Novo e flexível EM
Novo e flexível ensino médio
Mudança define aumento da carga horária para cinco horas por dia e 40% da grade escolhida pelo próprio estudante
Gustavo Zucchi e Tulio Kruse, Especiais para o Estado
13 Setembro 2017
A maior transformação na educação básica está prestes a começar. O ensino médio, atualmente com 13 disciplinas obrigatórias, passará a ter um currículo flexível e deixará quase metade da carga horária à escolha do aluno. No fim da reforma proposta pelo Ministério da Educação (MEC), as escolas deverão ter aumentado a carga horária mínima de 800 para 1 mil horas anuais (média de quatro para cinco horas por dia) e oferecer disciplinas opcionais relacionadas a percursos escolhidos pelos alunos, o que pode incluir integração com o técnico.
“O ensino médio não responde às demandas que a sociedade vai fazer para o jovem. O aluno mais pobre não tem outras oportunidades (além da escola pública). Então é fundamental essa mudança”, afirmou Priscila Cruz, do Movimento Todos Pela Educação, em fórum organizado pelo Estado para debater o tema. “Sou de uma geração que achava que ensino médio é isso mesmo. Quando a gente põe a cabeça para fora, percebe que só o Brasil tem esse sistema.”
Com a mudança, os alunos poderão compor 40% da grade com um currículo complementar. A lei que reformou o ensino médio fala em cinco itinerários formativos: Linguagens, Matemática, Ciências Humanas, Ciências da Natureza e Ensino Profissional. Redes públicas e colégios particulares poderão desdobrá-los em trajetos que combinem matérias de diferentes percursos. As escolas, no entanto, só são obrigadas a oferecer um itinerário. Fica a critério de cada colégio ofertar mais de uma opção de percurso aos estudantes.
Aprovada em fevereiro, a reforma estabeleceu alguns prazos. Mas, segundo o MEC, antes de 2020 o currículo flexível não será uma realidade nas escolas. As instituições têm até 2022 para cumprir as cinco horas de aula por dia. O governo também promete fomentar a educação integral nos Estados para levá-la à metade da rede pública em até dez anos.
Outras definições ainda dependem da aprovação da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), que definirá os conteúdos obrigatórios. Como a reforma é abrangente e tem diversos pontos a serem estabelecidos, a mudança suscita muitas dúvidas – algumas estão nesta e nas próximas páginas; respondidas com base em informações do MEC.
“Não podemos olhar a reforma sem olhar para base”, disse Ilona Becskeházy, pesquisadora e consultora de Políticas Educacionais, durante o evento no jornal. “A reforma só tem chance de ter sucesso do ponto de vista do aluno e da justiça social, se ele chegar ao ensino médio dominando o que está proposto na base curricular.”
Fraco. O ensino médio é considerado a etapa mais problemática da educação básica. Há seis anos os resultados do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) estão estagnados na nota 3,7, de um total de 10. Dados levantados pelo Todos Pela Educação, com base em avaliações do MEC, mostram que, ao fim do médio, 90% dos alunos não têm desempenho adequado em Matemática e 78% em Português.
Cerca de 1,3 milhão de jovens de 15 a 17 anos está fora da escola, por motivos como trabalho, gravidez na adolescência e desinteresse, segundo estudo do Instituto Unibanco com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). “De 100 jovens do ensino fundamental, só 65 chegam ao médio e só 7 vão para faculdade”, disse Ricardo Henriques, do Instituto Unibanco, no evento no jornal.
Calendário previsto:
Já está correndo o prazo para as escolas aumentarem a carga horária mínima de 800 horas anuais, para ao menos 1 mil horas, até março de 2022.
Fim de 2017
Previsão para o MEC divulgar a proposta da base curricular do ensino médio.
Fim de 2018
Previsão do conselho para terminar a análise da base curricular e remeter ao MEC para homologação, caso a proposta seja entregue no prazo previsto.
Fim de 2019
Conselhos Estaduais de Educação terão um ano, após a publicação da base curricular, para definir diretrizes e apresentar um cronograma de implementação da reforma.
2020
Cronogramas de preparação dos Estados e das escolas para a reforma começam a valer.
Início de 2021
Vence o prazo de preparação dos professores para a reforma, caso a base curricular seja entregue de acordo com a previsão. Primeiras turmas de ensino médio com a base curricular serão matriculadas.
Múltiplos itinerários com aspectos regionais
Estados e escolas terão autonomia para definir percursos de acordo com características locais
Tulio Kruse, Especial para o Estado
13 Setembro 2017
As redes públicas e as escolas particulares terão autonomia para criar percursos que combinem vários conteúdos, não se limitando aos itinerários citados na lei – Linguagens, Matemática, Ciências da Natureza, Ciências Humanas e Ensino Profissional. “A gente espera que a escolha dos Estados seja sempre por itinerários integrados”, disse a diretora de Currículos e Educação Integral do Ministério da Educação (MEC), Teresa Pontual. “Então não serão cinco, serão centenas de itinerários, e o esforço estará em como estruturar tudo para que o Estado consiga gerenciar isso bem.”
Os itinerários são a parte do ensino médio em que o aluno escolhe uma área de afinidade. A recomendação do MEC é que esses trajetos respeitem características e necessidades regionais. “A escola vai ter um papel central na construção e os professores terão de se reinventar. A educação vai ter de dar conta da construção de itinerários que o Brasil precisa”, disse Rossieli Soares da Silva, secretário nacional de Educação Básica do MEC, em debate no Estado. Os itinerários deverão ter o aval dos Conselhos Estaduais de Educação. O prazo para o aluno escolher um itinerário também será definido pelos Estados – o MEC sugere que seja na metade do 2.º ano.
Antes que a reforma seja implementada, o MEC tem de aprovar a Base Nacional Comum Curricular. Ela definirá que conteúdos o aluno deve aprender e em que anos do médio. Nos três, Língua Portuguesa e Matemática serão obrigatórias. A base curricular definirá os conteúdos exigidos em História, Geografia, Biologia, Química, Física, Artes, Educação Física e Inglês. Filosofia e Sociologia continuarão sendo obrigatórias, não necessariamente disciplinas separadas.
Pode levar cerca de três anos até que as primeiras turmas estudem com o currículo flexível. Mas o assunto já mobiliza os alunos, como os do 9.º ano do Colégio Internacional Emece, na zona oeste de São Paulo, que pensaram que teriam de se decidir por um percurso já em 2018. “Dá um certo medo escolher a área e acabar mudando de ideia. Nessa idade a gente tem noção do que quer fazer, não uma certeza”, diz Lucas Gabriel de Oliveira, de 14 anos.