Para superar a crise da educação
Medidas para superar a crise da educação, segundo o filme "Esperando pelo Super-Homem"
José Paz Rodrigues (*) -
Com o artigo anterior da série sobre As Aulas no Cinema iniciei a necessária proposta de mudar com urgência o estado atual em que se encontra a nossa educação, dando alternativas coerentes e realistas, dentro do quadro da denominada escola pública, única que pode manter a igualdade de oportunidades de todas as nossas crianças. No momento atual em que nos encontramos, avançado já o século XXI, o modelo escolar tradicional necessita ser revisto.
Os avanços tecnológicos, a importância dos mídia, a necessidade de alcançar metas novas, a problemática social da nova situação do nosso mundo, a globalização e outros muitos problemas contemporâneos, fazem obrigatória uma mudança profunda no nosso ensino, nas nossas escolas, nos nossos currícula, nas estratêgias didáticas a usar dentro e fora das aulas, no lançamento de um novo plano educativo e de um novo modelo para formar e escolher os docentes. Que, sem dúvida, constituem o elemento fundamental de qualquer sistema educativo. O exemplo temo-lo na Finlândia, onde para ser docentes se escolhe os melhores, se lhes dá um grande apoio e se cuida a sua formação inicial e em exercício. Tema que levou a ser este país um dos que têm o melhor sistema educativo em todo o mundo. Apoiado também por ter mantido durante anos um pacto educativo entre todos os cidadãos e grupos políticos do país escandinavo. Exemplo que deveriam seguir todos os demais povos do planeta.
Por uma razão ou por outra, o tema do ensino está quase sempre de atualidade. Embora esteja muitas vezes porque os grupos políticos de um e outro signo não se dam conta que a educação não se deve partidizar. A educação é um problema de todos e algo muito importante para um país. Por isto seria necessário que de uma vez por todas se estabelecesse um pacto estatal pela educação, em que estivessem todos os setores e grupos. Para que as lógicas mudanças de governos não afetassem as aulas, as escolas, os docentes, as famílias e as leis educativas. Dado o estado atual da nossa educação, considero que teriam que se pôr em prática já as seguintas urgentes medidas:
1.- Organizar a reciclagem do professorado de níveis não universitários em horário escolar. Única forma de que pudessem participar todos os docentes. E por obrigação. Na atualidade participam só os que têm interesse e sensibilidade e os que para sexénios necessitam diploma. Os primeiros não necessitariam da renovação pedagógica, que já está a diário com eles.
2.- Contar mais com os docentes, que como muito bem dizia Cossío, são a alma da escola. Gastar mais em mestres que em computadores e pizarras digitais. O importante na aula são os mestres e as crianças, os professores e os alunos. As pessoas. O demais é complementário, acesório, auxiliar ao sumo. Onde não se deve poupar é em docentes e apoiá-los sempre.
3.- Promover uma maior flexibilidade horária, de calendário, de atividades, de grupos de trabalho, um currículo mais aberto e adaptado ao entorno e aos alunos. A rigidez nunca favorece a qualidade do ensino. E menos aínda a renovação pedagógica. O novo sistema de formação por competências básicas pode favorecer esta alternativa que se propõe.
4.- Apoiar mais os docentes de educação especial. Hoje temos um bom número de docentes especializados em trabalhar com alunos com necessidades educativas especiais. Com ánsias de se superarem, mas com uma urgente necessidade de receberem mais apoio de centros, companheiros e da própria administração. Muitas vezes encontram-se perdidos nos colégios e o seu labor injustamente infravalorado.
5.- Integrar melhor as crianças e alunos imigrantes. É muito necessária a positiva integração dos imigrantes que cada vez entram mais e em maior número nas nossas aulas. Esta é uma realidade que deve obrigar a preparar de forma adequada os docentes que vão trabalhar com eles. Dando acesso nos centros ademais a educadores sociais, que podem desenvolver um muito interessante labor neste e outros campos.
6.- Desenvolver uma política lingüística adequada. No caso da Galiza, é urgentíssimo levar para a frente uma verdadeira e acertada política lingüística, tema em que nos últimos tempos só escuitamos absurdos de um e outro signo. A nossa língua está ameaçada no seu território berço e origem (não em Portugal, nem no Brasil). Temos que recuperar falantes e criar neo-falantes, sem deixar de estudar outros idiomas importantes. Para isso tem que existir um respeito a outras opções lingüísticas, desgraçadamente aínda hoje marginadas, anatemizadas e perseguidas. O que não favorece em absoluto fazer ver aos galegos a utilidade da nossa língua e a sua extensão territorial e de utentes. Ao ser oficial em oito países soberanos de todos os continentes e oficial em muitos organismos internacionais. Reduzi-la a quatro províncias é um suicídio. Que se iniciou lá pelo ano 1983.
7.- Educar em valores. Tem que haver uma maior preocupação pela educação em valores dentro das aulas. E também nas casas e nos meios de comunicação. Este tema não é baladi. As aprendizagens apreciativas estão quase ausentes de todos os ámbitos educativos. Na primeira escola familiar, na terceira dos médios e na escola tradicional, onde os docentes são verdadeiros quixotes luitando contra moinhos de vento. Por isto, parece-nos estéril toda a polêmica que levantou a disciplina de educação para a cidadania. A nossa sociedade perdeu todos os valores humanos, ao valorar só o ter e não o ser.
Para o presente comentário, escolhi esta vez um filme-documentârio sobre a crise na que se encontra o sistema educativo dos EUA. País do que poucas cousas positivas se exportam ao exterior, sendo as negativas aquelas que maior dano estão a fazer entre os cidadãos do mundo. Sob o título de Esperando pelo super-homem, acho que este filme deve pôr-nos a todos em guarda sobre os perigos de um modelo educativo neo-liberal, que não podemos copiar. Refletir sobre tais perigos e as propostas que desde o filme se fazem, considero de enorme importância termo-las presentes, e evitarmos assim erros funestos.
Ficha técnica do filme:
Título original: Waiting for Superman (Esperando pelo Super-homem / Esperando a Superman).
Diretor: David Guggenheim (EUA, 2010, 90 min., a cores, documentário).
Roteiro: Billy Kimball e D. Guggenheim. Produtor: Lesley Chilcott.
Fotografia: Bob Richman e Erich Roland. Música: Christophe Beck.
Atores: Geoffrey Canada, Michelle Rhee, Bill Strickland e Randi Weingarten.
Prémio: Melhor documentário no Festival de Cinema de Sundance (2010), concedido pelos assistentes ao festival. Na apresentação do filme Bill Gates comentou: "A qualidade do nosso sistema educativo é o que fez grande ao nosso país. Agora não é tão boa como o era, e tem que ser muito melhor".
Argumento: Este documentário lembra-nos que as estatísticas educacionais têm nomes: Anthony, Francisco, Bianca, Daisy e Emily, cujas histórias são a base deste filme. O documentário acompanha cinco crianças norte-americanas e seus pais que desejam obter uma educação pública decente, mas que acabam tendo que entrar em uma lotaria, em formato de bingo, para obterem uma boa escola, porque os colégios próximos às suas casas são fracassos estrondosos. O destino do país não será decidido em um campo de batalha, será determinado em uma sala de aula. O trecho apresenta a história das escolas públicas americanas, desde a década de 70. Inicialmente, retratado pelos filmes, eram os melhores do mundo não só nesta área, mas também na economia. Geoffrey Canada, educador, comenta sobre a entrada da China no mercado mundial e seu atual domínio, e enfatiza que os EUA não estão acompanhando as mudanças do mundo na educação. Tal dado é confirmado pelos resultados dos testes internacionais, nos quais o desempenho do país tem decaído em matemática e linguagem, porém continua crescendo em confiança. A partir do trecho é possível conhecer e discutir a história da educação dos EUA, a partir da Educação Comparada, desmistificando visões, bem como perceber o crescimento educacional e estabelecer relações com o crescimento econômico de países emergentes, como a China e o Brasil.
Crise educativa no País modelo do imperialismo:
O sistema público de ensino nos EUA está a pique, gerações inteiras irão perder-se. Crianças sendo afastadas de oportunidades de vida, ficando vulneráveis ao que uma existência sem estudos pode acarretar. O documentário mostra que a receita para mudar os péssimos resultados das escolas públicas é simples: maior carga horária, mais salas de aulas por alunos, mais motivação aos professores. Mas apesar de ser simples, tem-se que luitar contra o sistema. Há grandes exemplos dos que desafiaram esse sistema em locais onde o nível de aprendizado era o mais baixo da região, onde era quase impossível levar algum aluno à Universidade, mas mais de 90% dos seus alunos conseguiram esse feito. O documentário nos lembra que as estatísticas educacionais têm nomes, representados por cinco crianças americanas. Esperando Pelo Super-homem acompanha estas cinco crianças e os seus pais que desejam obter uma educação pública decente, mas que acabam tendo um sistema educativo na atualidade muito pobre.
Dirigido por David Guggeinheim, o mesmo daquele documentário arrasador sobre aquecimento global, "Uma verdade inconveniente", estrelado pelo Al Gore. Agora, a câmara de Guggeinheim se volta para o sistema educacional americano. O filme foi lançado com grande destaque e levou o prêmio de melhor documentário no último Festival de Sundance. Tendo alcançado também sucesso de bilheteira, já tem o mérito de ter inspirado um amplo debate sobre a crise na educação. Todos os cidadãos também terão motivos de sobra para se identificar e se preocupar com as questões colocadas pelo filme. Com o agravante de que o sistema educativo americano ocupa o lugar 25 dentro dos outros do mundo, o que é um péssimo lugar, diga-se de passagem. Basta olhar alguns dados internacionais como a performance no PISA, situação que já é péssima quando comparada com outros países desenvolvidos. Além disso, é importante notar que a educação da elite americana é de qualidade tão só para as classes altas do país. E, por suposto, privada e de alto custo, ao ter que ser paga.
Mas, pode um filme documentário arranjar o sistema educativo dos EUA? No país americano são muitos os alunos que assistem às escolas públicas repartidas por todos os Estados. Segundo as estatísticas, pelo menos um 30% dos rapazes abandonam as escolas antes de cumprirem a maioria de idade, enquanto que uns 17% continuam sem saber ler nem escrever, depois de passar pelas aulas. Um desolador panorama que levou o país americano a ocupar um lugar pouco honroso entre os considerados potentes no mundo. O realizador reflite sobre este grave problema enfrontando no filme aos considerados reformistas educativos com os dos sindicatos de docentes, resistentes às mudanças. Em cada um dos bandos estão duas mulheres tão diferentes entre sim, como Michelle Rhee, responsável da educação na capital do país, e Randy Weingarten, presidenta do maior sindicato de ensinantes. A principal diferença entre as duas basea-se na atitude que ambas sostêm sobre os chamados colégios por resultados, centros educativos cujo accesso aos fundos governamentais depende de forma exclusiva da sua qualidade acadêmica. Rhee, que chegou a ser proposta para secretária de educação no atual governo, é firme defensora deste sistema que aplica na capital americana.
Entre as ideias desta filha de emigrantes vietnamitas, está aquela de incrementar o salário dos docentes até uns sesenta mil dólares anuais, desde que renunciem à sua vaga fixa e demonstrem uma melhoria de resultados acadêmicos entre seus estudantes. O seu programa educativo apoia-se na ideia defendida por vários estudos de que a calidade académica dum aluno depende da competência dos seus professores. Infelizmente, nos EUA (e em outros países também), são os de menor nível universitário os que acedem aos postos de docentes. A proposta de Rhee é a de criar os incentivos necessários para que sejam os melhores em formação os que ensinem nas escolas do país. Algo similar ao que já sucede na Finlândia, daí que tenha um muito bom sistema educativo. Entre os aspetos mais polémicos das escolas por resultados contam-se, por exemplo, a possibilidade de fechar aquelas que não cumprirem com as expetativas ou o do despedimento livre para os professores menos válidos. Aquí é onde, com razão, os sindicatos mais perigos vêem, de que chegue a privatização em massa das escolas, e que se entre, se é que já não se está, dentro de um sistema educativo neo-liberal. Provocador de desigualdades sociais e favorecedor de maneira descarada da educação elitista e classista, ao serviço só das classes dominantes, e não de toda a cidadania.
Temas para refletir e realizar:
Utilizando a técnica do Cinemaforum, as dinâmicas de grupos oportunas, os debates-papo e tertúlias, comentar entre todos os muitos temas que aparecem no documentário, a respeito da crise atual da educação nos EUA e as propostas de mudança que se fazem para desenvolver uma outra educação. Também as diferentes atitudes, posturas e opiniões que levantam todas as personalidades entrevistadas.
Elaborar entre todos um projeto para a melhora educativa do ensino e das escolas públicas, único modelo de ensino que garante a igualdade de oportunidades para todos os cidadãos. Ter presente, de forma destacada a importância da formação inicial e permanente dos docentes, assim como a adequada escolha dos professores para as nossas escolas, fazendo uma proposta de modelo a respeito.
Organizar nos centros educativos uma mostra com textos, fotos, retalhos da imprensa, frases, desenhos e trabalhos criativos dos alunos, sobre modelos educativos de diferentes educadores e escolas do mundo, que se tenham destacado na qualidade educativa e nos resultados positivos com os seus alunos.
(*) Académico da AGLP, Didata e Pedagogo Tagoreano.