Ensinamos com a qualidade da Finlândia

Ensinamos com a qualidade da Finlândia

"Avaliações externas mostram que os alunos da rede pública têm bom ensino em todo o país - e que os professores nunca foram tão valorizados", afirma Camila Guimarães

Fonte: Revista Época - Edição Especial Brasil em 2030  25 de maio de 2014

Para celebrar seu 16º aniversário, ÉPOCA convida você a entrar na máquina do tempo. Ao completarmos 16 anos, enviamos nossos repórteres 16 anos no futuro, para 2030. De lá, eles relatam, com base nos melhores exemplos internacionais disponíveis em 2014, como será o Brasil às vésperas da 11a eleição presidencial desde a redemocratização. Será o país dos nossos sonhos.

A Educação Básica no Brasil de 2030 se parecerá com a da Finlândia, país onde todos os professores de primeiro grau têm mestrado e recebem salários iniciais de R$ 10 mil. Na saúde, contamos como ficará o Sistema Unificado de Saúde, o SUS, depois de ser redesenhado nos moldes do National Health Service, o celebrado serviço de saúde pública do Reino Unido. Uma dica: em 2030, apenas 10% dos brasileiros ainda usarão planos de saúde privados. No futuro, andaremos tão seguros pelas ruas das metrópoles quanto cidadãos japoneses, que gozam os menores índices de criminalidade do planeta. O segredo: polícia comunitária, a mesma introduzida no Rio de Janeiro pela pacificação das favelas.

>Ensinamos com a qualidade da Finlândia

Camila Guimarães

Neste ano, o Brasil conseguiu cumprir uma das metas mais ambiciosas determinadas na reforma do Ensino básico: dar Educação de qualidade a todos os Alunos, independentemente de sua origem socioeconômica. Os indicadores divulgados pelo Ministério da Educação na semana passada mostram que o desempenho dos Alunos nas cidades mais pobres do país se igualaram ao das cidades mais ricas. O relatório mostra também que a maioria das redes municipais e estaduais de Ensino oferecem Educação de qualidade com equidade. Quase 95% das redes deram Ensino adequado a suas Escolas, não importando se elas estão em bairros pobres ou ricos.

Os resultados são da avaliação anual que o governo brasileiro faz do Ensino básico. São aplicadas provas de português, matemática e ciências para os Alunos do 3°, 5º e 9° anos, além do 3° ano do Ensino Médio. A divulgação dos números nacionais aconteceu algumas semanas depois dos resultados do Pisa, a avaliação internacional feita pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que mede os conhecimentos, nas mesmas áreas, de Alunos de 15 anos de mais de 60 países. Na prova aplicada no ano passado, o Brasil conseguiu sua melhor colocação. Ficou entre os dez melhores do mundo, à frente dos Estados Unidos e da França, e atrás apenas de tradicionais campeões como Finlândia e Coreia do Sul.

A meta da qualidade com equidade é perseguida há quase duas décadas. Antes da grande reforma do Ensino básico, que aconteceu a partir de 2015, a equidade era o maior desafio da Educação brasileira. Os números de então mostravam uma situação complicada. A média da nota (do 5* ano) do Estado com melhor desempenho, Minas Gerais, era de 5,8. A do pior, Alagoas, 3,5. Entre as cidades, a diferença era maior ainda. Claraval, em Minas Gerais, tinha 8,3. Monteirópolis, em Alagoas, 2,5. Mesmo os Alunos com melhor desempenho não aprendiam o que deveriam na idade prevista. Apenas 27% dos Alunos do último ano do Ensino fundamental sabiam o mínimo de português. De matemática, 17%. A situação do Ensino médio era ainda mais dramática. Só 10% seguiam adiante sabendo matemática. E 29%, português.

A virada na qualidade da Educação pública brasileira começou quando o país se voltou para a Finlândia, país referência em qualidade. De lá, veio a inspiração para os dois pilares da reforma: a valorização da carreira do Professor e o currículo único nacional, que determina o que cada Aluno deve saber ao final de cada ano Escolar.

Assim como na Finlândia, ser Professor no Brasil de hoje dá prestígio. Com salário inicial de R$ 10 mil, valor no mesmo patamar que a média dos países da OCDE, todos ps Professores têm mestrado, obrigatório para quem quer ensinar crianças a partir de 6 anos. Ao contrário do que acontecia em 2014, a carreira do Professor segue a meritocracia. As Escolas públicas são

livres para negociar salários, contratar os melhores e demitir os piores profissionais. Há 16 anos, o corporativismo impedia avanços nessa direção. Os Professores ganhavam aumentos iguais, de acordo com o tempo de serviço. Seus empregos eram estáveis e não havia nenhum tipo de avaliação de desempenho. Hoje, os Professores passam por avaliações e recebem apoio do governo para melhorar seus pontos fracos. O investimento público em treinamento de Professores só é superado pelo pagamento de salários. O engajamento da sociedade na valorização do Professor foi fundamental. Governo, entidades ligadas à sociedade civil e os sindicatos conseguiram chegar a um acordo. O pacto seguiu para a esfera política. Qualquer que fosse o partido no governo, a prioridade era fazer a reforma dar certo.

A segunda inspiração que veio da Finlândia foi criar uma referência nacional do que os Alunos de cada série do Ensino básico devem aprender. As redes e as Escolas têm liberdade de trabalhar os conteúdos como bem entenderem, mas sempre seguindo critérios estipulados pelo MEC. Um problema específico recebeu especial atenção: o currículo do Ensino médio. Em 2014, o Brasil oferecia apenas um tipo de Ensino para os jovens, voltado para o vestibular, com um currículo pouco atraente. A evasão era de quase 40%. A solução foi criar Escolas voltadas para o mercado de trabalho, em período integral. Os jovens escolhem que Escola preferem. Assim como na Finlândia, o Ensino médio não é obrigatório no Brasil, mas apenas 1% dos Alunos que terminam o Ensino fundamental deixou de cursá-lo.

Como todos os países desenvolvidos, o Brasil passou a investir mais na Educação básica que no Ensino superior. Em 2014, investíamos o quíntuplo num Aluno de universidade do que no Ensino fundamental. Essa proporção se inverteu quase ao mesmo tempo que o país aumentou o patamar de investimento geral na Educação para 10% do Produto Interno Bruto (PIB). Ainda há muito a fazer para melhorar, mas a lição de casa foi feita.




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