Milhões de analfabetos

Milhões de analfabetos

Ainda há 13 milhões de analfabetos no Brasil

Quase 300 mil pessoas aprenderam a ler em 2013; a maior retração do analfabetismo ocorreu no Nordeste

Fonte: O Estado de S. Paulo (SP) 19 de setembro de 2014

 

O operador de carga Carlos José dos Santos,de 51 anos,voltou aos bancos Escolares já adulto. Por causa da catarata congênita, que o fez operar os olhos aos 9 anos, havia abandonado os estudos, no Recife (PE). Mas as dificuldades no dia a dia – tinha de pedir ajuda para coisas simples, como pegar ônibus ou preencher uma ficha de emprego –, o fizeram se matricular no curso noturno de Alfabetização. “Trabalhava durante o dia e estudava das 19 às 22 horas. Era cansativo, dava preguiça, mas foi a melhor coisa que eu fiz”, diz Santos. Depois de alfabetizado, foi promovido do cargo de faxineiro para operador de carga numa subsidiária do Banco do Brasil.

Como Santos, 297,7 mil pessoas aprenderam a ler em 2013, mas ainda há 13,3 milhões de Analfabetos no País. A taxa de Analfabetismo das pessoas com 15 anos ou mais é de 8,3%–redução de 0,4 ponto porcentual em relação a 2012, quando o índice era de 8,7%. A maior retração ocorreu no Nordeste. A taxa caiu de 17,4% da população nessa faixa etária para 16,6%. Ainda assim, é nessa região que estão 53,6% dos Analfabetos do País. A região Sudeste concentra 24,2%dos Analfabetos.

A taxa de Analfabetismo entre as pessoas com menos de 30 anos é baixa – 1% entre os que têm entre 15 e 19 anos; de 1,5% na faixa entre 20 e 24 anos; e de 2,3% entre 25 e 29 anos. O problema se agrava na faixa etária entre 40 e 59 anos, em que a taxa é de 9,2%; e a partir dos 60 anos, quando o Analfabetismo alcança 23,9% dos brasileiros.

É o caso do operário José Batista da Silva, de 57 anos, que deixou os estudos para ajudar os pais na lavoura, em Araruama, Região dos Lagos. “Construo uma casa como ninguém. Sei fazer as contas no mercado, sei as horas para tomar remédio. A sabedoria que tenho, Deus me deu. Só não escrevo nada”, afirma o pedreiro. Mulheres eram a maioria dos Analfabetos em 2013 (50,6%). Nas regiões Sudeste e Sul, essa proporção ficou acima da média nacional; 56,2% e 55,6%, respectivamente.

O nível de instrução do brasileiro melhorou como um todo. O número de pessoas com Ensino fundamental incompleto caiu de 33,5% para 31,2%. Com Ensino médio incompleto passou de 4% para 3,9%. O porcentual dos que terminaram esses ciclos de Ensino subiu de 9,8% para 10% (fundamental) e de 25,2% para 25,9% (médio).

A proporção de brasileiros que terminaram o Ensino superior passou de 12% para 12,9%. Entre 2011 e 2012, a taxa de Analfabetismo havia crescido 0,1 ponto porcentual (de 8,6% para 8,7%). “Como havíamos afirmado, não configurava aumento do Analfabetismo e seria preciso esperar a Pnad 2013 para avaliar. O resultado podia ter sido influenciado pela amostra”, afirmou a gerente da Pnad, Maria Lucia Vieira.


Escolas públicas perdem alunos para a rede privada


A Escola pública encolheu. A Pnad 2013 mostra que 76,5% dos estudantes estavam matriculados em alguma instituição pública. Em 2012, era 77,4% dos estudantes. Em um ano, foram 445 mil Alunos a menos. Nesse período, os estudantes da rede particular passaram de 12,1 milhões para 12,6 milhões. A redução de matrículas na Escola pública tem se mostrado uma tendência – nos anos de 2004 e 2005,80,9%dos estudantes brasileiros estudavam em instituições municipais, federais ou estaduais. A partir de 2006, essa proporção começa a cair. “A Pnad reforça o que o Censo Escolar já vinha mostrando. Também encomendamos estudo à Fundação Getúlio Vargas que mostra essa migração da Escola pública para a particular nos segmentos da Educação infantil e no Ensino fundamental.

O Ensino médio está estagnado”, afirma o diretor da Federação Nacional das Escolas Particulares (Fenep),Antônio Eugênio Cunha. Ele aponta a ascensão da classe C como uma das causas para essa migração. “O poder aquisitivo melhorou, consequentemente as pessoas querem qualidade de serviço. E a Educação é fundamental.” Em 2013, a Região Centro Oeste era a que tinha a maior proporção de Alunos matriculados em Escolas pagas, 27,3%. O Sudeste vem em segundo lugar, com 26,3%; seguido de Sul (24,2%); Nordeste (21,8%); e Norte (14,6%).

O Grupo Educacional Alub, voltado para a classe C, com 11 unidades em Goiás e Brasília, é exemplo dessa migração – saltou de 5 mil Alunos em 2013 para 11 mil, este ano. “Esse fenômeno tem duas causas: o aumento do poder aquisitivo de uma parcela da população que agora ganha entre R$ 3 mil e R$ 4 mil; e a falta de Escolas públicas nos novos bairros”, afirma Alexandre Crispi, diretor do Grupo Alub. “A classe C já não consegue se manter nos centros, onde estão as Escolas, e vai para esses novos bairros, que não chegam a formar uma periferia. São áreas verticalizadas, com condomínios com serviços,mas onde a Escola pública não chegou”, disse Crispi. Ele sugere a criação de um Pro Uni para os Ensinos fundamental e médio. Ele se refere ao programa do governo que dá bolsas integrais ou parciais para a Educação superior em instituições privadas. “A Escola particular está recebendo mais de 300 mil Alunos por ano. É uma demanda grande, que Estados e municípios não conseguem suprir”, afirmou.

A coordenadora do movimento Todos Pela Educação,Alejandra Meraz Velasco, ressalta que os dados do Índice de Desenvolvimento da Educação básica (Ideb), divulgado no início do mês, que apontam para uma queda da qualidade na Educação particular, são um sinal de alerta. “A qualidade percebida pelos pais na Escola particular é almejada e, na medida em que as condições econômicas permitem, eles fazem essa migração. Mas o indicador de que a qualidade da Escola particular caiu é preocupante. Essa expectativa não se cumpre”, afirma. Para Alejandra, a saída dos Alunos com melhor condição econômica é prejudicial para o Ensino público. “O ideal seria o contrário.

A Escola pública melhoraria muito se a classe média trouxesse seus filhos. Numa discussão mais ampla, não tem bala de prata na Educação: a melhora passa pela execução do Plano Nacional de Educação, melhorar a infraestrutura, investir na formação de Professores,oferecer condições de trabalho”, disse Alejandra. Antônio Eugênio Cunha, da Fenep, disse que a“grande preocupação” da Escola particular é manter a qualidade. “Recebemos Alunos com algumas defasagem, que enfrentaram greves, que não tiveram Professores de algumas matérias. Fazemos a adequação ao longo do ano. Não é imediato”, afirmou Cunha. 

A luta por uma bolsa de estudo

Ser Aluno de uma Escola de qualidade sempre foi um objetivo do estudante Luiz Wagner Santana de Souza, de 16 anos. Morador do bairro da Pedreira, na zona sul da capital, ele ficou até o final do Ensino fundamental em uma Escola pública.No entanto,no ano passado, Luiz foi selecionado para ser bolsista em uma Escola particular. A iniciativa de migrar para a rede privada partiu de Luiz, que já conhecia o projeto do Colégio Santa Maria, com bolsas de estudos para Alunos da rede pública, desde quando cursava o 7.º ano do Ensino fundamental.

Ao saber que poderia participar do teste, o estudante se ofereceu para concorrer à vaga. Ele conta que 60 Alunos disputaram 12 vagas e se esforçou para ser um dos selecionados. “Eu sempre pensei que a Escola pública não era suficiente para eu entrar em uma boa faculdade. Para conseguir entrar na Escola particular, vi o conteúdo da prova na internet e comecei a estudar mais.” A prova avaliava conhecimentos em português, matemática e inglês.

Adaptação. Após ser aprovado, ele teve de enfrentar outro desafio: a adaptação. “Em uma das primeiras aulas, de física,todas as pessoas da sala sabiam de um tema que era do (Ensino) fundamental e eu não sabia.Precisei estudar mais para conseguir acompanhar”, relembra. Luiz conta que quer trabalhar como economista ou jornalista. E afirma que pretende seguir vida acadêmica. “Depois que eu entrei na Escola particular, percebi o valor da Educação. Passei a admirar os Professores da Escola particular e também os da Escola pública”, disse.

A mãe do estudante, a gerente de restaurante Ligia Mara Santana, de 49 anos,diz que não teria condições de pagar uma Escola particular e não esconde o orgulho que sente pelo filho. “Ele sempre foi um dos melhores Alunos, nunca participei de uma reunião na Escola da qual eu saísse chateada”, afirmou. Estudante do 3.º ano do Ensino médio do Colégio São Luís, Mateus Santos Rodrigues, de 17 anos, também decidiu que participaria de um processo seletivo para conseguir entrar na rede privada. “Foi uma decisão minha, meus pais ficaram preocupados, porque eu ia estudar à noite, mas conversei com a minha família e meus pais acabaram aceitando. Este é meu último ano lá e está sendo fantástico”, elogia. Mateus afirma que tem vivido uma experiência enriquecedora como bolsista. “Ter contato com pessoas diferentes é algo positivo.As realidades se complementam”, declarou.

A consultora de vendas Fernanda Rodrigues Tiezzi, de 37 anos, resolveu tirar a filha de 15 anos da rede pública após se decepcionar com uma Escola na Mooca, na zona leste, no ano passado. “Minha filha estudou dois anos em uma Escola pública e mudamos de bairro. Ela ficou só duas semanas em outra Escola, também pública, mas estava sem Professores e vi Alunos fumando e bebendo na porta. Fui obrigada a colocá-la em uma Escola particular”, explicou.

A filha de Fernanda, Gabrielly Tiezzi, de 15 anos, agora está estudando no Colégio São Judas Tadeu e diz que também encontrou dificuldades para acompanhar o conteúdo de uma Escola privada. “Precisei ter aulas com um Professor particular. Agora, está muito mais fácil”, afirma Gabrielly.

 Aumenta número de crianças na Pré-escola

Às vésperas da entrada em vigor da lei que determina que todas as crianças de 4 anos estejam na Escola, o desafio dos municípios ainda é grande. A Pesquisa Nacional por A mostra de Domicílios (Pnad) revela que uma em cada cinco crianças de 4 e 5 anos não estava estudando. Segundo o estudo, a taxa de Escolarização dessa faixa etária era de 81,2%.Essa proporção é 3,1 pontos porcentuais maior do que em 2012, quando 78,1% das crianças de 4 ou 5 anos frequentavam Creches ou maternais. “Até 2016, todas as crianças de 4 e 5 anos têm de estar na Escola.

Aumentar em alguns pontos porcentuais é preocupante, porque os prefeitos têm praticamente apenas o ano que vem para criar um milhão de vagas”, disse Alejandra Meraz Velasco, coordenadora do movimento Todos Pela Educação.

A inserção da mulher no mercado de trabalho pode explicar o fato de haver mais crianças na Pré-Escola, aponta a gerente da Pnad, Maria Lucia Vieira. “Há um movimento de mais mulheres no mercado de trabalho. Essas crianças precisam estar em algum lugar”, afirmou. “Não investigamos se estão em Creches particulares,ou se estão com babás de aluguel, que ficam com muitas crianças em casa.” O Nordeste se destaca com 86,9% das crianças com 4 e 5 anos estão na Escola, índice superior ao do Sudeste (84,9%), Sul (72,9%) e Centro-Oeste (72,1%).

O Norte tem a menor proporção, 67,9%. Entre os Estados do Nordeste, o Piauí tem a maior cobertura, com 93% dos meninos emeninas de 4 e 5 anos em Creches e maternais. “Essa situação do Nordeste é muito atípica. É uma região que está pior em todos os indicadores,exceto na Creche e Pré-Escola. Mas pesquisas qualitativas feitas no Nordeste mostram que essa Pré-Escola não é boa.O paradigma ainda é muito o da assistência social”,afirmou Alejandra.

Pesquisas indicam que cursar dois anos da Pré-Escola melhora a concentração, independência e a cooperação das crianças. Mais à frente, terá influência na leitura e na escrita. Mas Alejandra ressaltou que não é “qualquer Educação infantil”que melhora o desempenho do Aluno nas séries mais avançadas. “Não defendemos a Escolarização da Pré-Escola. Não se trata de adiantar o primeiro ano do Ensino fundamental. Mas é preciso ter um planejamento pedagógico para a Pré-Escola”, disse.

Embora tenha crescido o acesso à Pré-Escola, a participação da rede pública é menor nas séries iniciais, o que demonstra que as mulheres ainda têm dificuldades de conseguir Creches para seus filhos. No Nordeste, 33,1% das crianças de 4 e 5 anos estão na rede particular. No Centro-Oeste, o índice é de 30,9; no Sudeste, de 25,4%; no Sul, de 20,1%; e no Norte, de 17%. Em 2011, a presidente Dilma Rousseff anunciou plano de ampliação da rede de Creches e Pré-Escolas, seriam construídas mais 6,4 mil até o fim do mandato – 2,2 mil foram concluídas. As obras de 4,1 mil Creches ainda estão em execução.

Maior taxa de Escolarização é no Ensino fundamental

A maior taxa de Escolarização ocorre entre a faixa etária de 6 a 14 anos – 98,4% das crianças dessa idade estão matriculadas no Ensino fundamental. A frequência Escolar, a partir dos 6 anos, está entre as exigências para o recebimento do Bolsa Família. Manter os Alunos no Ensino médio continua a ser desafio. Entre os adolescentes, a frequência Escolar cai – 84,3% dos jovens de 15 a 17 anos estão na Escola. Para a faixa etária de 18 a 24 anos (que, teoricamente, estaria no Ensino superior), a taxa de Escolarização foi de 30,1%, superior aos 29,3% de 2012. O Norte tem o maior porcentual de pessoas com mais de 25 anos estudando – 5,6%.

MEU FILHO JÁ SABE MAIS DO QUE EU

Gleidevânia dos Santos, empregada doméstica,de 33 anos, e Damiana Macedo, de 36 anos, desempregada, diariamente levam e vão buscar seus filhos, de 5 anos, em uma Pré-Escola municipal, no bairro do Cordeiro, zona oeste do Recife, onde moram.

Gleidevânia é analfabeta e Damiana aprendeu “algumas palavras e a desenhar o nome”, na mesma instituição, em um curso noturno para adultos, no ano passado. Ambas apostam na Pré-Escola como uma forma de preparar melhor os filhos para a vida e como uma garantia de que eles não vão repetir suas histórias de limites e exclusão. “Meu filho já sabe mais do que eu”, afirmou Gleidevânia, com orgulho de Vítor Gabriel dos Santos, filho único, que iniciou na Pré-Escola em 2013 e já conhece as letras e o nome.

O pai não assumiu a paternidade e nunca viu o menino. Ela aproveita a hora do almoço para buscá-lo na Escola,almoçar e deixá-lo em um projeto da igreja à tarde. “Não quero meu menino solto por aí, não quero que ele passe pelo que passei.” Como salário mínimo que recebe, paga R$ 300 de aluguel. Ela quer aprender a ler e escrever assim que Vítor possa ficar em casa sozinho à noite. “Por enquanto, ele é pequeno. Mas vou gostar de poder ajudar meu filho a fazer as tarefas”, afirmou,antevendo o dia em que estará apta a decifrar palavras.“Agente vai ajudar um ao outro.” Sua meta é ver o filho se tornar um homem de bem, qualificado, com uma profissão.

Diferença. Mãe de seis filhos, Damiana disse ver a diferença de João Paulo para os irmãos mais velhos, que não fizeram a Pré-Escola. A caçula, de 3 anos, já está matriculada para o próximo ano. “No tempo dos meninos maiores (do primeiro casamento), acho que nem tinha Pré-Escola”, observou. “O aprendizado é mais rápido, o menino está muito mais preparado.” Damiana reconhece o empenho dos Professores e agradece à Escola por tê-la advertido para a possibilidade de João Vítor precisar da ajuda de um profissional.

O menino tem dificuldade de concentração e sintomas de hiperatividade. Depois de conversar comum a psicopedagoga, ela aguarda um encontro marcado comum psicólogo. “Meu filho vai ter mais condição de aprender a ser gente no mundo”, disse José Antonio da Silva, de 49 anos, ao buscar o caçula Assis da Silva, 6 anos, no fim da manhã. Enquanto Ana, de 11 anos, também fez Pré-Escola,os três mais velhos,do primeiro casamento, não tiveram a mesma oportunidade. Uma filha foi assassinada depois de se envolver e se viciar em crack. José Antonio vive de recolher e vender latinhas para reciclagem e também é Analfabeto.

A Escola municipal Darcy Ribeiro oferece cinco turmas da Pré-Escola – três pela manhã e duas à tarde, com 24 crianças cada uma. Para a vice-diretora, Maria do Bom Parto Oliveira, o maior desafio é conquistar a participação dos pais na vida Escolar dos filhos. “Quando conseguimos criar essa parceria, o retorno é mais efetivo”, afirma, satisfeita por ter reunido quase 50%dos pais no encontro do primeiro semestre. “Fizemos reuniões nos três turnos, já que a maioria dava a desculpa de estar trabalhando na hora agendada”, contou. “Nunca tínhamos alcançado esse porcentual.”

Opinião: Sinais alarmantes na área social

Naercio Menezes Filho

Os dados da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) sempre trazem informações bastante interessantes. A vantagem da Pnad com relação à PME (Pesquisa Mensal de Emprego), por exemplo, é que as informações são representativas a nível nacional, ao passo que as da PME abrangem somente as principais regiões metropolitanas do Brasil. Além disso, a Pnad abrange também o setor informal da economia, enquanto os dados da Rais/Caged (Ministério do Trabalho e Emprego) cobrem somente o setor formal. A desvantagem da Pnad é que precisamos aguardar mais tempo para obtermos um retrato fidedigno da situação do País.

O que mostram os novos resultados? Em primeiro lugar, notamos que houve um pequeno aumento da taxa de desemprego no País como um todo. Isso indica que o desaquecimento da economia brasileira pode estar chegando ao mercado de trabalho. Vale notar, porém, que o aumento do número de pessoas com emprego com relação a 2012 indica que esse aumento do desemprego ocorreu principalmente em razão do aumento do número de pessoas que ingressaram no mercado de trabalho e estão à procura de emprego. Os dados da pesquisa mostram avanço do desemprego na Região Norte do País e também em São Paulo.

O desemprego em São Paulo parece estar refletindo a grave crise da indústria no País. É notória a dificuldade que os empresários industriais estão encontrando para aumentar sua produtividade e conseguir conquistar novos mercados. Interessante notar também que o salário real médio continua aumentando, apesar do aumento do desemprego. Mas o aumento de rendimento foi um pouco maior entre os que recebem salários maiores do que entre os que ganham menos, o que contribuiu para um pequeno aumento da desigualdade.

Quebra de tendência. Vários fatores podem estar explicando essa quebra na tendência de redução da desigualdade que vínhamos observando nos últimos anos na economia brasileira. Em primeiro lugar, o aumento real do salário mínimo foi bem menor entre o período de 2012 e 2013 do que nos anos anteriores. Nos últimos dez anos, o aumento do salário mínimo provocou um forte aumento da renda dos trabalhadores que ganham menos.

Como o salário dos trabalhadores mais qualificados ficou basicamente estagnado, a desigualdade de renda declinou. No entanto, entre 2012 e 2013 a renda dos trabalhadores que ganham menos aumentou 3,5%, ao passo que a dos trabalhadores com maiores salários aumentou 6,4%.

Outro fator que pode estar influenciando a desigualdade de renda é o próprio desaquecimento do mercado de trabalho. Nos últimos anos, o intenso crescimento da renda dos trabalhadores com menos qualificação ocorreu também em razão do crescimento que foi puxado pelo setor de serviços. Havia um círculo virtuoso nesse setor.

Os trabalhadores que obtiveram aumentos na renda familiar (em razão do salário mínimo e das transferências feitas pelo governo) passaram a consumir mais serviços (por exemplo, cabeleireiros, mecânicos, restaurantes) e a construir mais casas.

Esses setores empregam justamente os trabalhadores não qualificados. Como a oferta de jovens menos Escolarizados está caindo (em razão do avanço educacional na última década), seu salário aumentava mais do que o dos trabalhadores mais Escolarizados. Entretanto, a redução do aumento real do salário mínimo e o desaquecimento do mercado de trabalho podem estar sugerindo que esse processo está chegando ao fim.

O que podemos fazer para que a desigualdade continue a declinar? É necessário, em primeiro lugar, melhorar o gerenciamento macroeconômico da economia para que o Produto Interno Bruto (PIB) volte a crescer e, com isso, o salário mínimo volte a aumentar.

Além disso, é preciso aumentar a produtividade do trabalho na indústria e no setor de serviços, para que o aumento de salários não provoque uma inflação. Por último, é necessário melhorar mais rapidamente a qualidade da Educação no Brasil, para aumentar a produtividade de nossos trabalhadores. No entanto, os últimos resultados do Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação básica) mostram que essa melhoria na qualidade da Educação não está acontecendo. Assim, as perspectivas futuras não são nada boas.


Desemprego sobe, desigualdade para de cair e volta aos níveis de 2011

Em plena campanha eleitoral, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) aponta os primeiros sinais de esgotamento do contínuo processo de ganhos econômicos e sociais experimentados ao longo de mais de uma década no Brasil, com redução da concentração de renda, ampliação do consumo e bem-estar e avanços na Educação–filme no qual a emergente classe C passou de estreante a protagonista. A piora começou pelos indicadores econômicos, como mostra a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) de 2013, divulgada ontem.

O baixo desemprego e a queda da desigualdade, duas das principais bandeiras dos governos do PT na economia, interromperam importantes sequências de quedas, nas quais renovavam, ano após ano, recordes de baixa. O quadro geral é de estagnação nos níveis de 2011. A taxa de desemprego nacional, medida anualmente pelo IBGE, ficou em 6,5% em 2013, acima dos 6,1% registrados em 2012, a primeira alta desde 2009, quando a economia sofria os piores efeitos da crise mundial de 2008.

O Índice de Gini, que mede a concentração de renda, piorou para 0,498 em 2013, ante 0,496 em 2012, considerando o rendimento do trabalho – quanto mais perto de zero menor a desigualdade. Para o IBGE, o quadro é de estagnação. A explicação para a interrupção no processo de queda da desigualdade visto no País por uma década está na disparidade, entre pobre se ricos, nos ganhos de renda.

O rendimento do trabalho emendou o 9.º ano seguido de crescimento real em 2013, mas 324 mil brasileiros entraram para a extrema pobreza, interrompendo a trajetória de que da nessa parcela da população, segundo estudo obtido pelo Estado. Candidata à reeleição, a presidente Dilma Rousseff (PT) relativizou a estagnação na queda da desigualdade, afirmando que, ao se olhar para a frente, “há uma extraordinária queda da desigualdade”.

A candidata do PSB, Marina Silva, disse que a interrupção na queda da desigualdade e o aumento do desemprego são resultado de “políticas erráticas” do governo. “Como se não bastasse o crescimento baixo, a volta da inflação, a elevação dos juros, agora temos o retorno da concentração de renda, que estava fazendo uma inflexão para baixo”, disse Marina.

O candidato do PSDB, Aécio Neves, afirmou que “a administração da pobreza faz bem ao projeto do PT”. “É fundamental aumentar empregos de qualidade. Por que o Brasil ainda está comum a média salarial tão baixa? Porque estamos virando o País do pleno emprego de dois salários mínimos.

O PT comemora isso como se fosse uma grande proeza. Esses empregos são importantes, mas é essencial que nós encontremos formas de dar competitividade ao setor industrial, que é onde estão os empregos de qualidade”, afirmou Aécio. Apesar disso, algum nível de bem-estar propiciado pelo maior acesso ao consumo se manteve.

O número de residências com computador e carro cresceu em 2013. A emergência da classe C também causa impacto nos indicadores de Educação. No ano passado, 76,5% dos estudantes estavam matriculados em alguma instituição pública, em comparação aos 77,4% em 2012 e aos 80,9% em 2004. Especialistas apontam que houve migração para o Ensino privado–fenômeno relacionado ao aumento da renda, mas também à baixa qualidade do Ensino público.

O nível de Escolaridade cresceu pouco: a média de anos de estudo passou de 7,5 em 2012 para 7,7 em 2013. Já a taxa de Analfabetismo recuou de 8,7% para 8,3%, mas ainda há 13,3 milhões de Analfabetos no País.

Entrevista: ‘Problemas econômicos afetam o avanço social das últimas décadas’

O economista José Márcio Camargo dedicou parte significativa de sua carreira a estudar o mercado de trabalho e a pensar em políticas sociais. Ele acha que a estagnação da queda da desigualdade na Pnad 2013 indica que os problemas da economia começam a afetar os grandes avanços sociais brasileiros das últimas décadas. Camargo, que foi um dos formuladores intelectuais do Bolsa Escola, que precedeu o Bolsa Família, é Professor da PUC-Rio e economista-chefe da gestora de recurso Opus. A seguir, trechos da entrevista.

O que o sr. achou da parada da queda da desigualdade?
A economia brasileira cresceu muito pouco e gerou bem menos emprego. É muito difícil reduzir desigualdade com um ambiente econômico como este, comparado ao anterior, de crescimento muito mais forte. Outra questão é que, entre 2003 e 2010, os termos de troca brasileiros cresceram muito, isto é, o preço de nossas exportações subiu mais rápido que o das importações. O fenômeno criou grande espaço para a redução da desigualdade. Agora, parece que o mercado de trabalho começou a refletir o baixo crescimento e o fim da alta dos termos de troca. E há aspectos setoriais relevantes.

Quais?
A Pnad mostra que o emprego aumentou nos serviços, comércio e construção, e teve queda na indústria e na agricultura. Os empregos do setor industrial têm maior qualidade quando comparados com os dos serviços, comércio e construção civil, que costumam pagar salários mais baixos.

Por que houve essa mudança setorial?
Isso ilustra o sério problema de competitividade da economia brasileira. O comércio, os serviços e a construção civil são setores de produtos não comercializáveis internacionalmente, isto é, que não competem com importações que entram aqui. Já o caso ruim da indústria, que compete dessa forma, mostra que a economia está estagnada por falta de competitividade. Há na indústria queda do emprego e da produção e aumento da participação das importações.

Há críticas de que o atual modelo econômico se esgotou. A Pnad 2013 poderia ser um primeiro sinal disso?
Acho que há um ciclo que, na verdade, vai do início dos anos 90 até 2006, 2007. Uma série de reformas foi realizada na economia brasileira, até mesmo com o início da redução da desigualdade, mas os frutos começaram a ser colhidos mesmo principalmente a partir de 2002, e isso em parte deveu-se também ao ciclo de commodities. Todo o processo redundou em crescimento e redução de desigualdade e desemprego. A partir de 2006, a política econômica começou a mudar e, anos mais tarde, o ciclo das commodities cedeu. Tivemos uma política menos voltada a tornar os mercados eficientes, e mais disposta a intervir neles. Isso acabou prejudicando o investimento, a taxa de crescimento e aumentando significativamente o desemprego, que foi de 6,1% em 2012 para 6,5% em 2013.

A alta real menor do salário mínimo nos últimos anos pode ter contribuído para frear a queda da desigualdade?
Acho que o efeito maior do salário mínimo se dá via programas de transferências do governo, como aposentadorias, seguro-desemprego, benefício assistencial para idosos, etc. No mercado de trabalho, provavelmente o impacto é menor. Então, via programas, pode ter tido um efeito. Mas acho interessante notar que, com a melhora dos termos de troca, o Brasil conseguiu ter salário mínimo real maior, salários em geral maiores e mais emprego. É o que em economia chamamos de um deslocamento para cima da curva de demanda. O problema é que o fim desse período traz essa curva para baixo, e fica mais difícil que todas coisas boas aconteçam ao mesmo tempo. De agora em diante, para que os salários subam em termos reais, será preciso ter aumentos de produtividade importantes.

Um aspecto positivo da Pnad 2013 foi que a formalidade continuou crescendo.
Há anos venho insistindo no ponto de que a informalidade brasileira é explicada pela enorme cunha tributária. O trabalhador ganha 100 e o empresário gasta 140 com ele. Os dois optam pela informalidade e dividem os 40. Mas agora temos a desoneração da folha, a expansão do Simples, fatores que estão reduzindo esse espaço de negociação que mencionei. E o resultado previsível é a queda da informalidade.

Qual papel o sr. vê hoje para a política social de transferências?
Desde que participei da formulação do conceito do Bolsa Escola, na década de 90, dou ênfase à condicionalidade nessas políticas de transferência. Manter a criança na Escola era o aspecto principal do Bolsa Escola. A política de transferências cresceu muito e nem tudo está ligado a condicionalidades que busquem dar condições estruturais para que a pobreza seja definitivamente superada. Programas simples de distribuição de renda não vão resolver o problema da desigualdade, não há recursos suficientes. É preciso que o estoque de capital humano se torne mais igualitário, que as crianças das famílias pobres recebam mais Educação e de melhor qualidade. No longo prazo, o problema se resolve com Escola pública de alta qualidade e em tempo integral para todas as crianças pobres do País.

 

http://www.todospelaeducacao.org.br/educacao-na-midia/indice/31427/ainda-ha-13-milhoes-de-analfabetos-no-brasil/

  




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