Ampliação do Fies

Ampliação do Fies

O que está por trás da ampliação do Fies?

Após a confirmação, no Plano Nacional de Educação (PNE), da inclusão do Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) – bem como do Programa Universidade para Todos (ProUni) e do Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec) – entre os chamados “investimentos públicos” em educação, nesta quarta-feira (2) foi a vez da consolidação de algo que já estava anunciado há algum tempo: a extensão do Fies a cursos de pós-graduação. A portaria que amplia o fundo de financiamento, destinando-o a cursos de mestrado, mestrado profissional, doutorado e educação profissional técnica de nível médio foi publicada nesta quarta-feira no Diário Oficial da União.

A medida foi assinada na última terça-feira pelo ministro da Educação, Henrique Paim. Na solenidade, o titular da pasta citou o próprio PNE ao afirmar que, pelo novo plano, o país tem o compromisso de elevar as matrículas da pós-graduação. No entanto, embora o ministro tenha frisado que é preciso tomar cuidado para que a ampliação seja feita com qualidade, em sua fala ele revelou que se trata de uma demanda antiga do setor privado. Ou seja, por trás do investimento na ampliação do acesso à pós-graduação e/ou ao ensino técnico médio – o que, sem dúvida, é importante para o desenvolvimento do país –, o que está em jogo são também os interesses financeiros dos empresários da educação.

Recentemente, veículos da imprensa nacional denunciaram que as instituições de ensino superior credenciadas pelo MEC para receber recursos do Fies reajustaram suas mensalidades bem acima dos aumentos promovidos pelas universidades que não contam com essa linha de crédito. Em média, segundo o jornal Correio Braziliense, a diferença gira em torno de 2,5% ao ano, podendo, em alguns casos, chegar até 9,3%. Isso significa que, por um lado, os estudantes estão se endividando para pagar cursos cada vez mais caros e, por outro, as instituições de ensino particulares que adotam essa prática se valem do dinheiro certo repassado pelo governo, sem qualquer inadimplência, para aumentarem ainda mais seus lucros.

Já no caso da educação profissional técnica de nível médio, a situação se agrava. A Contee tem críticas contundentes ao Pronatec, por exemplo, em função da distorção existente no programa, que transformou o Sistema S no principal responsável pela educação técnica no Brasil, sem o devido controle sobre os repasses de verbas públicas e com ataques aos direitos trabalhistas, como professores sendo chamados de “instrutores” numa forma de driblar a legislação e precarizar o trabalho. Agora, o que a portaria em questão estabelece é que o governo, além de destinar dinheiro público para financiar o acesso aos estudantes na educação profissionalizante de nível médio via iniciativa privada, sequer exija em contrapartida a gratuidade dos cursos, o que representa um verdadeiro absurdo.

Por diversas vezes, a Contee ressaltou seu reconhecimento de que o Fies – assim como o ProUni e o Pronatec – assumiu um papel relevante de facilitar o acesso de brasileiros mais pobres, em sua maioria filhos da classe trabalhadora, aos ensinos superior e técnico-profissionalizante de nível médio  – e, agora, a pós-graduação stricto sensu. Entretanto, em vez de serem encaradas como medidas emergenciais e transitórias, que não substituem a necessidade de ampliação e investimento na qualidade das vagas públicas, há tentativas cada vez mais perigosas de transformar esses programas em políticas de Estado, haja vista o que foi aprovado e sancionado no próprio PNE, minando a exclusividade da educação pública sobre os 10% do Produto Interno Bruto (PIB) do país.

Assim, a postura do governo mostra como ele parece não só ter fechado os olhos para questões como o aumento abusivo das mensalidades por parte de estabelecimentos de ensino e mantenedoras que têm justamente no Fies uma de suas principais bases de crescimento, como também revela a ascendência cada vez maior do setor privado sobre o MEC, um dos principais defensores, juntamente com o forte lobby dos privatistas, pela manutenção, no texto do PNE, das “parcerias público-privadas” entre os investimentos públicos em educação.

Além disso, é preciso enfatizar que os contratos do Fies são firmados diretamente com a Caixa Econômica Federal, de modo que, se por um acaso o curso deixar de existir, o contrato continua valendo, sem que sejam tomadas quaisquer providências pelo MEC, como já acontece com cursos de graduação que são fechados e instituições que são descredenciadas.

A Contee defende que os investimentos em todos os níveis de ensino – da educação infantil à pós-graduação – são primordiais para o desenvolvimento do Brasil enquanto nação forte e soberana, garantindo o direito constitucional de cada cidadão a uma educação de qualidade. Mas, no caso das parcerias público-privadas, elas só reforçam ainda mais a necessidade extrema de regulamentação da educação privada, submetendo-a às mesmas exigências legais aplicadas à rede pública, como determina o caráter sistêmico da educação nacional. Isso não elimina o fato, porém, de que a construção de uma nação soberana deve ser feita a partir de investimento pleno em educação pública e gratuita, com as devidas referências sociais.

A portaria que estende o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) a cursos de mestrado, mestrado profissional, doutorado e educação profissional técnica de nível médio está publicada na edição de hoje (2) do Diário Oficial da União. Antes, o financiamento era direcionado apenas à graduação.

O Fies da pós-graduação não atenderá a cursos de especialização, os chamados lato sensu, nem cursos de ensino a distância. Alunos já contemplados com bolsas de estudo pelo Programa de Suporte à Pós-Graduação de Instituições de Ensino Particulares (Prosup) também não poderão solicitar o financiamento

Da redação

O apetite colossal do setor privatista

Depois de ter lutado para incluir a rede privada como destinatária de verbas públicas no Plano Nacional de Educação (PNE), por meio do dispositivo que engloba, no texto, os recursos aplicados “nos programas de expansão da educação profissional e superior, inclusive na forma de incentivo e isenção fiscal, as bolsas de estudos concedidas no Brasil e no exterior, os subsídios concedidos em programas de financiamento estudantil e o financiamento de creches, pré-escolas e de educação especial”, o Ministério da Educação contribuiu para que as instituições de ensino superior privadas façam o que mais sabem fazer: querer mais.

A inclusão de ações como o Fundo de Financiamento Estudantil, o Programa Universidade para Todos (ProUni) e o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec) entre os “investimentos públicos” determinados pelo PNE, aliada à recém-publicada portaria que expande o Fies a cursos de mestrado, mestrado profissional, doutorado e educação profissional técnica de nível médio (leia aqui a crítica publicada pela Contee), foi um sinal claro para que os privatistas se considerassem no direito de aumentar seu apetite por verbas públicas. Agora, o que as IES e mantenedoras esperam é que o programa amplie ainda mais o seu alcance e passe a financiar também cursos de graduação e pós-graduação a distância (Ead) ainda neste ano (leia aqui as informações do Portal iG).

A Contee apontou nesta quinta-feira (3), em relação à expansão do Fies já realizada pela portaria, o quão perigosa pode ser a medida, uma vez que o que está em jogo, muito mais do que uma demanda por acesso à pós-graduação e a cursos técnico profissionalizantes de nível médio – que são, sim, fundamentais para o direito da sociedade à educação e para o desenvolvimento soberano do país –, é, na verdade, o interesse financeiro do setor privado. Além disso, para a Contee, as parcerias público-privadas não podem, de maneira alguma, substituir os investimentos fundamentais em educação pública, gratuita e de qualidade socialmente referenciada.

No caso da EaD, contudo, a situação tem mais um agravante: a baixa qualidade de grande parte dos cursos ofertados. O próprio MEC não tem mais credenciado instituições para a modalidade da educação a distância, exatamente em função dessa qualidade precária e da dificuldade de supervisionar tais instituições e cursos (o que reforça a urgência da aprovação do projeto de lei que cria o Instituto de Supervisão e Avaliação do Ensino Superior – Insaes).

Entretanto, como estamos em ano eleitoral e os empresários da educação formam um setor bastante “ativo” politicamente – haja vista o forte lobby na tramitação do PNE –, é certo que farão de tudo para manter seus benefícios e interesses. Daí a intensa pressão, por um lado, para abrir novamente o credenciamento na educação a distância e, por outro, para viabilizar o lucro através da garantia de pagamento pelo FIES, grande responsável pelo crescimento dessas empresas e fonte da maior parte de seus lucros, uma vez que garante a elas dinheiro certo repassado pelo governo, sem qualquer inadimplência.

Evitar a distorção tanto ideológica quanto prática desses programas – que deveriam ser medidas emergenciais e transitórias, e não políticas de Estado –, bem como impedir sua transformação em fonte inesgotável de recursos públicos para os privatistas, é uma das lutas da Contee, a ser enfatizada neste ano de eleições. Para isso, é fundamental unir forças em defesa da aprovação do Insaes e também da instituição do Sistema Nacional de Educação, a fim de que a educação privada seja devidamente regulamentada e submetida às mesmas regras aplicadas à educação pública.

Da redação http://contee.org.br




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