Progressão continuada em outros paises
Progressão continuada é frequente entre países que se destacam no cenário educacional
Referências em Educação como Finlândia e Coréia não admitem repetência em seus sistemas de ensino
Letícia Larieira 27 de março de 2015
Contrários ao caráter punitivo da reprovação, diversos sistemas educacionais pelo mundo têm adotado a progressão continuada como forma de valorizar o processo de aprendizagem dos alunos, sustentando que cada estudante aprende em um ritmo diferente.
O ranking do Programa Internacional de Desempenho dos Estudantes (Pisa) - que avalia conhecimentos de leitura, escrita, matemática e ciências de estudantes de 15 e 16 anos de países membros da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) - tem entre os primeiros colocados de cada área de conhecimento, países que adotam a progressão continuada como uma de suas políticas educacionais.
Nas avaliações dos estudantes em matemática e ciências, seis dos dez países primeiros colocados adotam algum sistema de progressão continuada; no quesito leitura, o número sobe para oito. Entre eles estão: China, Finlândia, Irlanda, Holanda, Canadá, Coréia do Sul, Japão e Cingapura.
Ao redor do mundo
Embora haja disparidades consideráveis entre o nível socioeconômico e cultural, prestar atenção em como essas nações têm conduzido os sistemas de progressão pode indicar caminhos para o aprimoramento no Brasil.
A antropóloga e professora adjunta do mestrado da Fundação Cesgranrio, Maria de Lourdes Sá Earp, explica que a progressão faz parte da cultura escolar desses países. “Não existe a lógica de reprovar para aprender, os alunos avançam naturalmente; esses outros países sequer utilizam a palavra ‘repetência’ na escola simplesmente porque esse conceito não existe para eles”, afirma.
Na Ásia
Na China, país de enorme diversidade cultural e imensa desigualdade socioeconômica e eduacional, a reprovação é proibida por lei. Outros países asiáticos, como Japão, Coréia do Sul e Cingapura, também adotam a progressão continuada; no caso dos dois primeiros, a repetência não é admitida em nenhum dos anos do Ensino Fundamental. Os estudantes japoneses também prestam provas de seleção para determinar onde cursarão o Ensino Médio.
Em Cingapura, a progressão é ainda mais ampla: no chamado Programa Integrado, os alunos com bom desempenho são isentos de fazer os testes de promoção, passando diretamente para o nível mais avançado. Com essa medida, as escolas são encorajadas a ter currículos mais flexíveis e a dar mais atenção aos alunos.
Na Europa
Referência em Educação e primeira colocada no ranking do PISA durante quatro anos seguidos, ao invés de tentar mensurar e ranquear os conhecimentos adquiridos por meio de provas, a Finlândia procura dar maior importância à aprendizagem dos alunos. No país, não há avaliações durante os primeiros anos escolares e nem exames de abrangência nacional.
Sem caráter punitivo, o sistema educacional da Finlândia procura promover a equidade: estudantes que apresentam menor desempenho em relação aos colegas recebem mais atenção do professor, que tem autonomia para orientá-lo de modo que alcance os demais alunos da turma. De acordo com Maria de Lourdes, “quando o aluno não aprende na Finlândia, o professor é que é ‘reprovado’; os docentes se empenham para que o estudante aprenda”.
Obrigatória dos cinco aos 16 anos, a escola no Reino Unido segue linha semelhante à da Finlândia: de valorizar a aprendizagem e não apenas o desempenho em testes; e a progressão continuada faz parte desse processo. Para os britânicos, o sistema não significa aprovação automática. Em vez disso, entende-se que o aluno deve ser avaliado de diferentes maneiras.
Segundo colocado no ranking mundial de Educação da Unesco, o Reino Unido tem como grande preocupação manter o estudante na escola, incentiva-se, assim, que as crianças e adolescentes sigam o curso das séries com os demais colegas, sem que ninguém fique para trás.
No Reino Unido, os alunos são avaliados pelos professores constantemente e a família faz parte do processo. As escolas britânicas não emitem certificados e diplomas de conclusão, mas realizam um teste, chamado General Certificates of Secondary Education (GCSEs) para comprovar o domínio de conteúdos esperados.
Outro país europeu a adotar a progressão continuada é a Noruega: nos seis primeiros anos de escolarização, não há repetência. Além disso, os alunos são matriculados nos anos escolares de acordo com a idade e não com as habilidades que têm. Valorizando a participação da família na Educação dos filhos, as escolas contam com a ajuda de comissões de pais no compartilhamento de responsabilidades e competências.
Repetir não é a solução
De acordo com Paula Louzano, pedagoga, professora na Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP) e doutora em Política Educacional pela Universidade de Harvard, “esses países não acreditam na cultura da repetência; a progressão existe porque se entende que o aluno não vai aprender mais se ficar retido em uma série”.
No Brasil, entretanto, a repetência ainda é objeto de polêmica entre professores, pais, redes de ensino e gestão. O país é um dos que mais reprovam no mundo: de acordo com um relatório divulgado pela Unesco em 2010, o índice de reprovação nas escolas brasileiras é de 19% dos alunos, enquanto que a média mundial é de 3%. Retendo quase um quinto dos seus estudantes na Educação, o Brasil está entre os que mais reprovam, perdendo apenas para Paraguai, Suriname, Nepal, Haiti e Moçambique.
Em comparação com países mais bem colocados no Pisa e no ranking de Educação da Unesco, o Brasil apresenta ainda mais disparidades; enquanto se reprova um em cada cinco estudantes brasileiros, quatro em cada mil alunos são reprovados na Finlândia; e um em cada mil na Coréia do Sul.
Embora a progressão continuada seja adotada com êxito em muitos países, no Brasil, ela ainda enfrenta resistência. “A diferença é que nesses países o sistema funciona. Eles optam por um sistema de apoio ao aluno muito forte na escola, coisa que a gente não consegue fazer aqui. Esses países fazem o acompanhamento do estudante no contraturno e também durante o período de aula”, pondera Paula Louzano.
Outro entrave é a “cultura da repetência”, que baliza as relações e sistemas escolares no Brasil. Na opinião de Maria de Lourdes, essa cultura é um “conjunto de práticas e pensamentos que levam à naturalização da repetência e à utilização dela como recurso pedagógico”, completa.
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