A querela da data de corte

A querela da data de corte

Tudo como dantes no quartel de Abrantes!

Jorge Lutz Müller
OAB-RS 7.563 Coordenador da assessoria jurídica do SINEPE/RS


Não há novidade, por enquanto, na ação civil pública movida pelo Ministério Público contra a União e contra os Estados do RS, SC e PR, referente à data de corte para o ingresso no Ensino Fundamental. A sentença (decisão de 1º grau) julgou o pedido procedente para:

(i) proclamar o direito de acesso de todas as crianças com 6 anos incompletos na data de corte, "desde que possuam capacidade para ingresso, a ser avaliada por critérios psicopedagógicos (sem afastamento de outros critérios ampliativos de inclusão ao ensino fundamental)";


(ii) invalidar as disposições em contrário constantes das resoluções 1/2010 e 6/2010 do CNE/CEB e regras similares eventualmente editadas pelos conselhos estaduais de educação do RS, SC e PR;


(iii) determinar a estes conselhos a reformulação dessas regras, já para o ano de 2015, ou seja, acabar com a data de corte de 31 de março.


A União e os Estados do RS, SC e PR apelaram da decisão para o Tribunal Regional Federal da 4ª Região - TRF/4ª. O recurso foi recebido, parte dele com efeito suspensivo (i. é, suspendendo a eficácia da sentença, vale dizer, tornando-a, por ora, inaplicável)  e parte com efeito meramente devolutivo (i. é, simplesmente devolvendo a discussão para o exame judicial, a ser feito, agora, pelo 2º grau, vale dizer, sem obstar a eficácia imediata da sentença). Que é que vale desde logo e o que é que ficou, por assim dizer, "pendurado" ?


O que foi concedido como antecipação de tutela permanece eficaz, porque, em relação a isso, o efeito do recurso é meramente devolutivo. O que foi além desta antecipação submete-se não só ao referido efeito devolutivo mas também a efeito suspensivo.


O que é que foi concedido nesta antecipação e, portanto, continua valendo, a despeito dos recursos interpostos pela União e Estados (RS, SC e PR) ?


(i) a sustação das disposições atinentes a data de corte estipuladas nas referidas resoluções (CNE/CEB e conselhos estaduais);


(ii) a determinação para que a União e os Estados do RS, SC e PR "estruturem adequadamente seus sistemas de ensino, a fim de atender, em sua plenitude, o direito prestacional especificado no dispositivo da presente sentença já a partir do ano letivo de 2015 (sem afastamento de outros critérios ampliativos de inclusão ao ensino fundamental)";


(iii) a faculdade para os sistemas de ensino na área de abrangência do TRF/4ª (RS, SC e PR) possibilitarem, desde já (2014), "o ingresso de infantes com seis anos incompletos no ensino fundamental, independentemente de data de corte, disciplinando novos critérios que não envolvam a restrição objetiva discutida no presente feito...".


Para simplificar: a invalidação das regras dos conselhos ainda não prospera, em razão do efeito suspensivo dos recursos. Mas a sustação, sim.  A diferença é de natureza técnico-processual. Na prática, a data de corte de 31 de março continua sem efeito, ou seja, com a sua eficácia sustida, ainda que a sua invalidade penda de ulterior apreciação judicial.


Por último, cabe noticiar o ajuizamento, por parte da Procuradoria-Geral da República (que integra o Ministério Público Federal), de uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental - ADPF, destinada a obter do Supremo Tribunal Federal declaração de inconstitucionalidade dos artigos 2º e 3º da Resolução CNE/CEB nº 1/2010 e dos artigos 2º, 3º e 4º da Resolução CNE/CEB nº 6/2010, que são as regras atinentes à mencionada data de corte de 31 de março. De assinalar que esta ação (ADPF) se volta não apenas contra o limite (data de corte) estabelecido para o ingresso no Ensino Fundamental como também para o mesmo limite estipulado para ingresso na Educação Infantil.


Nesta ADPF não houve, até agora, nenhuma decisão, nem mesmo em sede de liminar. A divulgação feita dias atrás acerca da possível existência de decisão do STF a respeito da matéria não procede. Houve, apenas, manifestação do Procurador-Geral da República, em sentido contrário, isto é, defendendo a constitucionalidade da data de corte.


Aliás, não deixa de ser curioso constatar que a Procuradoria-Geral da República ingressou com uma ação, na qual sustenta a inconstitucionalidade dessas normas, e o Procurador-Geral da República vem aos autos para opor-se, dizendo-as constitucionais. São condutas possíveis, que, no mínimo, homenageiam o princípio da diversidade... Síntese da síntese: enquanto não surgir novidade no front judicial, a data de corte de 31 de março segue inaplicável.

http://www.sinepe-rs.org.br/site/informacao/opinioes_107




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