Os limites da autonomia escolar

Os limites da autonomia escolar

Juca Gil. Foto: Marcos Rosa

JUCA GIL "Cada escola deve ter seu projeto, que pode ser diferente - e até divergente - do das demais."
Foto: Marcos Rosa


De um lado, os gestores escolares se queixam de ter pouca autonomia. De outro, há setores da sociedade achando que as escolas têm liberdade demais. Sem pretender superar essa polêmica, vamos interpretar alguns trechos da Lei de Diretrizes e Bases (LDB) sobre a questão. O artigo 3º trata dos princípios do ensino brasileiro. Entre eles está a possibilidade de haver o pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas, como afirma o inciso III. Assim, a lei não obriga ninguém a ser construtivista, montessoriano ou adepto do método fônico ou do global (quando se fala em alfabetização). Da mesma forma, ninguém pode ser criticado por ser tradicional, libertário etc.


No artigo 12, a LDB lista as atribuições das unidades de ensino. Destacam-se a de elaborar e executar a proposta pedagógica (inciso I) e a de cuidar para que seja cumprido o plano de trabalho de cada docente (inciso IV). Entende-se com o primeiro que cada escola deve ter seu projeto, que pode ser diferente - e até divergente - do das demais. Da mesma forma, as medidas governamentais não podem ignorar a existência dessas propostas pedagógicas nem atrapalhar sua execução. Com o segundo, depreende-se que cada professor tem o direito de ter um plano de trabalho próprio.


Contudo, esse mesmo artigo explicita os limites à autonomia escolar ao lembrar que, em qualquer caso, devem ser respeitadas as normas comuns e as do sistema de ensino. Ou seja, a autonomia do docente para elaborar seu planejamento não pode ser confundida com liberdade absoluta, pois a proposta pedagógica da instituição deve ser o seu norte (assim como a rede, municipal ou estadual, tem o dever de orientar as escolas). A lei também garante que os docentes participem da elaboração da proposta pedagógica - por isso o documento não pode vir pronto de algum gabinete nem ser confeccionado apenas pelos gestores.


Outro caso que confirma os aspectos anteriores aparece no artigo 15, que define que "os sistemas de ensino assegurarão às unidades escolares públicas de Educação Básica que os integram progressivos graus de autonomia pedagógica e administrativa e de gestão financeira...". O problema é que os secretários de Educação são lentos na implementação desse artigo e permitem graus pequenos de autonomia, seja nas formas de organização burocrática, seja na disponibilização razoável de dinheiro - e, em casos extremos, na escolha de metodologias e conteúdos. Algumas redes, inclusive, optam por distribuir material didático único às escolas, tanto os elaborados por assessores governamentais como os comprados de sistemas privados de ensino. Com isso, os gestores perdem espaço para discutir com a equipe projetos específicos para sua instituição. Vale ressaltar que, por lei, as escolas e os professores podem optar pelo uso dos materiais que considerarem mais coerentes com seus objetivos.


No papel, portanto, a autonomia escolar parece ser ampla, mas sua realização ainda está em fase embrionária por falta de informação das pessoas que têm de exercê-la e pela tradição centralista da Educação brasileira. Afinal, autonomia não é uma palavra de fácil interpretação e sua subjetividade exige dos gestores muita discussão e prática para lhe dar vida.

Juca Gil

É professor de Políticas Educacionais da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

http://revistaescola.abril.com.br/gestao-escolar/diretor/limites-autonomia-escolar-leis-educacionais-legislacao-544894.shtml




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