Piso e o Pacto Federativo

Piso e o Pacto Federativo

O piso nacional do magistério e a reforma do pacto federativo

Publicado em Segunda, 05 Outubro 2015 00:14

Recentemente, as duas Casas do Congresso Nacional aprovaram propostas distintas de emendas à Constituição (PECs) sobre a reforma do pacto federativo. E para que a alteração pretendida pelo Congresso surta efeito, é preciso que uma única redação prevaleça na Câmara e no Senado.

Eis os textos aprovados:

PEC 84/2015 (proposta do Senado)

O Art. 167 da Constituição Federal passa a vigorar com a seguinte alteração:

Art. 167 ........................................

§ 6º A lei não criará qualquer encargo financeiro aos Estados, ao Distrito Federal ou aos Municípios, decorrente da prestação de serviços públicos, sem a previsão da correspondente transferência de recursos financeiros necessários ao seu custeio, ressalvadas as obrigações assumidas espontaneamente pelos entes federados oriundas de contratos ou instrumentos congêneres.” (NR

PEC 172/2012 (proposta da Câmara)

Art. 167 da Constituição Federal passa a vigorar com a seguinte alteração:

"Art. 167 .....................................

§ 6º A União diretamente ou através de qualquer ato normativo não imporá ou transferirá qualquer encargo ou prestação de serviços aos Estados, ao Distrito Federal ou aos Municípios sem a previsão de repasses financeiros necessários ao seu custeio.

§ 7º O disposto no § 6º aplica-se ao disposto nos arts. 7º, inciso V, e 198, § 5º, e aos demais pisos salariais cuja competência de definição foi delegada à União.

§ 8º É vedada a aprovação dos atos previstos no § 6º sem que exista dotação orçamentária no orçamento da União destinada ao seu pagamento, ou sem que estejam acompanhados de aumento permanente de receita ou redução permanente de despesa no âmbito federal que compense os efeitos financeiros da nova obrigação assumida pela União, com os atos só passando a vigorar, nos dois últimos casos, quando implementadas as medidas compensatórias.” (NR)

As duas PECs têm por objetivo limitar o poder da União em criar encargos para estados, DF e municípios, sem a devida transferência de recursos necessária para a manutenção das políticas públicas, como é o caso de pisos salariais de diferentes categorias profissionais regidos pela União.

A CNTE, por ocasião da aprovação da PEC 84, manifestou-se favorável à discriminação de fontes de receitas para as políticas públicas aprovadas pelo Congresso, a fim de garantir o efetivo cumprimento de cada uma delas nos diferentes entes federados, como é o caso do Fundeb (Lei 11.494) e do Piso do Magistério (Lei 11.738).

Neste momento de alterações constitucionais, faz-se importante enfatizar que o reajuste do piso do magistério não é determinado pela União, mas sim por uma legislação que compreende recursos das três esferas administrativas (União, Estados e Municípios), sendo, ainda, que a Lei 11.738 possui dispositivo para transferir recursos federais aos entes que não conseguirem cumprir o valor do piso definido nacionalmente. Ou seja, ela atende ao preceito do pacto federativo no sentido de equalizar as oportunidades de atendimento da política salarial do magistério.

Com isso, a CNTE reitera aos sindicatos da educação a necessidade de acompanharem os projetos de lei orçamentária, nos diferentes entes, para que os mesmos incluam a atualização do piso em 12,72% para 2016 - percentual recomendado à luz da interpretação dada pela Advocacia Geral da União ao parágrafo único do art. 5º da Lei do Piso do Magistério.

Sobre o fato de o piso do magistério não ser uma política de transferência de responsabilidade exclusiva da União para os demais entes, esclarecemos o que se segue:

A Lei 11.738 tem como fonte principal de financiamento o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb), instituído pelo art. 60 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), o qual é formado por receitas oriundas de estados, DF e municípios, acrescido de complementação da União de no mínimo 10% sobre o montante total do Fundo Contábil.

O Fundeb e o piso do magistério, este último previsto no art. 60, III, “e” do ADCT/CF, são regidos pelos princípios da solidariedade e da autossuficiência tributária, e pelo regime da cooperação federativa (art. 23, V da CF), estando seus financiamentos ancorados nas receitas próprias de estados, DF e municípios, em especial na subvinculação do Fundeb (20% de ICMS, LC 87/96, IPI-Exportação, IPVA, ITCMD, ITR, FPE e FPM), além da complementação da União. E esse entendimento foi primordial para que o Supremo Tribunal Federal julgasse totalmente constitucional a Lei 11.738, em sede da ADI 4.167, inclusive no tocante à vinculação do piso aos vencimentos iniciais de carreira (sem gratificações), assim como para denegar o pedido de liminar da ADI 4.848, que visa anular os efeitos do parágrafo único do art. 5º da Lei do Piso, que trata do critério de reajuste anual.

Ainda sobre o critério de atualização do piso, aprovado no mencionado art. 5º da Lei 11.738, é incorreto afirmar que a sua aplicação anual constitua uma transferência de ônus da União aos demais entes federativos. Desde 2010, o MEC tem apenas orientado os entes a praticarem percentuais de reajuste com base numa leitura controversa da Advocacia Geral da União, que sequer é publicada na forma de normativa do executivo federal (Portaria ou Decreto). Para a CNTE, a Lei contém prerrogativa autoaplicativa para o reajuste do piso, devendo o mesmo seguir o percentual de atualização do Custo Aluno do Fundeb, válido para o ano em curso. Contudo, a orientação da AGU/MEC tem sido no sentido de aplicar o percentual de crescimento do valor mínimo do Fundeb de dois anos anteriores - entendimento esse apoiado pelos governos estaduais e municipais.

Já o art. 4º da Lei 11.738 funciona como sustentáculo do pacto federativo para garantir a aplicação do piso do magistério em todas as unidades da federação, e condiciona o repasse federal à comprovação de insuficiência de recursos por parte dos entes. Para a CNTE, a regulamentação do art. 4º da Lei do Piso é ponto central da discussão do pacto federativo, uma vez que as PECs 84 e 172 não terão eficácia plena sobre a Lei 11.738. E para que essa regulamentação ocorra, é necessário pactuar critérios de gestão comuns a todas as redes públicas de ensino, a fim de garantir repasses federais sob a lógica da proporcionalidade.

Dentre os critérios para o repasse federal ao piso, a CNTE considera que os entes federados devam:

a) Justificar a incapacidade financeira, enviando ao Ministério da Educação solicitação fundamentada e acompanhada de planilha de custos comprovando a necessidade da complementação da União.

b) Comprovar a aplicação do percentual mínimo disposto no art. 212 da Constitucional Federal e no art. 60 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, incluída as receitas resultantes de transferências em manutenção e desenvolvimento do ensino.

c) Apresentar relação nominal dos profissionais vinculados aos órgãos que administram a educação escolar pública e seus vínculos diretos com as atividades das escolas ou da rede de ensino.

d) Manter relação de número de estudantes por profissionais da educação ou por carga horária com base na jornada escolar, nos termos de normativas emitidas por órgãos gestores do Sistema Nacional de Educação.

e) Ter aprovado Lei específica que designa recursos próprios de royalties do petróleo, de gás natural e outros hidrocarbonetos, nos termos mínimos definidos na Lei nº 12.858.

f) Preencher regularmente o Sistema de Informações sobre Orçamentos Públicos em Educação (Siope) e o Sistema de Plano de Carreira do MEC.

g) Cumprir o regime de gestão plena dos recursos vinculados para manutenção e desenvolvimento do ensino, em especial o cumprimento do § 5º do art. 69 da Lei 9.394 (LDB), mantendo o controle dos recursos educacionais em conta própria da Secretaria de Educação.

h) Dispor de plano de carreira para os profissionais da educação em lei própria e nos termos das diretrizes nacionais a serem aprovadas pelo Congresso.

7. Com relação à União, é de sua responsabilidade:

a) Observar, além dos requisitos elencados acima, o esforço fiscal dos entes federativos de acordo com o § 1º do art. 75 da LDB, a ser definido em regulamento, e as disposições correlatas que integram o Sistema Nacional de Educação.

b) Cooperar técnica e financeiramente com o ente federativo que não conseguir assegurar o pagamento dos vencimentos de carreira, de modo a assessorá-lo no planejamento e aperfeiçoamento da aplicação de seus recursos.

c) Dar início ao processo de discussão e aprovação do Custo Aluno Qualidade e do piso salarial dos profissionais da educação, previsto no art. 206, VIII da CF, em colaboração com estados, DF e municípios, para fins de cumprimento das metas 18 e 20 do PNE.

Ao longo dos anos, a atuação sindical da CNTE e de seus sindicatos filiados tem observado que o principal problema dos entes federados para honrarem o pagamento do piso salarial do magistério, numa estrutura digna de plano de carreira, consiste no desmantelamento da gestão educacional, em especial do quadro de pessoal - com muita gente contratada pela secretaria de educação e que nem sempre atua na área da educação. Também os desvios de verbas para outras áreas da administração pública são preponderantes, tendo a Controladoria Geral da União detectado irregularidades na aplicação dos recursos do Fundeb em 71% dos municípios escolhidos aleatoriamente no ano de 2013. De modo que enquanto não for revista a gestão pública educacional no país, dificilmente o piso do magistério e dos demais profissionais da educação - mesmo com efetivo repasse federal - será devidamente implementado.

 

http://cnte.org.br/index.php/cnte-informa/1491-cnte-informa-734-05-de-outubro-de-2015/15558-o-piso-nacional-do-magisterio-e-a-reforma-do-pacto-federativo.html?fb_ref=Default




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