O giz virou mouse
O giz virou mouse. E agora?
Escrito por Ingrid Furtado
Em vez do livro, tablet; no lugar da pesada enciclopédia, smartphone que cabe na palma da mão; substituindo o quadro-negro, lousa digital. E diante do arsenal tecnológico produzido pela indústria a uma velocidade tão estonteante quanto a dos computadores, um batalhão de alunos com dedos rápidos no teclado e ávidos por mais novidade. A cena não deixa dúvida: as Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs) chegaram para ficar. O desafio do momento é deixar de lado o apego às tradicionais aulas expositivas e abraçar, sem medo, novos conceitos e recursos de ensino, empregando-os como mais uma ferramenta pedagógica.
Mas antes de pensar em investimentos financeiros na compra de computadores, tablets, etc., a instituição de ensino deve se preocupar com a formação de seus professores para usar essas tecnologias adequadas ao processo de aprendizagem, explica o professor Klaus Schlünzen Junior, coordenador do Núcleo de Educação a Distância da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Unesp). “É fundamental que o docente conheça estratégias didático-pedagógicas que promovam situações nas quais os estudantes utilizarão as tecnologias como meio de interação, de comunicação, como fonte de informação e como instrumento para a construção do conhecimento. Além disso, é importante que o projeto pedagógico da escola estabeleça diretrizes norteadoras para o uso das tecnologias, o que então fundamentará e justificará um plano de investimentos financeiros”, afirma.
Para ele, há um equívoco em como ocorre a formação de professores quanto ao uso das TICs em sala de aula. “Infelizmente, a formação inicial do professor não o prepara para esse cenário. Ainda hoje, os cursos de formação estão muito preocupados com as tecnologias como elementos de estudo, ou seja, ensina-se como usar editores de textos, planilhas, softwares dos mais diversos, mas pouco se preocupam em mostrar como podem ser empregados para o aprendizado”, pontua Klaus Schlünzen.
Em consequência disso, ocorre, no meio acadêmico, uma interpretação equivocada: muitos pensam que uma simples aula expositiva usando slides de PowerPoint, por exemplo, caracteriza-se como bom uso das tecnologias no aprendizado. No entanto, isso não passa de uma visão superficial das TICs, observa o especialista. “O problema é que os professores ainda estão muito preocupados com as tecnologias, em dominá-las mais do que seus alunos, e esquecem-se de que o mais importante é sua prática docente estar centrada na criação de oportunidades de aprendizado, com ou sem tecnologia, bem como no domínio do conteúdo que se quer ensinar”, reforça Klaus, que atua também nas áreas de formação de professores e informática na educação.
Parceria
As TICs carregam não apenas tecnologia. Elas trazem também mudanças de pensamento que exigem quebra de paradigma entre os educadores. Tablets, laptops e celulares escancaram a velocidade que os jovens têm em dominar o uso desses aparelhos eletrônicos e, com isso, exibem o hiato tecnológico entre eles e seus professores. Essa situação pode intimidar alguns educadores, mas, dependendo da perspectiva, pode abrir as portas da parceria entre o corpo docente e os estudantes.
Por isso, a mensagem “embutida” junto às TICs é a de que o processo de aprendizagem hoje em dia precisa ser compartilhado; não é mais uma via de mão única. E, muitas vezes, o professor pode precisar da ajuda do aluno para aprender a lidar com esses instrumentos. Isso não é vergonha, é compartilhamento de informações. “A intervenção do professor deve ser sempre no sentido de propiciar ao estudante o entendimento de que há um propósito com as atividades que ele sugere que sejam realizadas por meio das tecnologias. É importante ele também saber identificar os interesses dos estudantes e reconstruir a sua prática docente a partir disso. Portanto, se o professor conseguir estabelecer essa dinâmica, provavelmente ele não terá problemas com indisciplina e falta de atenção”, explica Klaus.
Isso significa que é preciso dar sentido ao que se quer ensinar e, portanto, independentemente da estratégia ou do recurso empregado, as garantias de construirmos um ambiente propício ao aprendizado aumentam sobremaneira.
Portanto, a tecnologia é um recurso pedagógico de uso dos estudantes para o aprendizado, e o professor é um mediador desse processo.
Ao estudar assuntos mais abstratos, como a estrutura de um átomo, de uma molécula, as camadas da pele ou até mesmo figuras em 3D, seria oportuno introduzir as tecnologias virtuais. Assim, segundo especialistas, ficaria mais fácil absorver o conteúdo, bem como estimularia a curiosidade do estudante.
Para o pedagogo, especialista em Educação e colunista da revista Profissão Mestre, Hamilton Werneck, quanto mais houver domínio dessas tecnologias, maiores as chances de uma pessoa aprender. “Se não houver propósito na aula, os alunos podem se enveredar por um processo de dispersão e o aprendizado poderá ficar comprometido”, afirma o pedagogo, que é autor de vários livros na área de Educação.
Internacional
Nos Estados Unidos, não é raro observar o uso de ferramentas tecnológicas em sala de aula, tanto em escolas públicas quanto em particulares. É habitual que crianças entre 7 e 8 anos tenham seu próprio laptop – emprestado pela escola – e apresentem trabalhos de Ciências ou História usando o PowerPoint ou outro programa. No entanto, o desafio de aplicar conteúdo pedagógico usando tecnologias não é somente dos educadores brasileiros.
O professor de Matemática, Edward Garcia Junior, ensina álgebra para alunos do ensino médio de uma escola pública em Pasadena, Texas. Para fugir da objetividade da matéria e facilitar o processo de aprendizagem, ele não abre mão de uma lousa digital, conhecida nos Estados Unidos como promethean board. O equipamento nada mais é do que um telão interativo ligado ao computador do professor. “Além de projetar o que preparei no computador, eu e os alunos também interagimos com a imagem, escrevendo na própria tela ao mesmo tempo em que a projeção ocorre. Percebo que a compreensão da matéria fica mais palpável para o estudante”, diz o matemático.
No entanto, ele também encontra dificuldades em aplicar atividades pedagógicas usando as TICs. “Poderia usar a lousa de forma mais aprofundada, mas ainda me faltam conhecimento e tempo para criar e planejar. Sei que essa tecnologia me oferece muito mais recursos. Porém, ainda não sei aplicar uma quantidade relativa de conteúdo de álgebra nela. Preciso de mais ideias e exemplos”, diz o professor americano.
Na hora de implantar as TICs na escola:
- Antes de pensar na aquisição de equipamentos, preocupar-se com a formação dos professores para o uso das tecnologias;
- O docente deve conhecer estratégias didático-pedagógicas que promovam situações nas quais os estudantes utilizem as tecnologias como meio de interação, de comunicação, como fonte de informação e como instrumento para a construção do conhecimento;
- O projeto pedagógico da escola deve estabelecer diretrizes norteadoras para o uso das tecnologias, o que fundamentará e justificará um plano de investimentos financeiros;
- O professor deve informar ao aluno o propósito do uso das tecnologias na aula;
- O professor deve saber identificar os interesses dos estudantes e reconstruir sua prática docente a partir disso;
- A prática docente deve estar centrada na criação de oportunidades de aprendizado, com ou sem tecnologia.
Fonte: professor Klaus Schlünzen Junior, coordenador do Núcleo de Educação a Distância da Unesp
Matéria publicada na edição de agosto de 2013.