Pisa, um viés ideológico

Pisa, um viés ideológico

Especialista em avaliação, Ocimar Munhoz Alavarse critica a incorporação dos resultados do exame internacional como norte para bonificar o professor

Alunos da Escola Estadual Tiradentes, em Curitiba

Uma avaliação massiva, feita em duas sessões de uma hora, que a cada três anos busca medir as políticas educacionais de 67 países – sejam esses ricos ou pobres. Os resultados, baseados na capacidade de leitura e resolução de problemas nas áreas de Ciências e Matemática, costumam ser incorporados como verdades absolutas, sem levar em contaproblemas de fundo estrutural.

A análise sobre o Pisa (Programme for International Student Assessment) é feita pelo especialista em avaliação Ocimar Munhoz Alavarse, professor da Faculdade de Educação da USP e coordenador do Grupo de Estudos e Pesquisas em Avaliação Educacional, que é receoso em aplaudir o exame. “Não nos iludamos: as condições de vida e o nível socioeconômico pesam enormemente nos resultados, assim como a própria vida que alguém levou até entrar na escola”, observa em entrevista ao Carta Educação.

Para Alavarse, a prova traz resultados interessantes, mas não pode ser encarada como um “oráculo”. “Precisamos nos perguntar: quem é responsável pelo Pisa? Não é a Unesco, é a OCDE, uma organização econômica que abarca os países mais ricos e surge em resposta a levantes da União Soviética, do leste europeu, da China”, alerta. “Quem defende o Pisa são economistas de direita, então existe aí um viés ideológico.”

Leia a entrevista a seguir:

Carta EducaçãoComo senhor enxerga o Pisa, que avalia sistemas educacionais de 67 países?

Ocimar Munhoz Alavarse – O Pisa, como muitas avaliações, promete muito mais do que entrega. Na verdade, procura-se fazer dele algo que ele não autorizaria. Precisamos nos perguntar: quem é responsável pelo Pisa? Não é a Unesco, é a OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), uma organização econômica que abarca os países mais ricos e surge em resposta a levantes da União Soviética, do leste europeu, da China.

Isso cria um problema de legitimidade política no que diz respeito à questão da autoridade educacional. E não se pode, através de uma prova aplicada em um ou dois dias, fazer um julgamento cabal sobre as políticas educacionais dos países. São apenas resultados de leitura eresoluções dos problemas. São aspectos importantes, mas que não dizem tudo sobre o processo educacional.

Pior ainda quando se quer derivar desses resultados o trabalho docente a ponto de bonificá-lo, como faz São Paulo com prêmios em função desses resultados. Hoje vivemos uma ofensiva massiva contra os trabalhadores, e essas avaliações entram para corroborar essa ofensiva: dividir os trabalhadores entre os que merecem ou não prêmios etc. Sem contar que a avaliação não pode falar com toda propriedade de um processo mais amplo, de ensino, organização das escolas e da política profissional dos países. Como a OCDE chega, a cada três anos, com uma prova e quer fazer uma radiografia absoluta das políticas educacionais dos países? Do ponto de vista técnico, não estou desautorizando o Pisa, mas do político temos de lembrar que trata-se de uma organização econômica com todo um histórico, que em uma prova de múltipla escolha quer extrair toda qualidade da educação dos países e compará-las.

Guardadas as proporções, é como se a Prova Brasil (avaliação em larga escala aplicada aos alunos de 5º e 9º ano do Ensino Fundamental) quisesse falar tudo sobre a educação brasileira. Essas provas não são desenhadas para isso, mas para avaliar alguns aspectos específicos. Assim, não me nego a ver e analisar os resultados do Pisa, mas não quero fazer dele a revelação de toda a verdade.

 




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