Parecer PGE Readaptação
PARECER Nº 16258
READAPTAÇÃO. SITUAÇÃO REMUNERATÓRIA. PARCELA POR DIFERENÇA DE READAPTAÇÃO. PARECER Nº 14139/04. IRREDUTIBILIDADE VENCIMENTAL. JURISPRUDÊNCIA LOCAL EM SENTIDO DIVERSO AO PRECONIZADO NO PARECER Nº 14419/06. DIVERGÊNCIA HERMENÊUTICA. ORIENTAÇÃO ADMINISTRATIVA. REVISÃO
Vem a esta Equipe de Consultoria da Procuradoria de Pessoal da Procuradoria-Geral do Estado o EA n. 64656-1900/09-0, no qual, em razão de divergência interpretativa relativamente ao instituto da readaptação, bem como da reiteração de demandas que vêm obtendo acolhimento em seara judicial, questiona-se acerca das conclusões constantes no Parecer nº 14419/06, em particular no que respeita à vinculação remuneratória do servidor readaptado e a sua atualização monetária.
Nos Autos em tela, por desconformidade manifestada por Auditor Público Externo do Tribunal de Contas do Estado - Informação nº CS1158/2013 - questiona-se a orientação exarada por esta Casa, no sobredito Parecer, sugerindo-se medidas corretivas por parte da Secretaria da Fazenda, em ato inativatório produzido em obediência àquilo orientado no mesmo Parecer.
Também vem anexado o Parecer nº 1759/2013, de autoria de Adjunta de Procurador do Ministério Público de Contas, onde há a subscrição das conclusões desta Procuradoria-Geral do Estado.
Assim, instalada a discussão hermenêutica, aporta o mencionado expediente administrativo, para análise.
É o sucinto Relatório.
O tema em tela foi tratado, como vem informado nos Autos, no Parecer nº 14419/06, de autoria deste signatário, onde, após análise do instituto da readaptação e de seus vínculos constitucionais, concluiu-se que, naquilo que mais interessa neste momento, que, a irredutibilidade vencimental assegurada ao readaptado é aquela de caráter nominal - conforme pauta posta pelo Supremo Tribunal Federal -, verificada no momento da readaptação, devendo ser assegurada, se for o caso, "parcela completiva", nos termos do Parecer nº 14139/04 desta Procuradoria-Geral, como resultado da hermenêutica sistemática da norma contida no Art. 41 da Lei Complementar nº 10098/94, em observância dos ditames constitucionais.
Tal leitura, como se observa da manifestação do Ministério Público de Contas, acostada, vem corroborada por referido órgão.
Também, há diversas manifestações doutrinárias que compactuam com a referida postura, como exemplificativamente:
4.2 - A composição da remuneração
No que tange à remuneração do servidor público readaptado, cremos que a premissa que deve servir de norte para a aferição da legitimidade constitucional da aplicação da readaptação é a mesma estabelecida no tópico anterior: deve ser evitado o surgimento de situação funcional que acarrete inequívoco benefício ou que enseje prejuízo manifesto para o readaptando.
Com efeito, restou frisado acima que um dos parâmetros a serem observados na identificação do cargo a ser ocupado em virtude de readaptação é a sua similaridade vencimental com o cargo originário ocupado pelo servidor. Em consequência, deve ser afastada ao máximo a possibilidade da readaptação acarretar incremento ou redução vencimental ao readaptando.
Ocorre, contudo, que podem advir situações (e é comum que assim se verifique) nas quais o único cargo no qual o servidor possa vir a ser readaptado é remunerado em patamar inferior ao do cargo originariamente ocupado pelo mesmo.
Nessas hipóteses, a questão da remuneração do servidor readaptado passa necessariamente pela fiel observância pela Administração Pública do princípio da irredutibilidade de vencimentos, consagrado no art. 37, XV da Magna Carta de 1988.
Destarte, embora o servidor, após a readaptação, venha a se submeter a novo regime remuneratório, isto é, à disciplina legal da remuneração do novo cargo, em termos globais o quantum de sua remuneração não poderá sofrer decréscimo. Eventual diferença entre o que recebia o servidor no cargo originário e o que vier a receber no novo cargo deverá ser-lhe paga à parte na composição de sua nova remuneração, a título de parcela complementar reajustada anualmente pelo índice geral de revisão da remuneração dos servidores públicos.
E no que tange às gratificações de serviço, isto é, as de caráter propter laborem, que eram percebidas pelo servidor em virtude do exercício das atribuições do cargo originário? Devem essas vantagens pecuniárias integrar o montante da remuneração do servidor para fins de vedação da redutibilidade?
A resposta é negativa.
As gratificações de serviço segundo lição de Hely Lopes Meirelles "(...) só devem ser percebidas enquanto o servidor está prestando o serviço que as enseja, porque são retribuições pecuniárias pró-labore faciendo e propter laborem. Cessado o trabalho que lhes dá causa ou desaparecidos os motivos excepcionais e transitórios que as justificam extingue-se a razão de seu pagamento". (Meirelles, 2001, p. 458).
Desse modo, se acaso o servidor percebia, por exemplo, gratificação de insalubridade antes de ter sido readaptado em outro cargo cujas atribuições não são insalubres, não há direito algum à continuidade do pagamento daquela verba. Não há ofensa, nessa hipótese, ao mandamento constitucional que proíbe a redução de vencimentos. O Superior Tribunal de Justiça vem adotando esta orientação quanto ao tema:
"ADMINISTRATIVO. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. DEFENSOR PÚBLICO DO ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL. GRATIFICAÇÕES DE SUBSTITUIÇÃO DA PGDP E DE ATUAÇÃO PERANTE OS JUIZADOS ESPECIAIS, TURMAS RECURSAIS E TRIBUNAL DO JÚRI. ART. 88, INCISOS V E VI, DA LEI COMPLEMENTAR ESTADUAL N.º 51/90. CARÁTER PROPTER LABOREM. PERCEPÇÃO DURANTE LICENÇA PARA TRATAMENTO DE SAÚDE. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. IMPOSSIBILIDADE.
1. O direito ao recebimento das gratificações objeto do presente mandamus está diretamente vinculo ao exercício das atribuições que lhes motivam a percepção, evidenciando o caráter propter laborem e, portanto, os valores a elas pertinentes somente são devidos ante o efetivo exercício.
2. A Administração Pública está rigorosamente submetida ao princípio da legalidade, sendo-lhe defeso interpretar a lei de forma extensiva ou restritiva, de forma a conceder, pagar ou restringir direitos, caso a norma legal assim não dispuser.
3. A alegação de que o caso dos autos assemelha-se à disciplina legal adotada para o período de férias é desarrazoada, porquanto ausente previsão legal que motive a percepção das gratificações quando há licenciamento temporário para tratamento de saúde.
4. O não recebimento das vantagens em razão do caráter propter laborem afasta a violação do princípio da irredutibilidade de vencimentos.
5. Recurso ordinário a que se nega provimento. (RMS 20036/MS, QUINTA TURMA, Rel. Ministra LAURITA VAZ, DJe 15/12/2009)".
No que concerne especificamente à análise da questão em face da readaptação funcional, a mencionada Corte de Justiça possui jurisprudência específica acerca desta matéria:
"PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL. MAGISTÉRIO. READAPTAÇÃO. SUPRESSÃO DA GRATIFICAÇÃO DE ESTÍMULO ÀS ATIVIDADES DE CLASSE. POSSIBILIDADE. SUPRESSÃO DO AUXÍLIO ALIMENTAÇÃO. AUSÊNCIA DE PROVA PRÉ-CONSTITUÍDA. RECURSO A QUE SE NEGA PROVIMENTO". (RMS 32014/BA, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA TURMA, DJe 12/08/2010)
RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. SERVIDORA ESTADUAL DO MAGISTÉRIO. READAPTAÇÃO. GRATIFICAÇÃO DE REGÊNCIA DE CLASSE. SUPRESSÃO. CARÊNCIA DA AÇÃO.
A impetrante, servidora readaptada, não logrou demonstrar o alegado direito líquido e certo. Nos termos da legislação de regência, a Gratificação de Regência é devida ao servidor, desde que preenchidos os requisitos, dentre eles estar no efetivo exercício do magistério.
Recurso desprovido.
(RMS 17471/SC, QUINTA TURMA, Rel. Min. JOSÉ ARNALDO DA FONSECA, DJ 16/05/2005).
(Ver: CAVALCANTE, Mário Sales. "Aspectos Polêmicos do Instituto da Readaptação Funcional no Âmbito da Administração Pública" - Revista Controle - Vol. IX - Nº 2 - Jul/Dez 2011)
Todavia, desde a edição do referido Parecer, a jurisdição local vem dando interpretação distinta ao mesmo texto normativo, considerando, para o que aqui interessa, em síntese, que o readaptado, mesmo vindo a prover um novo cargo, permanece vinculado, em particular quanto às regras remuneratórias, ao antigo, percebendo a remuneração daquele, bem como se beneficiando das revisões e outros benefícios direcionados para a carreira a que se vinculava originariamente.
Disto são exemplos as decisões que seguem:
APELAÇÃO CÍVEL E REEXAME NECESSÁRIO. SERVIDOR PÚBLICO. agente penitenciário. READAPTAÇÃO NO CARGO DE agente administrativo. IRREDUTIBILIDADE DE VENCIMENTOS. ARTIGO 41, PARÁGRAFO ÚNICO, DA lEI COMPLEMENTAR Nº 10.098/94. honorários advocatícios.
1. O servidor readaptado não pode sofrer prejuízos em sua remuneração, fazendo jus aos vencimentos do cargo de origem, inclusive reajustes e vantagens concedidos a esta categoria funcional. Art. 41, parágrafo único, da Lei Complementar nº 10.098/94.
2. Tratando-se de ação ajuizada contra a Fazenda Pública, caracterizada a repetitividade da demanda, sem a necessidade de produção probatória, os honorários advocatícios devem ser fixados no patamar de 10% sobre as parcelas vencidas até a sentença e o mesmo percentual sobre uma anuidade das parcelas vincendas, nos termos do art. 260, CPC.
APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.
SENTENÇA CONFIRMADA, NO MAIS, EM REEXAME NECESSÁRIO. (TJRS - 4ª Câmara Cível - Apelação nº 70050830546)
APELAÇÃO CÍVEL. REEXAME NECESÁRIO. READAPTAÇÃO. LC/RS Nº 10.098/94. IRREDUTIBILIDADE DA REMUNERAÇÃO VINCULADA AO CARGO ANTERIOR. ISONOMIA REMUNERATÓRIA EM RELAÇÃO ÀS FUNÇÕES ATUAIS. JUROS. TERMO INICIAL. CITAÇÃO.
A readaptação prevista no art. 39 da LC/RS nº 10.098/94 tem por finalidade a adequação funcional do servidor público que, em face de condições físicas ou mentais, não possui plena capacidade para continuar exercendo as funções próprias do cargo no qual inicialmente investido.
Readaptado às novas funções, compatíveis com sua capacidade e aptidão, a lei (art. 41 § único da LC 10.098/94) garante a irredutibilidade da remuneração e o vínculo com o cargo anterior, inclusive as vantagens decorrentes da ascensão.
Inaplicável, para efeitos de reajustes salariais, a Lei Estadual/RS nº 11.758/02, por conter erro material e, portanto, de vigência ineficaz porque a ela anexada tabela de escala de índices definidos pela Lei Estadual nº 9.228/81, revogada pela Lei Estadual nº 10.084/91. Precedentes desta Corte.
Cabível a concessão dos reajustes das Leis nº. 12.222/04, arts. 2º, III e 3º e 12.443/04, art. 1º, I, uma vez que destinados ao cargo originário, mantendo-se, no entanto, a possibilidade de comepnsação no caso de já adimplido algum
Em relação às diferenças apuradas, deverá incidir correção monetária pelo IGP-M desde o vencimento de cada parcela e juros de mora de 6% ao ano, a partir da citação. Todavia, a contar de 30-06-2009, em face do advento da Lei 11.960/09, que alterou a redação do artigo 1º-F da Lei 9.494/97, a incidência de juros e de atualização monetária se operará com base nos índices oficiais aplicados à caderneta de poupança.
RECURSO DE APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDO. REEXAME NECESSÁRIO PREJUDICADO. (TJRS - Quarta Câmara Cível - Apelação nº 70049093628)
APELAÇÃO CÍVEL. SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL. PROFESSORA. READAPTAÇÃO NO CARGO DE AGENTE ADMINISTRATIVO. PARECER Nº 14.419 DA PGE/RS. VINCULAÇÃO DA REMUNERAÇÃO AO NOVO CARGO. IMPOSSIBILIDADE. DIREITO À REMUNERAÇÃO DO CARGO DE ORIGEM, INCLUSIVE QUANTO AOS REAJUSTES FUTUROS. APLICAÇÃO DO ART. 41 E PARÁGRAFO ÚNICO DA LEI Nº 10.098/94. PRECEDENTES DO SEGUNDO GRUPO CÍVEL E DE SUAS CÂMARAS CÍVEIS. direito aos reajustes previstos nas leis nº 12.222/04 e nº 12.442/06.
- Segundo dispõe o artigo 41 da LC nº 10.098/94, é vedado à administração proceder à diminuição da remuneração do servidor quando realizada a readaptação, ficando assegurado o vencimento correspondente ao cargo ocupado anteriormente.
- Observância ao Princípio da Irredutibilidade dos Vencimentos, previsto na Carta Magna.
- Reajustes advindos das Leis Estaduais 12.222/2004 e 12.442/2006 que deverão incidir sobre o vencimento do cargo de professora e não sobre o básico do cargo de agente administrativo.
NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO DE APELAÇÃO.
(tjra - Terceira Câmara Cível - apelalão nº 70039573779)
Ou seja, tem-se que a jurisdição gaúcha tem promovido um entendimento que contrasta com aquele produzido por esta Equipe de Consultoria, considerando que o readaptado, em síntese, "não pode sofrer prejuízos em sua remuneração, fazendo jus aos vencimentos do cargo de origem, inclusive reajustes e vantagens concedidos a esta categoria funcional."
Embora esta não pareça ser a melhor dicção do texto normativo em análise - art. 41, Parágrafo Único da LC nº 10098/94 -, considerado no contexto da ordem normativa brasileira, há que se considerar que a gestão administrativa vem se confrontando com inúmeras decisões nesse sentido, bem como esta Casa, em razão de tratar-se de matéria de legislação local, não tem obtido êxito na tentativa de reverter tal entendimento com o manejo do competente recurso aos Tribunais Superiores, o que ocasiona custos acrescidos decorrentes de processos judiciais
Assim sendo, mesmo sem promover-se uma revisão substancial da jurisprudência administrativa, a qual, como se lê nos Autos, encontra eco no próprio Ministério Público de Contas, é conveniente que se adeque esta àquilo que se constitui como decisão definitiva em sede judicial - como uma "verdade processual" - em contradição com a posição por nós esposada no Parecer nº 14419/06.
Ou seja, ao readaptando há que se assegurar, aliás como já estabelecido no Parecer nº 14419/06, a irredutibilidade vencimental, porém, agora, considerando-se a situação funcional que detinha na carreira de origem e no cargo ocupado primariamente, garantindo-lhe uma "irredutibilidade real" de sua remuneração, deixando de aplicar-se a nomeada "parcela completiva", como até aqui, deixando-o vinculado, quanto à questão remuneratória, à carreira e ao cargo original.
Há que se considerar, por oportuno, ainda, que, nos termos do art. 41 do Estatuto, estão excetuadas as vantagens inerentes ao exercício do cargo.
Também, considerando-se o caráter de investidura excepcional em novo cargo público, apesar da construção jurisprudencial parecer andar em sentido diverso, há que se renovar o indicativo de que a readaptação deve, sempre, ser realizada em cargo que o mais amplamente se compatibilize com a situação original do servidor, sobretudo no que respeita ao seu "quantum" remuneratório.
Por outro lado, alternativamente, há que se promover no âmbito do governo estadual - uma vez tratar-se de matéria de competência da função executiva - estudos no sentido da elaboração de proposta de alteração legislativa que fixe expressamente a vontade política relativamente ao instituto da readaptação, em um espectro que vai desde a sua manutenção até, eventualmente, a sua extinção.
É o Parecer.
Porto Alegre, 19 de fevereiro de 2014.
JOSE LUIS BOLZAN DE MORAIS
PROCURADOR DO ESTADO
EA 64656-1900/09-0
Processo nº 64656-19.00/09-0
Acolho as conclusões do PARECER nº 16.258/14, da Procuradoria de Pessoal, de autoria do Procurador do Estado Doutor JOSE LUIS BOLZAN DE MORAIS.
Em 27 de março de 2014
Bruno de Castro Winkler,
Procurador-Geral Adjunto para Assuntos Jurídicos.
De acordo.
Encaminhe-se o expediente à Secretaria da Fazenda.
Em 27 de março de 2014.
Carlos Henrique Kaipper,
Procurador-Geral do Estado.