Educação e diálogo

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Educação e diálogo são os caminhos para a não violência, dizem especialistas

Andreia Verdélio - Repórter da Agência Brasil - Revista Gestão Universitária - 03/10/2014 - Belo Horizonte, MG


Na data em que se celebra o Dia Internacional da Não Violência, especialistas ouvidos pelaAgência Brasil dizem que a educação e o diálogo são o melhor caminho para a resolução de conflitos e promoção da cultura de paz. Para o coordenador da Área de Estudos da Violência da Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais, Julio Jacobo Waiselfisz, no Brasil ainda falta essa cultura de tolerância.

Ele cita a pesquisa feita em 2011 e 2012 pelo Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), em 16 unidades da Federação. Ela aponta que em nove unidades prevalecem os homicídios cometidos por impulso ou motivo fútil, como em brigas e crimes passionais.

“Resolvem-se o conflito apenas exterminando o elemento conflitivo, o que não é um patrimônio exclusivo do Brasil. A América Latina e África são as áreas mais violentas do mundo, e não por crimes profissionais [como os premeditados e por tráfico de drogas], mas por crimes de intolerância”, disse Jacobo, autor do estudo Mapa da Violência.

O sociólogo cita, entre outras, duas questões como causas para a violência: a permissividade das instituições e a imputação de culpa às vítimas. “Mulheres são estupradas porque vestiam roupas curtas, meninos são mortos porque usavam drogas. As vítimas viram culpadas pela própria morte. Um segundo nível é quando se criam estruturas de justiça indiretas dentro das próprias instituições, como grupos de extermínio e milícias das polícias, ou quando agem grupos de extermínio da própria população”, completou.

“Por sorte, a humanidade ainda não inventou melhor mecanismo de inclusão social que a educação. Entretanto, temos cerca de 10 milhões de jovens pobres que não estudam e não trabalham. O Estado não oferece condições e já assumiu o deficit de matrículas no ensino médio. Estamos perdendo, não só em qualidade, mas em quantidade”, disse Jacobo, referindo-se aos dados do Censo da Educação Básica de 2013.

Segundo o promotor de Justiça do estado de São Paulo, Antônio Carlos Ozório Nunes, o Brasil tem violência sim, mas já evoluiu muito em direitos humanos e a sociedade está aberta para as boas práticas. “O povo brasileiro de modo geral não é um povo violento, existe muita coisa boa que não é mostrada. A sociedade brasileira, embora autoritária, tem percebido muita receptividade na prevenção das formas de violência. Por exemplo, um padrasto batendo na criança, há 30 anos nem chocaria tanto, porque havia essa cultura de que `criança tem que aprender`, mas hoje, qualquer violência, contra criança ou idoso, choca muito, já houve essa evolução civilizatória”, disse Ozório, que é membro auxiliar da Comissão da Infância e Juventude do CNMP.

O conselho promove desde 2012 a campanha `Conte até 10`, que está em sua segunda fase, com enfoque no público escolar. Por meio de roteiros de aulas, os professores serão orientados a trabalhar o tema da violência sob o olhar da valorização da vida, do controle emocional e da mudança de comportamento para enfrentar situações-limite. O trabalho está sendo focado em oito estados, nos 100 municípios mais violentos contra os jovens.

“Hoje, 30% dos crimes ocorrem por impulso, nas situações mais corriqueiras e de muito estresse, de forma impensada e violenta. Para esse tipo de situação, o melhor é contar até 10 e deixar a raiva passar, controlar a emoção. Esse tipo de conduta também é motivado pela falta de formação educacional e de valores, relacionados à convivência, que podemos chamar de sócio-morais. Então é importante que a família, que é o primeiro centro irradiador de valores, a escola e a sociedade trabalhem com esses valores, da solidariedade, da interconexão, de que não estamos sozinhos no mundo, da humildade, do perdão, da paciência, valores que levam a um controle emocional maior e que podem ser ensinados”, disse o membro do CNMP.

A data de hoje (2) foi escolhida em celebração ao nascimento de Mahatma Gandhi, em 2 de outubro de 1869. Na luta pela independência da Índia, o pacifista pregava a não violência na resolução de conflitos e muitos de seus princípios foram base para a Declaração Universal dos Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU), adotada em 1948, ano de sua morte.

Para Ozório, o século 20 foi quase todo de guerras, mas já passamos por um estágio civilizatório muito grande. “Os próprios países reconhecem essa evolução cultural e de diplomacia e que a solução dialógica é o único processo em que todos ganham. Essa interlocução em prol da paz é cada vez mais incentivada”, disse o promotor.

Segundo Jacobo, a declaração foi editada para se ter o mínimo de convivência pacífica entre os países e eliminar os horrores das guerras mundiais. “Só que não estamos naquela mesma conjuntura, de um mundo bipolarizado e a ONU tem resoluções obsoletas que perduram, como países que têm direito a veto. Deveria haver um processo de reformulação”, disse o sociólogo.

O poder de veto é exercido pelos cinco países-membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU - China, Estados Unidos, França, Rússia e Reino Unido -, permitindo-lhes impedir as ações do conselho, independentemente do apoio internacional.




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