Violar direito adquirido
Alteração de regulamento de previdência não pode violar direito adquirido
O artigo 202 do Texto Constitucional, com redação dada pela Emenda Constitucional 20/1998, conferiu ao regime de previdência privada as características de independente e complementar ao Regime Geral da Previdência Social, bem como garantiu a facultatividade de adesão.
A atividade de previdência privada será regida pelos princípios da garantia dos benefícios contratados mediante a constituição de reservas e a acessibilidade de informações sobre a gestão do plano aos participantes.
No regime de previdência privada os direitos e deveres das partes devem estar previstos e regulamentados no contrato. O caráter contratual que marca constitucionalmente o regime de previdência privada possibilita que as partes (patrocinadores, instituidores, participantes ou assistidos e as entidades de previdência complementar), segundo seus interesses, desenhem livremente a extensão, os limites e os efeitos da proteção previdenciária que resolverem entre si estabelecer. É por isso que podemos considerar os regulamentos dos Planos de Benefícios de cada entidade de previdência privada como “legislações”.
Os vigentes artigos 17, parágrafo único e 68, parágrafo 1º, da Lei Complementar 109/2001, determinam que as alterações processadas nos regulamentos dos planos de benefícios aplicam-se a todos os participantes das entidades fechadas de previdência complementar, a partir de sua aprovação pelo órgão regulador e fiscalizador, só podendo se falar em direito adquirido na ocasião em que o participante preenche todas as condições para o recebimento do benefício. Esse é inclusive o posicionamento pacífico e recente do STJ[1].
No entanto a regra prevista nos artigos 17 e 68 da Lei Complementar 109/2001 não tem aplicação “automática”. Isto porque o objetivo maior do regime de previdência privada é o de atender às necessidades vitais das pessoas, protegendo-as da adversidade, quando da ocorrência do risco social. Logo, por exemplo, a eventual inobservância ao equilíbrio atuarial do plano de benefício, em contrariedade ao pactuado no regulamento, colocará em risco o interesse de terceiros, ou seja, viciará a própria finalidade do regime de previdência privada.
Nesse sentido, a 2ª Seção do STJ[2] de forma consolidada (composta por ministros das duas turmas responsáveis por julgar a matéria), manifestou-se no sentido de que, para a revisão de benefício pago por entidade de previdência privada, segundo critérios diversos dos pactuados no contrato/regulamento, é imprescindível que haja perícia atuarial para resguardar o equilíbrio financeiro e atuarial dos planos de benefícios.
Assim, eventuais alterações nos regulamentos dos planos de benefícios, a teor do disposto na Lei Complementar 109/2001 e na jurisprudência, não podem violar o direito adquirido dos participantes nem prejudicar a manutenção do equilíbrio atuarial, sob pena de os planos serem extintos, o que traria prejuízos a todos que estejam vinculados a eles.
[1] AgRg no ARESP 297.647/SC, Rel. Ministra Nancy Andrighi, 3ª Turma do STJ, DJe 31.3.2014.
[2] MC 16.197/RS, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, 4ª Turma do STJ, DJe 19.8.2010.
RESP 1250153/RS, Rel. Ministra Maria Isabel Gallotti, 4ª Turma do STJ, DJe 18.6.2012.
RESP 1193040/RS, Rel. Ministro Sidnei Beneti, 3ª Turma do STJ, DJe 25.6.2010.
RESP 1337616/RS, Rel. Ministro Luiz Felipe Salomão, 4ª Turma do STJ, DJe 21.3.2014.
Diego Filipe Casseb é associado da área Previdenciária do Pinheiro Neto Advogados.
Cristiane Ianagui Matsumoto é advogada associada das áreas tributária e previdenciária do escritório Pinheiro Neto Advogados.
Revista Consultor Jurídico, 18 de setembro de 2014, 09:13
http://www.conjur.com.br/2014-set-18/alteracao-previdencia-privada-nao-violar-direito-adquirido