Fim de uma experiência

Fim de uma experiência

Sobre o fim de uma experiência

Luiz Araujo

Em tempos sombrios na política, quando somos governados por políticas conservadoras, dirigidos no parlamento por pessoas conservadoras e vemos um partido gestado no seio das lutas sociais se desfazer em sucessivos escândalos éticos, recordar que um dia as coisas foram diferentes talvez seja importante.

Achei na minha estante um livro publicado pela Cortez Editora em 1988. O título relembra época da efervescência política das mobilizações prévias a constituinte daquele ano. O título é sugestivo, mesmo que hoje diante dos ataques aos partidos possa parecer exótico: A educação como ato político partidário.

Na lista de autores temos educadores renomados como Florestan Fernandes, Carlos Rodrigues Brandão, Moacir Gadotti, Lisete Arelaro, Paolo Nosella e Paulo Freire. Mas também escreveram artigos o ex-presidente Lula e líderes petistas de então, dentre eles Celso Daniel, Djalma bom e Paulo Frateschi.

A pretensão do livro era, ao mesmo tempo, sistematizar as primeiras experiências educacionais de governos petistas e anunciar as propostas do partido para a educação, inclusive para o processo constituinte.

Há documentos preciosos no livro. Destaco as propostas para o capítulo da educação que Florestan apresentou, onde em um artigo estava escrito que as escolas particulares poderiam existir, porém “elas e suas mantenedoras ou proprietários estão taxativamente excluídos do acesso aos recursos públicos destinados à educação escolarizada e de isenções ou concessões fiscais de qualquer natureza” (p. 164).

Nos vinte e sete anos que separam nossos dias de sua edição muita água passou por debaixo da ponte. A visão universalista da Constituição daquele ano foi lentamente sendo dilapidada pela hegemonia neoliberal e após chegar ao poder, o partido que inspirou o referido livro já havia mudado muito. De um lado, incorporado grande parte dos pressupostos teóricos neoliberais que na época criticava. De outro, seus principais dirigentes haviam sido conquistados para a tese de que para chegar ao poder estatal era necessário governar do mesmo jeito que os seus adversários.

O viés da educação popular foi sendo substituída por uma visão de educação como mercadoria, mesmo que mantendo programas de inclusão dos setores excluídos no acesso educacional.

Não é necessário dizer que quase tudo que seus dirigentes escreveram no livro foi sendo lentamente abandonado, seja nos programas presidenciais, seja no modo efetivo de governar.

Resgatei a frase do saudoso Florestan Fernandes, educador que manteve sua coerência durante toda a vida e travou batalhas contra os interesses privados em diferentes épocas da história brasileira, para simbolizar um dos aspectos em que o PT atual rompeu radicalmente com o PT que inspirou o livro aqui relembrado. Hoje a linha oficial partidária é oferecer a educação por meio de parcerias com setor privado, além de ver com bons olhos o próprio crescimento do setor. Recursos públicos são cada vez mais direcionados para fomentar o crescimento da iniciativa privada, apenas mitigando tal apoio com condicionantes de vagas (por meio de bolsas) para os mais pobres, mesmo que ofertadas da maneira mais precária que as “leis do mercado’ permitirem.

Em tempos sombrios é necessário relembrar que outro caminho era possível. Que outro caminho ainda é possível. Mesmo que em outras ferramentas políticas.

 

http://rluizaraujo.blogspot.com.br/




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