Isenção de contribuição

Isenção de contribuição

VANTAGENS PECUNIÁRIAS SEM CARÁTER PERMANENTE SÃO ISENTAS DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA

15/12/2016

Por Lucas de Oliveira (Cassel Ruzzarin Santos Rodrigues Advogados) 

  

O Plenário do Supremo Tribunal Federal retomou, após pedido de vistas da ministra Carmem Lúcia, o julgamento de recurso extraordinário em que se discute a constitucionalidade da incidência de contribuição previdenciária de servidor público sobre terço constitucional de férias, horas extras, adicional de insalubridade e adicional noturno, no período compreendido entre os meses de maio de 1999 a setembro de 2004. 

Em seu voto, a presidente do STF acompanhou o relator, ministro Luís Roberto Barroso, para dar parcial provimento ao recurso. Em sede de preliminares, reconheceu a prescrição das parcelas que tenham sido cobradas há mais de cinco anos da data da propositura da ação. 

Ela fundamentou, acerca da questão principal, que, embora a Constituição Federal preveja diferentes regimes previdenciários, com titulares diversos e direitos e deveres próprios, aqueles são regidos pelos mesmos princípios constitucionais, devido à unidade da Constituição. Dessa forma, não se pode negar a aplicação nem se alegar o desconhecimento de qualquer um dos regimes. 

Reconhece-se dois regimes previdenciários no ordenamento jurídico pátrio: o Regime Geral de Previdência Social (RGPS) e o Regime Próprio de Previdência Social (RPPS). Ambos são aplicáveis aos servidores públicos, dependendo de suas condições funcionais, sendo o primeiro destinado aos trabalhadores em geral, e aos servidores ocupantes de cargo inefetivo ou em condição de não efetividade. O RPPS, por seu turno, destina-se aos servidores que ocupem cargos efetivos da União, Estados ou Municípios, bem como das respectivas autarquias e fundações, sendo aplicáveis, no que couber, as regras do Regime Geral, consoante a regra do artigo 40, § 12, da Constituição Federal. 

A solução encontrada pela ministra está no § 3º do artigo 40 da Lei Maior, que estabelece que a aposentadoria será calculada considerando as remunerações do servidor. A remuneração, por seu turno, é definida como "o vencimento do cargo efetivo, acrescido das vantagens pecuniárias permanentes estabelecidas em lei", nos termos do artigo 41, "caput", da Lei nº 8.112/90. 

Dessa forma, as vantagens pecuniárias que não tiverem caráter permanente não poderão ser computadas para a contribuição previdenciária dos servidores sob a égide do RPPS. Assim, parcelas eventuais, tais como o terço constitucional de férias, horas extras, adicional de insalubridade e adicional noturno, que não têm reflexo nos proventos, estão isentos da contribuição previdenciária. O julgamento foi interrompido após pedido de vistas do ministro Gilmar Mendes. 

Confira o precedente. 

Servidor público: contribuição previdenciária sobre parcelas não incorporáveis aos proventos  

O Plenário retomou o julgamento de recurso extraordinário em que se discute a constitucionalidade da incidência de contribuição previdenciária de servidor público sobre terço constitucional de férias, horas extras, adicional de insalubridade e adicional noturno, no período compreendido entre os meses de maio de 1999 a setembro de 2004 — v. Informativos 776 e 787. 

Em voto-vista, a ministra Cármen Lúcia acompanhou o ministro Roberto Barroso (relator) e deu parcial provimento ao recurso. Preliminarmente, reconheceu a incidência de prescrição sobre as parcelas cujo recolhimento tenha ocorrido há mais de cinco anos da propositura da ação. 

Quanto à questão de fundo, asseverou que, embora na Constituição Federal haja modelos distintos de previdência social para os servidores públicos e para os trabalhadores da iniciativa privada, com dinâmicas atuariais próprias, o Regime Geral de Previdência Social (RGPS) e o Regime Próprio de Previdência Social (RPPS) seguem os mesmos princípios constitucionais. Os objetivos e os princípios da seguridade social valem para todo o sistema e não para alguns de seus beneficiários. Por isso, não se pode negar a aplicação nem afirmar o desconhecimento de qualquer deles, seja quem for o sujeito dos direitos e deveres neles prescritos. 

Ademais, definiu-se a existência de dois regimes previdenciários vigentes no País. Ambos podem ter incidência sobre servidores públicos, a depender da condição funcional de cada um. Nesse tipo de situação, coloca-se, de um lado, o RGPS — a que se sujeitam todos os trabalhadores e os servidores ocupantes de cargos de provimento inefetivo ou em condição de não efetividade — e, de outro, o RPPS — destinado exclusivamente a servidores titulares de cargos efetivos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações. O regime especial de previdência dos servidores públicos observará no que couber os requisitos e critérios fixados para o regime geral da previdência social (CF/1988, art. 40, § 12). 

A ministra ainda assentou que a solução da controvérsia está posta no § 3º do art. 40 da Constituição, norma especial, segundo a qual, para a definição do valor da aposentadoria, deve ser considerada a remuneração do servidor, entendida como o conjunto de parcelas que se incorporam aos proventos. A norma especial contida no § 3º do art. 40 da Constituição afasta a incidência da regra disposta no art. 201, § 11, da CF/1988 — prevista para o RGPS e aplicável subsidiariamente ao RPPS. 

Destacou, ademais, que a não incidência da contribuição previdenciária sobre as parcelas não incorporáveis à aposentadoria do servidor público decorre de comando expresso do texto constitucional (art. 40, § 3º). A partir da Emenda Constitucional 20/1998, deveria haver vinculação expressa entre proventos de aposentadoria e remuneração recebida pelo servidor, de modo que as parcelas, sem reflexo nos proventos, estão livres da incidência da contribuição previdenciária. 

Ponderou também que a vinculação entre a aposentadoria e a contribuição prestada pelo servidor tornou-se mais expressiva com a Emenda Constitucional 41/2003. Assim, prevalece o entendimento de que a contribuição previdenciária do servidor público não pode incidir sobre parcelas não computadas para o cálculo dos benefícios de aposentadoria. 

Rememorou que, desde 18.12.2002, o Supremo Tribunal Federal (STF), ainda sob a égide da Emenda Constitucional 20/1998, decidiu, em sessão administrativa, pela não incidência da contribuição previdenciária sobre as parcelas não computadas para o cálculo dos benefícios de aposentadoria. Essa decisão, inclusive, teria influenciado a jurisprudência da Corte e o entendimento de órgãos administrativos e jurisdicionais. 

Consignou, por fim, que, apesar de a Constituição ter conferido ao legislador ordinário a tarefa de estabelecer o critério definidor das parcelas que compõem a remuneração do servidor para fins previdenciários, não é possível subverter o comando constitucional de modo a incluir, na base de cálculo da contribuição previdenciária, parcelas sem repercussão nos proventos de aposentadoria, sob pena de desrespeito ao parágrafo 3º do art. 40 da Constituição Federal. Desse modo, conforme decidido pelo STF, desde o julgamento dos processos administrativos em 2002, o rol das parcelas isentas de contribuição previdenciária previsto pela Lei 9.783/1999 — e posteriormente pela Lei 10.887/2004 — não é taxativo, mas meramente exemplificativo. 

Para a ministra, a situação dos servidores inativos, contemplados com proventos de aposentadoria, é distinta da dos servidores em atividade. Os aposentados são impelidos a participar do custeio do regime previdenciário de sua categoria em menor proporção, com vistas a impedir eventual insolubilidade do sistema, por imposição do princípio da solidariedade. Além disso, a contribuição dos inativos tem base de cálculo diversa da dos servidores da ativa, pois a contribuição previdenciária incide apenas sobre as parcelas dos proventos que excedem o limite máximo estabelecido para os benefícios do RGPS. 

O ministro Edson Fachin também acompanhou o relator. Entendeu que cabe ao legislador ordinário, no exercício da competência conferida pela Constituição Federal e na ponderação dos princípios que regem a seguridade e a previdência social, dispor sobre as formas de proteção do trabalhador dos riscos sociais aos quais está exposto durante sua atividade laborativa. Além disso, não há na CF/1988 dispositivo que vincule estritamente a contribuição previdenciária ao benefício recebido, devendo a correspondência ser observada na medida do possível, não havendo, contudo, uma exigência normativa estrita nesse sentido. 

Ressaltou, em conformidade com o voto proferido pelo ministro Dias Toffoli, que, no caso de contribuições direcionadas à seguridade social, a vinculação entre arrecadação e sua destinação deve ser de grau médio, devendo haver proporcionalidade entre as contribuições exigidas e o benefício concedido. Não há, nesses termos, direito a uma estrita vinculação entre a contribuição exigida pelo servidor e o valor do benefício que será pago na aposentadoria. 

Apontou a necessidade de se estabelecer aplicação simétrica do binômio formado entre os princípios da contributividade e da solidariedade, de modo a prestigiá-los e conjugá-los em um produto final equilibrado. Para o ministro, é possível, conforme autorização decorrente da interpretação do princípio da solidariedade, que a contribuição previdenciária incida sobre verba não incorporável aos proventos de aposentadoria do servidor público. Há que se atentar, contudo, para a proporcionalidade — não identidade — entre a exigência contributiva e a prestação vindoura, para que se evite a incidência de tributo com eventual caráter confiscatório. 

Pontuou, no entanto, que, de acordo com a jurisprudência do Tribunal, não se admite a incidência de contribuições previdenciárias sobre parcelas remuneratórias que não compõem os proventos da aposentadoria. O fundamento adotado pela Corte consiste no desenho constitucional do caráter contributivo da previdência social até o advento da Emenda Constitucional 41/2003. Ou seja, de acordo com o princípio contributivo, somente se poderia admitir a incidência da contribuição previdenciária sobre parcelas remuneratórias que comporiam os proventos de aposentadoria. Dessa forma, o STF entendeu que o rol trazido pela Lei 9.783/1999 não seria exaustivo e que qualquer outra verba não incorporável aos proventos da aposentadoria estaria isenta da incidência da contribuição tributária. 

Ressaltou, ademais, que a Lei 10.887/2004 — a qual trata expressamente do cálculo dos proventos de aposentadoria dos servidores titulares de cargos efetivos —, em seu art. 4º, VII, X, XI e XII, excluiu as verbas que não serão incorporadas à aposentadoria do cálculo da contribuição previdenciária. 

Ponderou, ainda, que o legislador optou por excluir expressamente as verbas indicadas pelo recorrente do conceito de remuneração para fins de incidência da contribuição previdenciária. Desse modo, se, até a entrada em vigor da Emenda Constitucional 41/2003 a incidência não era admitida por falta de previsão constitucional acerca da aplicação do princípio da solidariedade de grupo ao regime próprio, após a vigência da referida emenda e após a consagração da solidariedade como baliza do regime próprio, o legislador optou por proteger da incidência da contribuição as verbas discutidas no recurso extraordinário, com a consequente exclusão de tais parcelas da base de cálculo da contribuição previdenciária. 

O ministro Ricardo Lewandowski, no mesmo sentido do voto do relator, deu parcial provimento ao recurso. Segundo ele, o disposto nos §§ 3º e 12 do art. 40 da Constituição, combinado com o § 11 do art. 201 da CF/1988, deixa evidente que somente podem figurar como base de cálculo da contribuição previdenciária os ganhos habituais com repercussão nos benefícios, excluindo, assim, as verbas que não se incorporam à aposentadoria. A dimensão contributiva do sistema mostra-se incompatível com a cobrança de qualquer verba previdenciária sem que se confira ao segurado algum benefício efetivo ou potencial. O princípio da solidariedade não é suficiente para elidir esse aspecto, impondo ao contribuinte uma contribuição que não trará qualquer retorno. 

O ministro Marco Aurélio, por sua vez, acompanhou a divergência. De acordo com sua análise, não existe correlação exata entre a contribuição paga pelo servidor e o benefício previdenciário, assim como não há como afastar a incidência da contribuição previdenciária sobre parcelas remuneratórias satisfeitas com regularidade. Assentou que concluir de forma contrária apenas aprofundaria as diferenças de tratamento existentes entre os trabalhadores vinculados ao regime geral e os servidores públicos. 

Em seguida, o ministro Gilmar Mendes pediu vista dos autos.

Ref.: RE 593068/SC, rel. Min. Roberto Barroso, julgamento em 16.11.2016. (RE-593068) 

Fonte: Supremo Tribunal Federal,  Boletim Informativo nº 847 (14 a 18 de novembro de 2016) 

 

http://servidor.adv.br/noticias/vantagens-pecunirias-sem-carter-permanente-so-isentas-de-contribuio-previdenciria/531445333 




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