Incoerência entre discurso e prática
Entre empresários gaúchos, há quem apoie a decisão do governador José Ivo Sartori de sancionar aumentos de até 64,2% para o seu próprio salário e o de secretários, deputados, Ministério Público, Judiciário, Tribunal de Contas do Estado e Defensoria Pública.
Presidente do conselho diretor do Programa Gaúcho da Qualidade e da Produtividade, Ricardo Felizzola avalia que Sartori não foi hipócrita, isto é, não fez o jogo político ao acatar a decisão da Assembleia Legislativa. O reajuste, na avaliação de Felizzola, é um detalhe no meio do maremoto das finanças públicas do Estado:
— O salário do diretor iniciante de empresa com faturamento de R$ 500 milhões é umas quatro vezes isso. O governador é o CEO (presidente-executivo) de um Estado com faturamento entre R$ 25 bilhões e R$ 30 bilhões. Na minha empresa, tenho uns 10 diretores que ganham R$ 25 mil.
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"Vou pagar o preço que tiver de pagar", diz Sartori sobre aumentos
Outros empresários que foram ouvidos por Sartori durante o processo de formação do governo lembram que um dos motivos da decisão pode ter sido a difícil experiência da montagem do secretariado. A tentativa de atrair profissionais mais qualificados esbarrou na remuneração — antes do aumento, pouco mais de R$ 10 mil.
Mas, agora, temem a reação da sociedade diante do “momento político” do Estado. As “medidas duras” anunciadas por Sartori na posse nem começaram, ponderam. E há um grupo grande de empresários com pagamento de serviços já prestados “pendurados” por seis meses.
Rafael Souto, CEO da Produtive, agência especializada em assessorar altos executivos, pondera que, de fato, a média salarial de um presidente de uma empresa de grande porte está ao redor de R$ 50 mil, mas costuma ter outra parcela variável, chamada de bonificação, que pode dobrar esse valor.
Mas Souto, também habituado às questões salarias do universo executivo, compara o momento em que os salários das carreiras top do serviço público foram aumentados à situação do dono da empresa que reúne a equipe, comunica que os resultados estão fracos, cortes precisam ser feitos e, logo depois, aparece com um carro importado bem novinho.
— Há incoerência entre discurso e prática. O problema não é o valor, é o momento. É uma medida antipática. O Obama (Barack, presidente dos EUA, em abril de 2013), quando houve cortes no orçamento, reduziu seu próprio salário. Claro que aqueles dólares nem fizeram cócegas no orçamento de trilhões, mas é o exemplo, a solidariedade.
http://zh.clicrbs.com.br/rs/noticias/noticia/2015/01/marta-sfredo-incoerencia-entre-discurso-e-pratica-4683051.html