20 ANOS SEM FLORESTAN FERNANDES

Paulo Henrique Martinez - Florestan Fernandes nasceu na cidade de São Paulo, em 1920. Era filho de uma jovem portuguesa, que emigrara do Minho, fugindo da pobreza no campo. Não lhe valeu. Empregada em serviços domésticos, criou o filho com muitas dificuldades e privações. O menino trabalhou na rua, desde cedo. Interrompeu os estudos, retomados quando já adulto, jovem, aos 17 anos de idade. Formou-se em Ciências Sociais, na USP, em 1944. Fez Pós-Graduação em Antropologia e Sociologia. Tornou-se professor e, logo, sociólogo renomado. Os seus livros conhecem reedições sucessivas. O seu nome transcende as fronteiras do Brasil. Suas interpretações desafiam a imaginação e a engenhosidade intelectual na compreensão do século XXI. Morreu, em São Paulo, vinte anos atrás, em agosto de 1995.

As pesquisas realizadas por Florestan Fernandes abrangem um elenco vasto e diversificado de temas e de problemas sociais. Nas décadas de 1940 e 1950, quando estudou as sociedades indígenas, as políticas públicas queriam acelerar a desagregação social e a conversão de seus membros em mão-de-obra barata e sem qualificação. Integrou e liderou equipes de investigação crítica e original sobre as relações entre brancos e negros em São Paulo e no sul do Brasil. Cassado pela ditadura militar, no Brasil, ensinou no Canadá e EUA.

Nos anos 1970 expôs com rigor e profundidade teórica e empírica as mazelas da formação colonial da sociedade brasileira e apontou os gargalos políticos e sociais na efetivação da cidadania plena e da felicidade humana entre nós. Nos últimos anos de vida dedicou-se a ativa colaboração na imprensa escrita e aos debates no Congresso Nacional. Foi Constituinte e deputado federal pelo PT de São Paulo, entre 1987 e 1994.

Em 2014 as eleições revelaram a carência de análises sociológicas e políticas aptas para explicitar as relações sociais e de poder que estavam em jogo naquele momento. Ataques pueris consumiram candidatos, debates, ideias e a atenção de eleitores e cidadãos. Uma eleição presidencial rala em discussão e reflexão sobre os destinos nacionais e coletivos da população. A gente pobre foi tratada como espectadora. Alvo passivo, ora dos benefícios governamentais, do presente e do futuro, ora do egoísmo social da oposição, que a acusou de consumir recursos da iniciativa privada, o setor dito “produtivo”.

A riqueza de uma nação é o seu povo e a sua cultura. Por esta razão Florestan Fernandes bateu-se, sem tréguas, pela educação e pelo socialismo. A sua ausência no debate público se fez notar. Não seria oportuno, hoje, ler e pensar o Brasil com Florestan Fernandes?

Paulo Henrique Martinez, professor no Departamento de História da Universidade Estadual Paulista, campus de Assis.

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