Os planos municipais e o PNE

Os planos municipais e o PNE

Os planos municipais de educação e os processos participativos

Por Ana Luiza Basílio - Centro de Referências em Educação Integral - 11/04/2014

15/04/2014

Quando olhamos para os planos de educação, a fotografia brasileira mostra que cerca de 30% dos municípios ainda não possui um plano e aqueles que têm ainda não os utilizam como direcionadores de suas políticas públicas, desconhecidas de grande parte da população. (Dados da Pesquisa de Informações Básicas Municipais, Munic 2011 – IBGE).

Os planos municipais de educação são instrumentos importantes na efetivação do direito à educação de qualidade de um município, no período de dez anos. Tem-se aí um primeiro desafio. “Eles atuam contra a descontinuidade das políticas e têm a possibilidade de abranger o conjunto do território, promovendo um diálogo entre as diferentes redes atuantes, sejam elas municipais, estaduais, federais ou privadas”, esclarece a assessora do programa Diversidade, Raça e Participação da Ação Educativa, Ananda Grinkraut.

Para além da demanda de estabelecer ou revisar os planos educacionais, também se faz necessária a implementação de processos participativos durante a elaboração dessas políticas. Isso significa considerar juntamente com gestores e especialistas a participação de toda a comunidade, como pais ou responsáveis, estudantes, coordenadores e outros atores sociais. “Essa é uma maneira de trazer legitimidade ao plano, de fazer com que ele reflita as demandas locais e, assim, ganhe o reconhecimento da comunidade educacional”, defende Ananda.

E como estruturar esse processo participativo? Como garantir uma gestão democrática que considere e encaminhe os apontamentos feito pela sociedade? Quais são os desafios eminentes dos gestores públicos e escolares? Reunimos especialistas para debater o assunto. Confira!

Por que garantir a participação?

Além da participação ser um direito de todo cidadão (prevista na CF/1988, LDB/1996, PNE/2001 e PNE/2011), que deve ter garantidas possibilidades de criticar e reivindicar seus direitos e da coletividade, ela também se configura como instrumento de qualificação e aprimoramento das políticas públicas. “Diversificar sujeitos e vozes é uma forma de garantir maior envolvimento das pessoas e instituições, de mobilizar compromissos e de aproximar as diretrizes políticas das demandas sociais”, reforça Ananda Grinkraut. Segundo a especialista, os processos participativos trazem benefícios em mão dupla: “além da sociedade civil ter mais clareza dos processos educacionais, a gestão pública pode colocar à mostra seus desafios e limites”, complementa.

A coordenadora do Programa de Educação do Geledés – Instituto da Mulher Negra – e integrante do grupo de trabalho de Educação da Rede Nossa São Paulo, Suelaine Carneiro, reforça que a elaboração, o planejamento, execução e fiscalização das políticas educacionais não podem ser de competência única e exclusiva do Estado. “Não se trata de transferir a responsabilidade para a sociedade civil. Ainda que a responsabilidade seja do Estado, a construção dessas etapas precisa ser dividida com a comunidade educativa e outros segmentos sociais interessados e atingidos pelos efeitos dessas políticas para que suas demandas sejam refletidas no desenho das políticas educacionais”, considera.

Os desafios e a gestão democrática

A participação, no entanto, nem sempre acontece de maneira espontânea. Para a coordenadora da área de educação da Ação Educativa, Denise Carreira, embora tenhamos conquistado espaços participativos, eles pouco influenciaram na tomada de decisão da gestão pública brasileira. “Diminuir essa cisão é um desafio da nossa redemocratização”, reconhece.

Para isso, é fundamental que os princípios da participação, transparência e democracia estejam presentes já na gestão pública, “que deve superar uma cultura política expressa na resistência e nas limitações do Estado aos processos participativos, e a existência de uma concepção de que um plano de educação deve ser elaborado nos gabinetes por ‘especialistas da área’”, avalia Suelaine.

Intersetorialidade

Segundo a vice-presidente da União dos Conselhos Municipais de Educação (UNCME) e presidenta do Conselho Municipal de Rio Claro (SP), Valéria Vélis, as instâncias gestoras devem se articular entre si para uma condução democrática. “Os dirigentes de ensino precisam se unir para além das funções deliberativas”, avaliou, indicando a importância das secretarias de educação reconhecerem o papel dos conselhos municipais, comissões, fóruns, como articuladores entre a sociedade civil e o poder público.

Para envolver a comunidade nesse processo, Valéria aposta na prática. ”A participação se legitima quando a sociedade entende que esse processo pode virar uma ação futura”, aponta. O processo também deve ser valorizado pelas escolas. “Por isso, incentivamos uma estrutura escolar que contemple conselhos escolares e grêmios estudantis que são instituições participativas. A escola é um laboratório de democracia”, reconhece.

Os planos municipais devem considerar essa construção coletiva a partir de vários canais, com a organização de plenárias, a contribuição dos conselhos participativos, mobilização e envolvimento das escolas e de todos os funcionários, por consultas públicas, conferências e outras instâncias. “Isto é fundamental para o fortalecimento da noção de cidadania e ainda fará com que este seja um documento da cidade, com efeito para todos os operadores da educação neste território, sejam eles de esfera municipal, estadual ou federal. Somente um Plano de Educação construído de forma participativa conseguirá enfrentar os muitos desafios, o leque de desigualdades e fortalecer o combate ao racismo na educação brasileira”, avalia a coordenadora do Geledés, Suelaine Carneiro.

Os planos municipais e o PNE

O Plano Nacional de Educação (PNE) é, sem dúvida, um norteador das políticas educacionais vigentes. Mas especialistas entendem que sua inexistência não deve impactar na consolidação dos planos municipais. “Essa orientação já está dada desde a versão anterior do PNE, de 2001″, relembra Ananda Grinkraut. A recomendação da especialista é que, caso haja alguma discrepância muito grande em relação ao texto final, o município inicie um processo de revisão.

A condução participativa

A construção do Plano Municipal de Educação (PME) de Rio Claro teve início em 2011. Naquele ano, a gestão se aproximou do debate acerca do PNE, cruzando-o às demandas do plano municipal. “Selecionamos as 20 metas do PNE, as encaixamos em 10 temáticas e trouxemos especialistas para conversar com os integrantes de nossa rede”, relembra Valéria Vélis. “Logo após, fizemos seminários temáticos abertos à população para que cada um trouxesse as suas demandas, totalizando dez plenárias”, indica.

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A partir do processo, a gestão instaurou uma comissão representativa que teria o papel de se aprofundar sobre as necessidades juntamente com o conselho municipal. Para sua formação, foi aberto um processo de convocação para a sociedade e eleição aos candidatos.

Teve início o processo de diagnóstico do município. “Estabelecemos algumas comissões, uma para educação infantil, uma para educação fundamental e Educação de Jovens e Adultos (EJA), para que cada uma se responsabilizasse pela coleta de dados”, explica Valéria. Após o levantamento das informações, foram realizadas três audiências públicas para a comunidade, que tinham como objetivo compartilhar as etapas cumpridas até ali. Já com uma proposta esboçada, a gestão organizou um seminário sobre o plano municipal de educação para referendar os encaminhamentos. O plano foi oficialmente entregue como projeto de lei ao prefeito do município no final de 2013 e agora está sob a responsabilidade jurídica da Secretaria Municipal de Negócios Jurídicos.

Para a presidenta do Conselho de Rio Claro, a rede municipal está em aprendizagem quando o assunto é democracia. “Mas é um caminho sem volta”, alega confiante. “A gestão democrática é uma política de Estado e não mais de governo. Tivemos ganhos ao iniciar e consolidar esse processo no município e não ficamos apenas no discurso representativo de papel”, avalia.

A secretária municipal de educação de Rio Claro, Heloisa Maria Cunha do Carmo, acredita que muitos gestores acabam temendo as responsabilidades de uma política educacional tendo em vista a questão orçamentária dos municípios. “Sabemos que há o problema das receitas não acompanharem as previsões, mas vejo que os gestores envolvidos com a melhoria da educação têm que enxergar essa necessidade”, finaliza.

Texto construído com apoio das informações do De Olho nos Planos


Por Ana Luiza Basílio - Centro de Referências em Educação Integral - 11/04/2014

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