O sindicalismo despartidarizado
O sindicalismo precisa ser despartidarizado
Por João Batista Moraes Vieira*
Filiação partidária do sindicalista é uma coisa; outra é a “filiação” da entidade a um partido político.
O modelo de atuação das entidades sindicais guarda ainda estreita ligação com partidos políticos, que é um esquema herdado de Getúlio Vargas, caudilho que se valeu como ninguém dos sindicatos como instrumento de controle das massas populares.
Nesse sistema há interesses recíprocos, principalmente políticos, entre sindicatos e governo, espécie de pacto de não agressão no qual quem leva a pior são os trabalhadores.
Prova atual mais gritante desse sindicalismo partidário é que a maior central do país se recusou a participar do abaixo-assinado da nulidade da Reforma da Previdência, emenda que foi aprovada com o dinheiro sujo do mensalão. A lógica perversa é essa: mobiliza-se para defender os deputados petistas e que se lasquem os aposentados. E olhe lá que assinar um documento deveria ser o mínimo a se fazer.
Os servidores do Poder Judiciário Federal que o digam, pois ainda está vivo na memória deles o ano de 2010 quando se encerram as greves para não causar maiores embaraços à campanha da então candidata oficial à Presidência. Mais uma vez os trabalhadores se deram mal com a manobra de sindicatos ligados a partido governista, prevaleceu o mesmo de sempre: os interesses da categoria ficando em segundo plano e os sindicatos atuando como cabo de transmissão dos interesses principais do partido governista. Erro histórico pelo qual se está hoje pagando caro demais. Para essa categoria, 2010 é o ano que não terminou.
A pior coisa que possa existir para os trabalhadores é a aliança entre sindicatos e partidos governistas. O trabalho mais espúrio também é o do sindicalista que defende o patrão em detrimento de sua classe. Patrão será sempre patrão. Um dia o governo vai ferrar o trabalhador, isso está na própria essência dele. Algo muito próximo da fábula do escorpião que jurou não picar o sapo na travessia do rio.
Se a ascensão da chamada República sindical trouxesse frutos, em especial, ao conjunto dos trabalhadores públicos, não se teria hoje agenda com uma pauta tão negativa como congelamento salarial por 10 anos, previdência complementar, corte nos benefícios e repressão ao movimento grevista.
Desde 2003 mudou-se a cor do partido, mas o tom de colocar o servidor como bode expiatório de todas as mazelas sociais e econômicas continua no mesmo ritmo na República petista. Durante as greves de 2012, o Poder Executivo Federal, comandado pelo Partido dos Trabalhadores, revisitando saudosamente Fernando Collor, fez condecorar com título de nobreza os servidores ao chamá-los carinhosamente de sangue-azul.
O Partido dos Trabalhadores ainda vez mais: editou decreto para substituir grevistas por terceirizados e colocou recentemente a ABIN, o antigo SNI dos militares, para espionar o movimento sindical no porto do Recife.
Se alguém hoje, depois de um sono profundo de 10 anos, despertasse e a ele fosse contado tudo aquilo que está sendo feito com os servidores públicos federais, acharia uma piada ao ouvir que quem está por trás dessa política de desvalorização é justamente o partido com raiz fincada na luta feita na porta das fábricas do ABC paulista.
Essa pessoa talvez preferisse voltar a dormir ao saber que o pacote de maldades contra o servidor conta com o apoio quase explícito da maior central sindical do país. Em relação aos servidores públicos, é possível dizer com todas as letras que a República sindical fracassou.
O exemplo da ligação partidária da CUT e sindicatos com o PT, partido governista, assim como outras entidades sindicais ligadas umbilicalmente a outros partidos, vem mostrar a perda da autonomia e independência da atuação sindical quando essas entidades se aliam a partidos políticos.
Despartidarização não quer dizer que a categoria seja despolitizada. Os sindicatos devem ter seus parlamentares no Legislativo, e quando eleitos devem se pautar pelo plano de lutas de sua classe e não pelo programa do Governo. Na campanha eleitoral, deve-se, também, guardar ética e respeito com o patrimônio dos filiados do sindicato. A cor partidária do sindicato tem que ser sempre a cor do seu único e maior partido: a categoria a que representa. É bom não confundir isso: há uma grande distância entre um sindicalista ser filiado a um partido político e a entidade não ser “filiada” a essa mesma agremiação partidária.
Sindicatos, portanto, não devem confiar em governos nem se associar a partidos políticos. Devem ser desvinculados para guardar a necessária independência de atuação para defender os verdadeiros interesses dos seus filiados, valor infungível e insuscetível de ser barganhado. Por essas é outras que esse modelo de sindicalismo está esgotado, necessitando urgentemente de um recall para retirar os amortecedores que hoje algumas entidades sindicais usam para aliviar o impacto dos conflitos surgidos entre trabalhadores e governo. Isso vai fortalecer a categoria e tornar os sindicatos mais aguerridos nas lutas, sem se preocupar em desagradar este ou aquele partido político. *João Batista Moraes Vieira é presidente do Sinjufego