Autonomia do BC e justiça social
Autonomia do BC pode prejudicar reforma tributária progressiva.
Najla Passos
Dar autonomia ao Banco Central pode significar a interdição completa da agenda de uma reforma tributária progressiva, que contribua com a justiça social.
"Dar autonomia ao Banco Central pode significar a interdição completa da agenda de uma reforma tributária progressiva, que contribua com a justiça social". Quem afirma é o professor da Pós-graduação em Políticas Públicas da Universidade de Brasília (UnB), Evilasio Salvador, autor do estudo “As implicações do sistema tributário brasileiro nas desigualdades de renda”, lançado nesta quinta (11) pelo Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc).
O professor lembra que o conceito de banco central independente faz parte do ideário liberal. “O Banco Central é um instrumento, uma autoridade reguladora fundamental. Dar autonomia a ele significa você entregar a principal autoridade monetária brasileira para o mercado. É entregar o sistema financeiro para os bancos, ou seja, deixa-lo fora de qualquer controle democrático da sociedade e de quem será eleito para governar de fato”, explica.
Ainda de acordo com ele, o ideário liberal também propõe um modelo específico de sistema tributário. “Se um governo caminha com ideias liberais, no sistema tributário ele tende a adotar desregulamentações, desonerações, e não tocar nas questões centrais que provocam a alta concentração de renda do país. Ou seja, uma possível independência do Banco Central tornaria ainda mais bloqueada uma agenda de uma reforma tributária mais progressiva”, alerta.
Pressão popular
Evilasio Salvador acredita também que, na atual conjuntura política brasileira, uma reforma tributária que torne a cobrança de impostos mais progressiva e justa só será possível com pressão popular e já no início do próximo governo. “Eu só vejo essas alterações possíveis nos seis, sete primeiros meses de governo e com forte apoio da sociedade para que o sistema tributário seja instrumento para a construção de uma sociedade mais justa”.
Isso porque, segundo ele, o debate sobre a reforma tributária é sempre apropriado por dois viés: a questão de classe e a federativa. “Primeiro, discute-se quem vai pagar a conta no final da história? Porque, no Brasil, quem mais reclama da carga tributária, que vai à televisão, que monta impostômetro, é quem menos paga impostos. Então, qualquer modificação é muito difícil porque implica em uma redistribuição de renda pela ótica tributária, o que significa você dizer que o patrão vai pagar, proporcionalmente, mais tributos do que seus empregados”, explica.
O outro entrave, conforme o professor, é a questão federativa. “Dificilmente, qualquer governo que não tenha os governadores dos estados alinhados ao poder central vai conseguir ter força no congresso nacional para fazer as modificações necessárias. A pressão popular sobre o parlamento, portanto, é fundamental”, argumenta.