Uma aula de outro tipo

Uma aula de outro tipo

 

Esther Pillar Grossi

 

Quanto mais simples é algo, mais difícil de nos darmos conta de sua importância. Este é o caso, para mim, de uma prática que vem sendo utilizada pelos pós-construtivistas, já há algumas décadas. Trata-se da aula-entrevista, que é uma novidade extremamente promissora.


Ela é um tête-à-tête de cada professor com cada um de seus alunos, mais de uma vez por ano. É algo novo e diferente. Nunca antes foi sequer pensado que pudesse constituir-se em um novo tipo de aula.

O professor, ou mais adequadamente a professora, pois elas são enorme maioria nesta profissão, senta-se com aluno por aluno, conversa com ele e depois propõe-lhe algumas tarefas cientificamente elaboradas sobre aquilo que quer que eles aprendam – língua materna, matemática, ciências sociais e naturais, artes ou técnicas.

É algo inédito nas práticas escolares, antes inconcebível como uma verdadeira aula. Ainda não é possível imaginar uma professora tendo contato particular com cada aluno e, ainda por cima, mais de uma vez por período letivo. Que pessoa adulta, hoje, viveu esta experiência, quando criança?

Esta novidade produz uma diferença incrível. Uma das diferenças é que na aula-entrevista a professora recolhe elementos para melhor planejar sua tarefa ensinante. Ela identifica o que os alunos realmente sabem e não só o que memorizaram. E ela não mais dá aulas baseando-se na lógica dos conteúdos disciplinares. Ela passa a ter em mãos elementos da lógica do processo que está vivendo o aluno para aprender o que é previsto, portanto importante e necessário, como acesso às riquezas acumuladas da cultura, das artes e da ciência. Ela vai muito mais do que ao encontro dos interesses dos alunos. A aula-entrevista permite tocar onde estão os seus desejos para realmente aprender, lembrando que desejo é muito mais poderoso do que interesse. Sem desejo, muito pouco se faz, lembrando a afirmação dos revolucionários franceses de maio de 1968, pichada numa parede de Paris: “Seja realista, busque o impossível”. Impossível não é o irrealizável. É aquilo que só é realizável com a força dos desejos.

A aula-entrevista é um instrumento revolucionário que acende uma luz no fim do túnel de tantas não aprendizagens que nos atiram na cara todas as pesquisas sobre os resultados escolares no mundo.

Claro que a aula-entrevista não é um instrumento isolado numa cena ensinante atualizada. Ela está inserida num amplo conjunto de novos ingredientes com que as ciências do aprender nos vêm brindando e que, sendo muito eficazes, vêm carregar-nos de otimismo – o otimismo de que os alunos passem a sentir os prazeres de aprender a que têm o mais sagrado direito. Estes prazeres são enormes e certamente diminuirão a procura de simulacros, como sexo, drogas.

*DOUTORA EM PSICOLOGIA DA INTELIGÊNCIA PELA UNIVERSIDADE DE PARIS

Zero Hora




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