gestão do Estado, os projetos atingem diretamente direitos dos servidores públicos estaduais como:
1 – Mandato Classista
Proposta de Emenda à Constituição nº 256/2016 – propõe a alteração do inciso II do art. 27 da Constituição Estadual no sentido de retirar garantia de remuneração dos servidores cedidos para as entidades sindicais.
A presente proposta visa única e exclusivamente o enfraquecimento da atividade sindical, atividade essa defendida e garantida no Estado Democrático de Direito, pois representa o equilíbrio entre empregado e empregador. A proposta de alteração neste momento de ataque aos direitos dos servidores demonstra claramente a intenção do Governo de enfraquecer a classe trabalhadora organizada que se encontra em enfrentamento com as políticas neoliberais destes governos que, através de pacotes de ajustes fiscais, busca implementar essa série de violações aos direitos já conquistados dos trabalhadores, vide PEC 55 (241), PLC 257 entre outros.
O impacto financeiro de tal medida é tão insignificante no orçamento do Estado que a proposta apresentada não representa outra coisa senão a perseguição e enfraquecimento dos movimentos sindicais que tanto lutam contra todos os Governos que atacam os direitos da classe trabalhadora. Em um universo de 300 mil matrículas no Estado, a retirada da remuneração de trezentos servidores representa economia insignificante na folha de pagamento do Estado.
2 – Licença Prêmio
A Proposta de Emenda à Constituição nº 242/2015 volta para a pauta da Assembleia, agora em regime de urgência (para votação em 30 dias). Tal emenda extingue a licença-prêmio dos servidores estaduais e cria a possibilidade de afastamento, por meio de licença para participação de curso de capacitação profissional, por até três meses.
Na realidade, tal projeto extingue o direito dos servidores à licença-prêmio sob o pretexto de possibilidade de afastamento para capacitação profissional. No entanto, já há previsão legal de afastamento para qualificação profissional dos integrantes do magistério estadual, constante do art. 74, VIII da Lei 6672/74.
Por isso, a proposta do Governo apenas retira direitos dos servidores no momento em que extingue a licença-prêmio criando, em contrapartida, direito que já existe para os integrantes do magistério.
De se ressaltar, ainda, que a Licença para Qualificação Profissional constante do art. 74, VIII da Lei 6672/74 por anos não é respeitada, deixando a administração de concedê-la por critérios de conveniência e oportunidade. Da mesma forma a licença-prêmio, em que servidores chegam a se aposentar sem conseguir usufruir o direito que lhes é assegurado, em razão de sucessivas negativas da administração.
Da forma como proposta a alteração legislativa, não resta claro o direito à concessão da licença para capacitação profissional, descrita como “possibilidade de afastamento”, deixando margem para a administração não conceder o direito, assim como ocorre hoje com a licença-prêmio e a licença para qualificação profissional, que não tem concessão automática e garantida na lei.
3 – Retirada de Vantagens Temporais
Proposta de Emenda à Constituição nº 258/2016 – a proposta extingue os adicionais de tempo de serviço (triênios, quinquênios e adicionais de 15 e 25%) pois retira da Constituição a autorização que assegura a concessão das vantagens temporais. Tal alteração atinge todas as vantagens e adicionais por tempo de serviço, como os triênios antes referidos.
No entanto, ficam assegurados os adicionais àqueles servidores que já estão no período de formação do direito.
Na mesma proposta foi incluído exigência de lei específica para a concessão e o pagamento de auxílios ou quaisquer parcelas de caráter indenizatório a servidores públicos e a membros dos poderes. Tal alteração retira a autonomia dos poderes na concessão de pagamentos administrativos, principalmente aqueles realizados pelos poderes Judiciário, Tribunal de Contas e Ministério Público no que se referem a verbas indenizatórias deferidas para seu próprio benefício, desviando do caminho enfrentado pela grande maioria dos servidores, principalmente os do Poder Executivo, que seguem a via legal do RPV e Precatório.
4 – Pagamento de salário e 13º
Proposta de Emenda à Constituição nº 257/2016 – a presente proposta revoga o art. 35 da Constituição Estadual que diz o seguinte:
Art. 35. O pagamento da remuneração mensal dos servidores públicos do Estado e das autarquias será realizado até o último dia útil do mês do trabalho prestado. (Vide ADI n.º 657/STF, DJ de 28/09/01)
Parágrafo único. O pagamento da gratificação natalina, também denominada décimo terceiro salário, será efetuado até o dia 20 de dezembro.
Ou seja, com a proposta apresentada o Governo deixa de ter data limite para o pagamento dos salários e da gratificação natalina. De acordo com o previsto pelo Governo na apresentação dos projetos, os pagamentos seriam feitos em datas diferentes levando-se em consideração as diferentes faixas de valor e quebrando a isonomia entre os servidores públicos. Da mesma forma, retira a obrigatoriedade de pagamento do 13º salário até o dia 20 de dezembro, sem fixar data limite para o pagamento do mesmo.
Muito embora o Governo tenha apresentado calendário de pagamento em datas distintas o projeto não prevê qualquer data limite para o pagamento, ficando a mercê da vontade do Sr. Governador o pagamento dos salários dos servidores.
Em relação à gratificação natalina a situação é mais grave. Isso porque, retira a data de 20 de dezembro da Constituição Estadual e não estabelece qualquer data limite para pagamento. Conforme apresentação do Governo, a metade do valor seria pago até 20 de dezembro, ficando o pagamento da outra metade para até o dia 30 de novembro do ano seguinte.
Tal proposta é completamente ilegal e inconstitucional. Primeiro porque viola frontalmente o princípio do instituto da gratificação natalina, que é o pagamento de mais um salário justamente no mês de dezembro, como um bônus de natal. Segundo porque vai de encontro a Lei de Responsabilidade Fiscal Estadual que foi aprovada pelo próprio Governo Sartori, pois destina para o exercício seguinte uma obrigação prevista no orçamento do ano anterior.
5 – Contribuição Previdenciária
Projeto de Lei Complementar 252/2016 - Visa o aumento na contribuição previdenciária de todos os servidores de 13,25% para 14% e também a aplicação de teto constitucional quando da percepção cumulativa de benefício de pensão com vencimentos e proventos.
A presente proposta altera o artigo 10-A da Lei 13.758/2011, passando a contribuição previdenciária dos servidores do Estado para 14% da remuneração. Tal mudança representa um aumento na tributação dos salários dos servidores que além do congelamento salarial dos últimos anos e dos sucessivos parcelamentos, passará a sofrer com a redução salarial na ordem de 1% do total da remuneração.
Resta proposto, também, a alteração do art. 18 e 19 da Lei 13.758/2011, estendendo para os demais poderes (Executivo, Judiciário, Legislativo, Ministério Públcio, Defensoria Pública e Tribunal de Contas) a responsabilidade pelas contribuições mensais de seus servidores assim como garantidores das obrigações do Regime Financeiro de Repartição Simples e de Capitalização.
Além da alteração do percentual da contribuição previdenciária, o projeto prevê a criação de uma taxa de administração para custeio, organização e funcionamento do Instituto. No entanto, o projeto não trata do valor ou percentual da referida taxa, deixando para posterior fixação através de decreto.
Outro ponto do projeto é o que trata da cumulação de pensão com vencimentos ou proventos, o qual ficou limitado ao teto previsto no art. 33, §7º da Constituição Estadual, ou seja, ao valor do subsidio mensal de Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado.
6 – Alteração da estrutura do Estado
Projeto de Lei nº 247/2016 – dispõe sobre a estrutura administrativa do Estado.
O presente projeto trata da alteração de algumas Secretarias, dentre elas a Secretaria da Educação. No entanto, entre as atribuições destinadas à Secretaria da Educação restou incluído na letra “e” do anexo II – Secretarias de Estado, a finalidade de “promover e fortalecer o regime de colaboração entre os entes federativos e demais instituições públicas e privadas”.
Muito embora a inclusão de tal dispositivo no projeto de alteração administrativa do Estado pareça ser meramente formal representa, na verdade, a intenção do Governo do Estado de fortalecer e incentivar a participação privada nas atividades fins como a educação.
Em meados de 2016 o Governo encaminhou para a Assembleia o projeto nº 44/2016, que trata da participação de Organizações Sociais privadas nas atividades fins ligadas ao ensino. Após a rejeição por parte de alunos com a ocupação de escolas e com a deflagração de greve da categoria, restou acordado tanto com os alunos quanto com o CPERS/Sindicato em acordo de final de greve, que tal projeto não seria colocado em votação.
Causa estranheza, portanto, a inclusão de dispositivo legal que obrigue a Secretaria da Educação a promover a implementação de políticas de incentivo à atividade privada no ensino público.
7 – Contagem de tempo de serviço
Proposta de Emenda Constitucional nº261/2016 - Altera o artigo 37 da Constituição do Estado do Rio Grande do Sul
O texto em vigor do referido artigo é o seguinte:
Art. 37. O tempo de serviço público federal, estadual e municipal prestado à administração pública direta e indireta, inclusive fundações públicas, será computado integralmente para fins de gratificações e adicionais por tempo de serviço, aposentadoria e disponibilidade. ( grifos nossos)
Parágrafo único. O tempo em que o servidor houver exercido atividade em serviços transferidos para o Estado será computado como de serviço público estadual.
O texto da proposta de emenda é o seguinte:
Art. 37. O tempo de contribuição federal, estadual ou municipal será contado para efeito de aposentadoria e o tempo de serviço para efeito de disponibilidade.
Parágrafo único. A lei não poderá estabelecer qualquer forma de contagem de tempo de contribuição ficto. ( grifos nossos)
A justificativa apresentada pela PEC utiliza fundamento relacionado ao regramento federal que tem como referência o tempo contribuição para aposentadoria para, na verdade, suprimir a possibilidade de utilização de tempo de serviço em outros entes federados para fins de aquisição de vantagens temporais.
Ou seja, se é verdade que a Constituição Federal determina que se considere o tempo de contribuição para fins de aposentadoria, não é verdade que exclua a possibilidade do tempo de serviço em entes diversos para fins de aquisição de vantagens temporais.
Na verdade, o que o texto proposto pretende é alterar o próprio objeto do artigo 37 fazendo com que deixe de regrar o computo de tempo para vantagens temporais para regrar o tempo de contagem do tempo de contribuição para fins de aposentadoria, suprimindo a primeira matéria de sua redação.
Por força no disposto na Carta Federal os tempos contribuição públicos e privados são contados reciprocamente, o que torna a emenda dispensável e deixa claro que o objetivo do Governo ao propor a emenda é a limitação da aquisição das vantagens temporais.
Além dos projetos analisados, que dizem respeito diretamente aos Servidores Públicos civis, outros projetos foram apresentados pelo Governo do Estado. São eles:
Projeto de Lei 214/2015
Introduz modificação na Lei nº 8.820, de 27 de janeiro de 1989, que instituiu o Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação – ICMS.
A apropriação de créditos fiscais presumidos prevista nesta Lei ou em regulamento fica limitada, ao valor correspondente a 70% (setenta por cento) do total dos créditos fiscais presumidos a apropriar.
Projeto de Lei 240/2016
Extingue a Fundação Instituto Gaúcho de Tradição e Folclore - FIGTF e a Fundação Estadual de Pesquisa Agropecuária – FEPAGRO, representando a demissão de diversos servidores.
Projeto de Lei 301/2015
Extingue a Fundação Estadual de Produção e Pesquisa em Saúde – FEPPS, representando a demissão de diversos servidores.
Projeto de Lei 241/2016
Altera a Lei nº 10.996, de 18 de agosto de 1997, que estabelece benefício ao servidor integrante dos órgãos operacionais da Secretaria da Justiça e da Segurança, ou ao seu beneficiário, na ocorrência dos eventos ”invalidez permanente, total ou parcial, ou morte”, ocorridos em serviço.
Projeto de Lei 242/2016
Altera a Lei nº 14.644, de 18 de dezembro de 2014, que institui o Diário Oficial Eletrônico do Estado como meio oficial de comunicação dos atos do Estado do Rio Grande do Sul.
Projeto de Lei Complementar 243/2016
Introduz modificação na Lei Complementar nº 10.990, de 18 de agosto de 1997, que dispõe sobre o Estatuto dos Militares Estaduais, e dá outras providências. A proposta prevê a vedação de averbação da licença especial em dobro, porquanto trata-se de tempo ficto. Ainda, a proposta eleva a idade máxima para reserva compulsória e para a reforma. Outra mudança é a exigência de no mínimo vinte e cinco anos de efetivo serviço militar como condição para a passagem à reserva. Ainda, a proposta extingue a promoção na reserva dos soldados e sargentos sem estabilidade na data da aprovação da Lei e aos novos militares estaduais.
Projeto de Lei 244/2016
Dispõe sobre a extinção da Companhia Rio-grandense de Artes Gráficas – CORAG, gerando a demissão de diversos servidores.
Projeto de Lei Complementar 245/2016
Introduz alterações na Lei Complementar nº 13.259, de 20 de outubro de 2009, que dispõe sobre o Quadro Especial de Servidores Penitenciários do Estado do Rio Grande do Sul, da Superintendência dos Serviços Penitenciários – SUSEPE –, criado pela Lei nº 9.228, de 1º de fevereiro de 1991.
Projeto de Lei 246/2016
Autoriza a extinção das seguintes fundações de direito privado da Administração Pública Indireta do Estado do Rio Grande do Sul, gerando a demissão de diversos servidores:
- Fundação Zoobotânica do Rio Grande do Sul, criada a partir de autorização prevista na Lei nº. 6.497, de 20 de dezembro de 1972
- Fundação de Ciência e Tecnologia – CIENTEC, criada a partir de autorização prevista na Lei nº. 6.370, de 06 de junho de 1972
- Fundação de Economia e Estatística Siegfried Emanuel Heuser – FEE, criada a partir da autorização prevista na Lei 6.624, de 13 de novembro de 1973
- Fundação Piratini, criada a partir da autorização prevista na Lei 7.476, de 31 de dezembro de 1980 (TVE)
- Fundação para o Desenvolvimento de Recursos Humanos – FDRH –, criada a partir de autorização prevista na Lei nº 6.464, de 15 de dezembro de 1972
- Fundação Estadual de Planejamento Metropolitano e Regional – METROPLAN, criada a partir da autorização prevista na Lei n.º 6.748, de 29 de outubro de 1974
Projeto de Lei 248/2016
Cria a gratificação por desempenho de atividade prisional – GDAP- para os militares estaduais que prestam transitoriamente serviços no sistema prisional do Estado.
Projeto de Lei 249/2016
Visa a reestruturação da Agência Gaúcha de Desenvolvimento e Promoção do Investimento –AGDI. Com as alterações propostas, a AGDI passará a denominar-se “Escritório de Desenvolvimento de Projetos” e propõe-se a redução de diretorias, extinção de cargos comissionados e funções gratificadas, além da redução do valor da remuneração dos dirigentes.
Projeto de Lei 250/2016
Introduz modificações na Lei nº 14.519, de 8 de abril de 2014, que dispõe sobre o Plano de Classificação de Cargos e Vencimentos do Instituto-Geral de Perícias – IGP
Projeto de Lei 251/2016
Dispõe sobre a extinção da Superintendência de Porto e Hidrovias de Porto Alegre – SPH, altera a Lei n.º 10.722, de 18 de janeiro de 1996, gerando a demissão de diversos servidores..
Projeto de Lei Complementar 253/2016
Introduz alteração na Lei Complementar nº 13.757, de 15 de julho de 2011, que dispõe sobre o Regime Próprio de Previdência Social dos Servidores Militares do Estado do Rio Grande do Sul, institui o Fundo Previdenciário dos Servidores Militares – FUNDOPREV/MILITAR –
Projeto de Lei 254/2016
Altera a Lei nº 14.716, de 30 de julho de 2015, que dispõe sobre as diretrizes para a elaboração da Lei Orçamentária para o exercício econômico financeiro de 2016
Projeto de Emenda à Constituição 255/2016
O projeto de Emenda dispõe sobre a alteração do artigo 129 da Constituição do Estado do Rio Grande do Sul
Projeto de Emenda à Constituição 259/2016
O presente Projeto de Emenda à Constituição Estadual busca alterar as disposições constitucionais com o objetivo de retirar de seus comandos a norma que estabelece que a alienação, transferência do controle acionário, cisão, incorporação, fusão ou extinção da Companhia Estadual de Energia Elétrica – CEEE, Companhia Rio-grandense de Mineração - CRM e da Companhia de Gás do Estado do Rio Grande do Sul – SULGÁS somente poderão ser realizadas após manifestação da população expressa em consulta plebiscitária.
Projeto de Emenda à Constituição 260/2016
A presente Proposta de Emenda à Constituição propõe a modificação da atual forma de repasses dos duodécimos aos Poderes e Órgãos.
Conclusão:
O presente texto visa apenas destacar as principais alterações propostas pelo Pacote de Projetos apresentado pelo Governo do Estado. Os projetos mais abrangentes serão analisados com maior detalhamento no decorrer da tramitação tendo em vista a inclusão de emendas e destaques que alterem o texto principal.
Porto Alegre, 23 de novembro de 2016.
Buchabqui e Pinheiro Machado Advogados Associados
Assessoria Jurídica CPERS/Sindicato