As jornadas de junho e o adiamento da Conae

As jornadas de junho e o adiamento da Conae

Luiz Araujo

Aparentemente desconexos, pretendo apresentar algumas semelhanças entre os acontecimentos que ficaram conhecidos como Jornadas de Junho e o recente adiamento pelo MEC da etapa final da Conferência Nacional de Educação – CONAE 2014.

Em primeiro lugar as manifestações ocorridas em junho ainda estão sendo estudadas e suas lições e efeitos ainda não foram mensurados.

Uma de suas características, talvez a que mais angustiou a minha geração (que lutou contra a ditadura para conquistar a liberdade partidária em nosso país) foi a rejeição aos partidos em quase todas as manifestações. Não haviam partidos encabeçando as convocações e bandeiras de agremiações partidárias foram expulsas de algumas manifestações. É verdade que, tipo uma panela de pressão, havia de tudo na manifestação, principalmente na fase mais massiva delas, inclusive movimentos retrógrados, mas tal repulsa seria ato isolado se não existisse um cansaço generalizado da forma como a política acontece em nosso país (corrupção, toma-lá-dá-cá, troca de partidos, programas inexistentes, candidatos que prometem e não cumprem, partidos que eram de esquerda e vão ficando mais parecidos com os partidos de direita, mensalões).

Mas os nossos jovens (a maioria esmagadora dos manifestantes, pelo menos segundo as pesquisas disponíveis, tinham idade entre 16 e 29 anos) também hostilizaram as entidades sindicais, centrais sindicais e entidades estudantis, com raras exceções. A impressão é que a experiência de vida destes jovens não conseguiu enxergar diferenças significativas da prática política destas entidades em relação aos partidos cujos seus dirigentes militam. E, portanto, não queriam as entidades por que lhes pareciam apêndices dos partidos que estavam rejeitando. Estes jovens nasceram no pós-redemocratização e vivenciaram o contínuo declínio da autonomia de nossas entidades e o passado delas é algo ausente do imaginário da nova geração.

E o que isso tudo tem a ver com o adiamento da CONAE?

1-->A Conferência Nacional de Educação, diferentemente das CONEDs realizadas na década de 90, estava sendo organizada por um comando governamental e não-governamental, ou seja, ao mesmo tempo que era um evento oficial, bancado financeiramente e organizado operacionalmente pelo governo, era também fruto de uma direção com forte participação das entidades estudantis, sindicais, representativas do mundo acadêmico, organizações não-governamentais e de gestores. Este compartilhamento, se comprometia as entidades com os encaminhamentos, emprestava também legitimidade ao governo no processo de convocação.

2-->Acontece que a relação das entidades da sociedade civil com os governos petistas é bem distinta da ocorrida nos governos tucanos, época da realização das CONEDs. As Conferências anteriores foram somente não-governamentais pela ausência de espaços democráticos de participação. Foram fóruns convocados por forças oposicionistas e por setores descontentes com a falta de espaço (como a participação da UNDIME nas CONEDs, entidade representativa dos dirigentes municipais de educação e que não poderia ser arrolado como de oposição ao governo FHC). Passados onze anos de governos petistas a relação de muitas entidades é, no mínimo ambígua.

3-->Um adiamento como o que ocorreu, caso tivesse acontecido durante o governo FHC, com toda a certeza, já teria tido um posicionamento muitas vezes mais contundente do que o visualizado até o momento. O olhar que as direções têm acerca das virtudes e dos defeitos de um dado governo influenciam diretamente a dosagem de sua reação quando seus interesses são contrariados pelo mesmo. Existem contradições e conflitos entre entidades da sociedade civil e governos, mesmo quando seus dirigentes são do mesmo partido (ou dos partidos aliados) que governam, mas “se sentir governo” influencia na postura diante dos conflitos.

O desafio que o adiamento da CONAE coloca para as direções das entidades é desdizer com atos e palavras o sentimento que nossos jovens expressaram nas jornadas de Junho. Ou seja, é preciso que as entidades provem que mesmo tendo direções simpáticas ao governo não vão agir diante de um ataque tão evidente aos direitos de participação popular, uma postura comedida, de anteparo entre o governo e a base insatisfeita.

De forma sincera eu torço para que a reação dos jovens tenha sido exagerada.

http://rluizaraujo.blogspot.com.br/




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