O racismo tratado com complacência
O racismo tratado com complacência no Grêmio
O imaginário mudou. Nem todos perceberam. Aquilo que era aceito, ou engolido, não passa mais.
Há muito que eu denuncio as manifestações de racismo de parte da torcida do Grêmio.
Em 2009, escrevi sobre isso e enfrentei a ira de um pelotão de choque.
Fui bombardeado com os tradicionais argumentos contra a generalização e com o sofisma de que se tratava de preconceito da minha parte ou de clubismo. Gosto de futebol. Tenho cada vez mais aversão a clubes. Eu me arrependo de ter me declarado colorado em função de um nostalgia da infância. Não tenho partido nem clube. Só tenho a minha liberdade.
Combater o racismo é mais importante do que defender clube. O STJD foi até brando com o Grêmio. Excluiu o clube de uma competição da qual já estava virtualmente eliminado. Alguns dirigentes estão vibrando. Do males, acham, o menor.
Quando escrevi sobre racismo no Grêmio, os mais fanáticos usaram o clichê “a instituição Grêmio” nada tem com isso.
A instituição podia ter feito, como agora, alguma coisa.
O fato de o árbitro de Grêmio e Santos não ter registrado na súmula o acontecido mostrou o descaso com atos racistas entre nós.
A punição a ele foi muito adequada.
Racismo existe entre torcedores de qualquer clube.
Esse fato geral não pode absolver as práticas particulares e recorrentes.
Na época, 2009, recebi um e-mail de um segurança do Grêmio.
Aqui vai.
“Bom dia Juremir!
Peço ao amigo que mantenha em SIGILO meu NOME e TELEFONE contidos neste e-mail.
TRABALHO NA AREA DE SEGURANÇA PRIVADA A MAIS DE 10 ANOS, REALIZANDO ESTE SERVIÇO EM DIAS DE JOGOS TANTO NO BEIRO-RIO QUANTO NO OLÍMPICO.
E AFIRMO COM TODAS AS LETRAS QUE EXISTE SIM RACISMO DENTRO DA INSTITUIÇÃO GRÊMIO FUTEBOL PORTO-ALEGRENSE, NO SEU QUADRO SOCIAL E TORCIDAS ORGANIZADAS.
ONTEM TRABALHEI NA SEGURANÇA DENTRO DO ESTÁDIO OLIMPÍCO E CONSTATEI EM DIVERSOS MOMENTOS BOA PARTE DA TORCIDA NA PARTE SOCIAL, FAZENDO GESTOS E IMITANDO SONS DE MACACO PARA OS JOGADORES “NEGROS” DO CRUZEIRO QUE AQUECIAM-SE PERTO DO BANCO DE RESERVAS EATRÁS DE UMA DAS GOLEIRAS.
ESTES FATOS FORAM NOTADOS PELAS EMISSORAS DE RÁDIO E TELEVISÃO QUE TRANSMITIAM O JOGO.
E O MAIS LAMENTÁVEL DE TUDO É QUE NOTEI PAIS INSTIGANDO SEUS FILHOS A FAZEREM O MESMO.
DESDE O FATO OCORRIDO QUANDO UMA PARTE DE UMA DETERMINADA TORCIDA ORGANIZADA, TENTOU FAZER UMA HOMENAGEM COM FAIXAS AO LENDÁRIO EVERALDO E A LUPICÍNIO RODRIGUES AMBOS NEGROS, FATO ESTE QUE TODOS SABEM O QUE OCORREU NO FINAL COM A TENTATIVA DE ASSASSINATOE AMEAÇAS VIA INTERNET A SEUS IDEALIZADORES, A DIREÇÃO GREMISTA JAMAIS TOMOU PROVIDENCIAS DEFINITIVAS PARA BANIR ESTE TIPO DE PESSOAS.
A DIREÇÃO DO GRÊMIO POSSUÍ CAMERAS DE VIGILÂNCIA NAS DEPENDÊNCIAS DO ESTADIO E DEVERIA USA-LAS PARA IDENTIFICAR ESTAS PESSOAS QUE FAZEM ESTES GESTOS E IMITAM O SOM DE MACACOS, ABORDANDO-AS, IDENTIFICADO-AS E ASSIM TOMAR TODAS AS PROVIDÊNCIAS CABÍVEIS PARA QUE ISTONÃO OCORRA MAIS.
SE ESTES FATOS OCORRE SEM NA EUROPA, TENHO PLENA CERTEZA DE QUE ESTANDO A INSTITUIÇÃO GRÊMIO E OS TORCEDRORES IDENTIFICADOS SERIAM PUNIDOS, MAS ESTAMOS NO BRASIL E COMO TUDO……
Cordialmente…”
O que fez a imprensa gaúcha em relação a essa denúncia? Nada.
O que fez o Grêmio? Nada.
Um torcedor, depois das minhas críticas, ainda em 2009. me enviou esta pérola, entre tantas que recebi cheias de indignação:
“É MUITA IGNORÂNCIA ATIRAR A PECHA DE RACISTA A UM CLUBE CUJO HINO FOI COMPOSTO POR UM NEGRO E É CANTADO EM TODOS OS JOGOS PELA TORCIDA”.
Outros tantos me chamaram de hipócrita, de falso e de querer aparecer.
As bobagens de sempre.
Outro foi mais direto: “Juremir = vai à merda !”
Respondi tranquilamente:
“É claro que o Grêmio como instituição não é racista. É óbvio que a torcida gremista não é racista. Mas acontecem manifestações racistas de torcedores do Grêmio, inclusive nas sociais do Olímpico. Isso foi documentado em imagens de televisão. E existem inúmeros testemunhas. Eu tenho e-mails inclusive de funcionário do Grêmio denunciando essas práticas. Houve também manifestações racistas de torcedores do Grêmio no orkut. No jogo Grêmio e Cruzeiro, torcedores do Grêmio imitaram macacos quando Elicarlos entrou em campo e quando outros jogadores negros faziam aquecimento. Ser torcedor é uma brincadeira para mim. O próprio presiente do Grêmio, Duda Kroef, em declaração ao Correio do Povo, reconheceu que o Grêmio precisa coibir esse tipo de manifestação. Eu fico impressionado que se tente encobrir algo tão sério com argumentos de torcedor. Isso é o menos importante. Existem coisas mais importantes na vida do que ser torcedor de futebol. O Rio Grande não se divide entre azuis e vermelhos. Há coisas bem mais relevantes do que isso”.
O que fez o Grêmio então? Nada.
Quem semeia complacência com o preconceito, ao longo do tempo, colhe punição.
A partir de agora, quem colocar no google “racismo, futebol”, encontrará Grêmio.
A instituição podia ter passado sem essa.
O Inter que se cuide com a homofobia.
http://www.correiodopovo.com.br/blogs/juremirmachado/?p=6350