Por que ser professor?
Bernardo Caprara
Sociólogo e Professor
Certa vez, numa das minhas primeiras experiências como professor, ainda em dúvida quanto a minha capacidade de enfrentar o ofício, uma estudante parou o que fazia, olhou nos meus olhos e disse: “Já sei o que vou ser, vou ser professora”.
Espantado, meio atônito, fiquei uns segundos pensando no que responder. Pensei em alertá-la sobre todas as tretas cotidianas. Pensei em dizer pra ela que muita gente a olharia com desdém; que ela teria baixos salários e condições desumanas de trabalho; lidaria com o desinteresse geral muitas vezes; arriscaria a sua saúde física e mental; provavelmente apanharia da polícia ou seria chamada de doutrinadora; enfim, pensei em resumir pra ela que o bicho pega nessa profissão.
Pensei, ainda, que estava sendo muito pessimista e não poderia passar isso para aquela menina cujos olhos insistiam em brilhar. Pensei em dizer para ela que todos os dias o trampo ia ser diferente; que ela poderia dar boas risadas nas salas de aula lotadas de gente; que um sorriso, um abraço ou uma palavra de conforto sempre chegariam, mesmo que oriundos apenas de alguns dos seus alunos; pensei, sobretudo, em dizer para ela que a vida de professor ainda tem um sentido importante e é tomada por pequenas bonitezas.
Paralisado, só consegui perguntar: “Por que tu queres ser professora?”. A garota, com aquela objetividade adolescente, não titubeou no veredito simples e sincero. Tascou na lata aquilo que por vezes a gente não consegue mais sentir ou ver. “Ah, professor. Com alguns de vocês a gente voa longe, a gente sente o coração bater mais forte e tem vontade de entender o mundo. A gente se sente bem. Eu quero levar isso pra outras pessoas”.
E assim, como se contasse uma obviedade para um amigo, aquela estudante bateu o martelo e dirimiu as minhas dúvidas. Não tinha mais como fugir da docência.
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