Presidente desmoraliza juventude
"TEMOS UM PRESIDENTE QUE, ALÉM DE GOLPISTA, DESMORALIZA A JUVENTUDE", DIZ ESTUDANTE GAÚCHA
“Essa PEC afeta as crianças, os jovens, as futuras gerações que terão de contar com um serviço público ainda mais precário. Como uma reforma do Ensino Médio? O nome disso é sucateamento da educação pública. A crise educacional no Brasil não é uma crise, é um projeto. Como se isso não bastasse, temos um PL 867, que visa exterminar o pensamento crítico. Isso é inadmissível, intolerável, nós somos o futuro desse país”, disse a estudante Manuela Ribeiro, de 15 anos. “Contamos ainda com um presidente que, além de golpista, desmoraliza a juventude e diz que ela nem sabe porque está lutando. Nós sabemos o porquê de estarmos aqui, ele que não sabe o que é voto"
Por Fernanda Canofre, do Sul 21
No dia de paralisação geral que mobilizou classes de educação, segurança pública, transporte em todo o país, uma audiência pública convocada por deputados Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul lotou o auditório Dante Barone com professores, estudantes, movimentos sociais e deputados estaduais e federais do Estado, para discutir os efeitos da PEC 241 – agora 55, no Senado, a PEC do teto de gastos – e da MP 746 – que propõe a reforma do ensino médio em todo o país.
Uma fala, no entanto, levantou o auditório em aplausos e emocionou professores que assistiam. Manuela Ribeiro, estudante secundarista de 15 anos, do Instituto Sul de Pelotas, representou a primavera estudantil que ocupou quase 200 escolas no Estado em maio e junho deste ano. Manuela disse que lamentava a ausência dos deputados que apoiam a PEC 241, para que eles pudessem discutir e ouvir juntos os efeitos que a PEC pode ter na educação.
“Essa PEC afeta as crianças, os jovens, as futuras gerações que terão de contar com um serviço público ainda mais precário. Como uma reforma do Ensino Médio? O nome disso é sucateamento da educação pública. A crise educacional no Brasil não é uma crise, é um projeto. Como se isso não bastasse, temos um PL 867, que visa exterminar o pensamento crítico. Isso é inadmissível, intolerável, nós somos o futuro desse país”, afirmou Manuela. “Contamos ainda com um presidente que, além de golpista, desmoraliza a juventude e diz que ela nem sabe porque está lutando. Nós sabemos o porquê de estarmos aqui, ele que não sabe o que é voto. A gente conta também com uma mídia manipuladora e que não sabe praticar o jornalismo independente. Um MEC (Ministério da Educação) autoritário que pede sem nenhum motivo cabível a identificação dos alunos ocupantes. Um MEC que esquece de apontar os Institutos Federais no ranking do Enem (Exame Nacional do Ensino Médio). Um Congresso que permite essa afronta. Consertar o Brasil, senhores deputados, é tirar os direitos de quem não tem? Quem somos nós afinal? Aqueles que nos chamam de manipulados, quando a gente decide começar a participação na vida política, são os mesmos que dizem que jovem é emancipado, que jovem sabe o que faz quando o interesse é a redução da maioridade penal. Se decidam. E volto a afirmar, educação não é gasto, educação é investimento. Eu, como estudante secundarista, com orgulho participante da primavera estudantil, da primavera secundaristas, digo para vocês: isso é só o começo”.
Além dela, vários estudantes de Institutos Federais derem depoimentos do que significa o acesso ao ensino gratuito, profissionalizante e técnico que é oferecido nos Institutos Federais. “Os estudantes estão de olho aberto em relação aos retrocessos, não vamos parar de lutar, os estudantes sempre foram linha de frente e vamos continuar sendo”, disse o estudante Pedro Fogaça, do IFSul de Sapucaia do Sul, ocupado há 16 dias.
“Tempo de dificuldades” para educação pública
O diretor em exercício dos Institutos Federais do Rio Grande do Sul, Hamilton de Moura Figueiredo, apontou que se a lei orçamentária prevista para 2017 for implantada, os investimentos em educação profissional no Brasil devem sofrer um corte de R$ 1,6 bilhão. “Somos contra a PEC 241, agora 55, porque vai fazer retroceder a nossa educação à década de 90, período que eu era do movimento estudantil e não tínhamos um banheiro sequer funcionando na Universidade de Pelotas”, disse Hamilton durante a audiência.
“Estamos formando professores para avançar na qualidade da educação. Unificarmos o movimento é a grande questão que temos que colocar aqui hoje. Nós estamos com concursos congelados para o próximo período e isso também tem que ser pautado”, completou Figueiredo.
Os representantes dos IFSul presentes apontaram que, além do engessamento de investimentos propostos na PEC 55, o orçamento previsto hoje não seria suficiente para garantir o funcionamento dos institutos até o final do próximo ano. Segundo os professores, a aprovação da medida provisória da reforma do ensino também seria prejudicial, uma vez que afetaria o modus operandi e a “oferta” de alunos a quem as instituições são dirigidas.
Segundo a professora Carla Jardim, do Instituto Federal Farroupilha, a aprovação das duas medidas imporiam “um tempo de dificuldades para os IFs e para a educação pública brasileira”. “Entendemos que a MP 746 fere os princípios, restringe acesso a conhecimentos historicamente construídos pela humanidade, retrocede a educação integral de jovens e adultos, ainda que tenhamos ciência da necessidade de melhorias no sistema educacional brasileiro, sabemos que só pode com diálogo com toda a sociedade brasileira”, afirmou.
“Institutos Federais interessam ao setor privado”
Para a deputada federal Maria do Rosário (PT), integrante da Comissão Mista da Câmara que discute a medida provisória 746, a movimentação dos estudantes contra a política de cortes de gastos e a proposta de uma reforma sem debate é bastante “simbólica”. “Há um abandono das políticas públicas e as pessoas, sobretudo a juventude, vai percebendo que a retirada de direitos é a retirada da sua perspectiva de futuro (…) As pessoas estão dizendo, isso nos diz respeito e vocês não vão nos atropelar, não vão passar por cima dos direitos da população”, declarou em entrevista ao Sul21 antes da audiência.
Os Institutos Federais, tema central da audiência, recentemente tiveram a divulgação de seus resultados no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) atrasada e ficaram de fora do primeiro ranking divulgado pelo governo federal sobre o desempenho nacional. Rosário classificou o atraso como “absurdo”. “Há 12 anos tínhamos 140 escolas técnicas espalhadas pelo Brasil, hoje temos 650 campi, unidades de uma rede federal de educação profissional e tecnológica e essa rede é extremamente visada pelo setor privado, que pensa que educação é negócio, que pensa que educação é mercadoria. A educação é direito de todos e a Constituição diz isso”, disse.
Além de Rosário, entre outros parlamentares presentes na audiência estiveram: Tarcísio Zimmerman (PT), Edegar Pretto (PT), Stella Farias (PT), Nelsinho Metalúrgico (PT), Manuela D’Ávila (PC do B) e Pedro Ruas (PSOL). Os deputados também anunciaram uma frente parlamentar em apoio aos Institutos Federais do Rio Grande do Sul.
Manuela D’Ávila também comentou sobre a violência policial contra as manifestações desta sexta-feira (11), em Porto Alegre, autorizada pelo secretário de Segurança Pública, Cezar Schirmer.”Nós precisamos denunciar o uso da força que não recrimina o narcotráfico e a escalada da violência, ao mesmo tempo que bate em estudantes. Que Estado é esse que cala diante de traficantes e recrimina estudantes?”, protestou a deputada.
No final da audiência, uma carta-manifesto contra a PEC 241/55 e a MP 746 foi aprovada pelos presentes.