Antíteses da inovação

Antíteses da inovação

Governos e escolas são antíteses da inovação

Alexandre Sayad 

 

Tente imaginar as instituições que mais resistiram às inovações processuais, tecnológicas e até lógicas dos últimos vinte anos, não só no Brasil. Não é difícil chegar a três deles: igreja, governos e escolas.  Durante anos, estruturar uma maneira com que a educação pública se transforme para acompanhar a evolução da sociedade tornou-se uma quebra-cabeças complexo por justamente ter que lidar com duas dessas áreas mais conservadoras da sociedade.

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O terceiro setor viveu recentemente um período de difamação midiática e esquartejamento público como se somente as ONGs fossem alvos de corrupção passiva no país; mas foram justamente elas o importante lastro de inovação no campo da educação no Brasil nos anos 90 e 2000.

Isso ficou mais claro durante o evento Transformar, que ocorreu na semana passada em São Paulo.  Esse foi talvez o mais importante encontro de Educação ocorrido no Brasil nos últimos cinco anos, porque levou o tema da inovação despudoradamente próximo ao campo conservador da educação. Experiências norte-americanas, ainda que pontuais, mostraram como algumas escolas “charters”, e outras públicas, vem reinventando espaços e processos com uma mão forte da tecnologia como catalisadora – e não estrela principal – da transformação.

A High Tech High, por exemplo, destacou a customização e personalização do ensino e a importância em se trabalhar por projetos. Assim, aproximou a figura do professor da de um “designer”.  A fala da diretora Melissa Agudelo, valorizando uma escola próxima à vida do aluno, me fez mergulhar no tempo, no fim dos anos 90, nas experiências iniciais de ONGs como a Cidade Escola Aprendiz, Gol de Letra, Casa do Zezinho e algumas outras redes aceleradoras de experiências como o Instituto Ayrton Senna.

Na Cidade Escola Aprendiz, da qual fui um dos fundadores, havia um núcleo que se chamava Design Social, justamente com as mesmas preocupações de aproximar o fazer educativo de “projetos”. Mas sem nostalgia, tentando avaliar o que ficou,  as experiências inovadoras que sobreviveram e deixaram o campo laboratorial para ganhar alguma escala foram aquelas que se aproximaram do poder público mais recentemente.

Ora, que contradição! Governos são antíteses de inovação. Sim, esse é quase um pacto com o próprio diabo. E só tem chance de sobreviverem as experiências baratas, simples e flexíveis. Foi assim com o bairro-escola, da Cidade Escola Aprendiz. Decerto, muito da inovação se esvai nesse processo, mas a experiência pontual ganha oxigenação e novos espaços.

Para o poder público, abrir essa porta para a inovação é quase uma concessão; mas deveria ser regra. Voltando ao evento, a reflexão mais importante do Transformar veio do próprio anfitrião da Fundação Lemann, Denis Mizne: “governos tem que dar autonomia às pontas, às escolas, para que a inovação surja”. Talvez seja essa a única possibilidade de coexistência entre máquina pública e criação: a descentralização e autonomia de gestão.

Mas onde mora a inovação educativa hoje no Brasil? Difícil responder. As “startups” coordenadas por jovens empreendedores têm se mostrado fetichistas com a tecnologia e pouco preocupadas com o que a educação foi, é e deverá ser de fato.  Mesmo assim, olhando a cena educativa como um todo, não dá saudade nenhuma dos anos noventa. Caminhamos muito ao abrir os ouvidos para que a escola não se mantenha como a mesma do século 19.

 
 
 




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