Promover respeito às diferenças
Prática escolar pode promover respeito às diferenças
Na Faculdade de Educação (FE) da USP, pesquisa da pedagoga Ana Paula Sefton investigou uma proposta de prática docente e escolar que acolhe as diferenças de gênero e de sexualidade. A partir da análise do contexto de uma escola de ensino fundamental particular em Porto Alegre (Rio Grande do Sul), o trabalho identificou condições que pudessem gerar a transformação das disposições culturais de gênero e sexualidade por meio das relações sociais entre professores, gestores, alunos e familiares.
O estudo procurou mostrar como a prática docente, interpelada por um ambiente escolar favorável, embora imersa em uma sociedade sexista, tem condições de levar uma socialização para o convívio das diferenças.
Júlio Bernardes
Educador deve rever os próprios conceitos e pré-conceitos e fazer questionamentos
“Em geral, a sociedade na qual vivemos é pautada em preceitos do patriarcado, que resultam em representações pré-definidas de como devem ser e atuar homens e mulheres em sociedade, sem considerar que tais pensamentos foram e são construídos socialmente a partir de interesses e de jogos de saber e de poder”, aponta Ana Paula. “A escola analisada apresenta práticas educativas e um ambiente de condições favoráveis para o questionamento das disposições de cultura sexistas e homofóbicas em prol do acolhimento às diferenças, sejam na relação da pessoa com ela mesma ou com as demais em sociedade.”
De acordo com a pedagoga, entre os pontos que favorecem esse resultado estão o “ambiente escolar favorável, com a convergência entre práticas pedagógicas e premissas escolares, e a formação acadêmica de excelência de docentes e gestores, incluindo a característica etária destes profissionais que tende a impulsionar uma postura aberta e reflexiva”. Ana Paula também destaca “o apoio familiar e da comunidade escolar e o acompanhamento do percurso escolar dos filhos, favorecendo que valores, experiências e significados fossem corroborados a propósitos promovidos pela escola”.
“Existe o incentivo à experiência significativa de aprendizagem dos alunos”, acrescenta a pesquisadora. “A disposição dos professores para criação de projetos em sala de aula em consonância com curiosidades e inquietações da classe, bem como os cotidianos estímulos ao autoconhecimento, percepção do outro e resolução dos conflitos através do diálogo e do acolhimento, favoreceram o pensamento de que há diferentes modos de exercer as identidades e de interagir na teia de interdependência da qual fazem parte.”
Rever conceitos e pré-conceitos
Segundo Ana Paula, os educadores devem procurar rever os próprios conceitos e pré-conceitos e passar a se questionar: “Por que é assim? Sempre foi assim? Pode ser diferente? Como fazer diferente?”. “Eles precisam buscar apoio ou oferecer a ideia de debater gênero, sexualidade e formação social junto aos gestores da escola e colegas professores”, afirma. “Ao mesmo tempo, é necessário refinar o olhar e a percepção para situações em sala de aula que possam estimular o pensamento crítico dos alunos e compartilhar as experiência com os familiares e outras turmas da escola”
Cinco pontos são necessários, de acordo com Ana Paula, para levar até a sala de aula práticas positivas para a equidade de gênero. “São eles a postura em realizar as mudanças, a preparação prévia e a atenção aos acontecimentos do dia a dia, a crença na importância de um trabalho pedagógico para as diferenças, não desistir frente aos desafios e saber que o trabalho de ‘formiguinha’ vai contagiando positivamente os demais até que se possa disseminar o espírito docente de fazer a diferença em sala de aula”, conta.
Como exemplos de práticas docentes, a pedagoga sugere que os professores façam do diálogo e da prática do questionamento uma constante em sala de aula, provocando os aluno a criarem, a argumentarem, a mudarem suas ideias, a contribuírem com as ideias dos demais. “Eles também podem promover a criação e a reflexão sem as amarras dos modelos generificados e padrões sociais. Por exemplo, sem o ‘universo de princesas e cor de rosa para as meninas’ e sem o ‘universo azul, de lutas e aventuras’ para os meninos’”, diz. “E não contentar-se com respostas do tipo ‘sempre foi assim’, ‘a natureza é assim’, ‘eu nasci assim’, ‘na novela é assim’, ‘no conto de fadas é assim’”.
Ana Paula recomenda que os professores nutram um ambiente em que os alunos se sintam seguros em compartilhar ideias, sentimentos e opiniões. “Para isso o respeito e a compreensão do espaço do outro são fundamentais, promovendo uma teia de relação social em que o processo de socialização seja tão importante quanto a busca por um resultado futuro”, afirma. “Os docentes devem ainda atentar-se para que a própria fala ou atitude docente não seja carregada de pré-conceitos, como dizer ‘menina é mais organizada que menino’, ‘menino é tudo desatento mesmo’ ou indicar materiais por cores e desenhos conforme o gênero. Finalmente, podem usar recursos didáticos midiáticos em prol do diálogo sobre equidade de gênero e sexualidade com uma perspectiva crítica”