Vitória do ensino domiciliar

Vitória do ensino domiciliar

Ensino domiciliar alcança vitória importante

Andrea Ramal - G1 Globo.com - 14/04/2015 - Rio de Janeiro, RJ

Nesta semana acompanhamos um fato inédito na educação do país: a jovem Lorena Dias, que não frequentou a escola mas estudou em casa, foi autorizada a ingressar na faculdade.

O Ministério da Educação (MEC) pode recorrer, já que, em tese, a prática fere o Estatuto da Criança e do Adolescente, a Lei de Diretrizes e Bases (segundo a qual `é dever dos pais efetuar a matrícula das crianças na educação básica a partir dos 4 anos`) e a Constituição Federal, pois deixar de prover instrução formal pode ser caracterizado como abandono intelectual.

Conhecida nos EUA como homeschooling, a prática vem ganhando força no Brasil. As famílias que optam por esse modelo entendem que a escola não é adequada para educar para o mundo de hoje. Para eles, em vez de estimular, a escola inibe a criatividade, não forma pessoas empreendedoras e desestimula o interesse de aprender, com sua didática obsoleta e conteúdos distantes da realidade.

Além disso, estes pais alegam que no ensino domiciliar evitam o bullying, fogem de escolas de má qualidade e ficam mais envolvidos na educação dos filhos. Por tudo isso, há um projeto em trâmite (PL 3179/12, do deputado Lincoln Portela) que pretende legalizar o homeschooling no país.

Enquanto o projeto não é votado, vale esclarecer algumas dúvidas comuns das famílias a respeito da educação domiciliar. Vamos a elas:

Quais são os riscos do homeschooling?

Primeiro, a baixa escolaridade de muitas famílias brasileiras. Como ensinar, se os pais não aprenderam o suficiente? Além disso, o modelo limita a socialização, pois na escola, a criança aprende a conviver com o diferente, gerencia conflitos, forma redes de relacionamento, o que desenvolve competências emocionais importantes para o trabalho e a vida. Sem falar da importância dos professores, pois é preciso interagir com outros líderes adultos além dos próprios pais.

Qualquer pai ou mãe está apto para ensinar?

Na verdade, no ensino domiciliar não são necessariamente os pais que ensinam. Há componentes de autodesenvolvimento e os pais podem ser orientadores do estudo. Em geral, o homeschooling acontece em famílias que já têm uma vida cultural bastante rica, então o hábito de ler e de estudar já está presente, o que ajuda bastante. Às vezes conta-se com tutores. Sempre há um roteiro curricular, mas os modelos variam.

É mais fácil educar os filhos pequenos no ambiente da própria casa?

Depende do ambiente familiar, não há uma vinculação com a idade. Claro que as crianças podem ser mais abertas a ouvir os pais do que os adolescentes, cuja tendência é questionar tudo. Mas isso não é uma regra geral.

Ensino domiciliar é uma saída diante da crise do ensino brasileiro?

Em princípio, não parece a melhor das alternativas. A escola pode ter problemas, mas está se renovando aos poucos. Conta com profissionais especialmente preparados para lecionar, gerenciar grupos, acompanhar a aprendizagem. Há uma falsa ideia de que qualquer um pode ensinar. A pedagogia é uma arte e também uma ciência: ensinar exige muita preparação profissional.

Quando a família não concorda com ensino da escola e com os valores que transmite, deve partir para homeschooling?

Por mais firmes que sejam nossas convicções, aprender a dialogar é fundamental. E quase sempre é possível encontrar uma escola que se afine com o modelo educacional da família. Há muitas instituições antenadas com os novos tempos, capazes de ser parceiras na educação dos filhos. Educação é um trabalho de equipe: escola e família.

O ensino domiciliar deve ter fiscalização do Estado?

Esse é um ponto polêmico. A flexibilidade está na essência dessa prática. Com fiscalização, o modelo se tornará rígido. Por outro lado, não se pode simplesmente dizer que cada um faça o que achar melhor. Para complicar, faltam materiais específicos para este tipo de ensino. Por tudo isso, o homeschooling tem mais chances de funcionar em famílias que tenham suficiente formação acadêmica e cultural.

E os pais que querem manter os filhos na escola, mas também desejam participar mais da educação deles: como se preparar para isso?

Os pais precisam conhecer o projeto pedagógico da escola, participar das reuniões de pais, conversar sempre com a escola para expressar dúvidas e ouvir orientações. Em casa, planejar um ambiente de estudo organizado, com hora para fazer deveres de casa e para ler e estudar. E incrementar a formação com aprendizado de música, artes, esportes, viagens. Até debater um filme com os filhos já é uma forma de estimular o raciocínio e a capacidade de interpretação. Dentro das possibilidades econômicas de cada família, sempre é possível oferecer uma formação que vá além da escola.




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