Royalties e educação
Royalties e educação
Luiz Araujo
O debate sobre a distribuição dos royalties tem ocupado grande espaço nas discussões do Congresso Nacional e está prevista a votação de vetos presidenciais a uma das muitas leis que o parlamento aprovou sobre o tema.
Até recentemente esse era um tema que não interessava muito aos educadores, mas desde a CONAE que existe um forte debate sobre a necessidade de vincular parte da renda dos recursos naturais, especialmente do petróleo da denominada área do Pré-Sal para a educação. Com isso o tema começou a frequentar as rodas de discussão do setor educacional.
Decidi postar no decorrer desta semana alguns elementos que ajudem no entendimento da questão. E o farei em forma de perguntas e respostas.
Quais são os regimes de exploração existentes em nosso país?
No regime de concessão, é devida pelo concessionário, além dos royalties, a participação especial2, que arrecada aproximadamente o mesmo montante do que os royalties (ambas geraram cerca de R$ 12 bilhões, cada, em 2011). Nesse regime, os royalties são devidos sobre todos os campos e correspondem a uma alíquota de até 10% sobre o valor bruto produzido, e assemelha-se a um imposto sobre o faturamento. Já a participação especial é devida somente em campos com alta produtividade e incide sobre uma espécie de lucro gerado pelo campo, assemelhando-se a um imposto sobre a renda.
Nos contratos a serem firmados em licitações para exploração de petróleo e gás natural a partir de 2013, com base na Lei nº 12.351, de 2010, adotar-se-á o regime de partilha de produção. De acordo com essa lei, o regime de contrato será aplicado a licitações de blocos situados na província do pré-sal, ou em áreas declaradas estratégicas pela Presidência da República. Nesse caso, a empresa que explora o óleo recolhe aos cofres do Estado royalties com alíquota de até 15% sobre o valor bruto da produção, e uma parcela do chamado óleo excedente (na literatura, chamada também de óleo de lucro ou de profit oil).
Há, ainda, uma área da província do pré-sal que foi objeto de cessão onerosa da União à Petrobras, em condições regulatórias distintas às dos dois sistemas supramencionados. A respectiva exploração não gera participação governamental sob a forma de participação especial ou de parcela do óleo excedente, propiciando à Petrobras um ganho expressivo, caso a exploração nessa área tenha alta produtividade (segundo previsões de analistas de mercado de petróleo, a área é promissora).
Quais são as modalidades de captação de recursos para o fundo público?
A principal forma é por meio dos royalties.
Royalty é uma palavra inglesa derivada da palavra "royal", que significa ", aquilo que pertence ao Chefe de Estado, ou é relativo ao rei, monarca ou nobre Inventor, que se encontra sob a guarda do rei para o bem do Estado, por ser de real interesse deste e da Nação", podendo ser usada também para se referir à realeza ou nobreza.
Na antiguidade, royalties eram os valores pagos por terceiros ao rei ou nobre, como compensação pela extração de recursos naturais existentes em suas terras, como madeira, água, recursos minerais ou outros recursos naturais, incluindo, muitas vezes, a caça e pesca, ou ainda, pelo uso de bens de propriedade do rei, como pontes ou moinhos. Royalties são, atualmente, a cobrança de impostos da extração de um recurso natural de uma determinada região
Em relação aos royalties, cabe destacar que a alíquota vigente para os contratos de concessão é de 10% do valor produzido no campo (com base na Lei nº 9.478, de 1997). A legislação atual estabeleceu ainda a alíquota para o regime de partilha em 15% (conforme a Lei nº 12.734, de 30 de novembro de 2012, que altera a redação da Lei nº 12.351, de 2010).
O debate todo acerca de mudança de critério de distribuição dos recursos dos royalties diz respeito a extração de minérios no mar, pois há questionamento de que neste caso não caberia concentrar sua distribuição nos estados e municípios localizados próximo da extração (confrontantes).
Além dos royalties o Estado ainda arrecada recursos via Participação Especial, Bônus de Assinatura e Impostos.
Como é dividido o dinheiro resultante dos royalties?
Nas áreas de regime de concessão, a União fica com 40% do montante, os estados e municípios (produtores e confrontantes) ficam com 53% e apenas 7,5% é distribuído via o Fundo Especial do Petróleo.
Nas áreas de regime de partilha os royalties é de 15% e a União fica com 22% do montante, os estados e municípios (produtores e confrontantes) ficam com 29% e 49% (24,5% para estados e igual percentual para municípios) é distribuído via o Fundo Especial do Petróleo.
A Medida Provisória 592 estabelece que para os contratos no regime de concessão, firmados após 3.12.2012, valerá a seguinte distribuição (há uma transição de 2013 a 2020): União fica com 20% do montante, os estados e municípios (produtores e confrontantes) ficam com 38% a 26% e de 42% a 54% (21% a 27% para estados e igual percentual para municípios) é distribuído via o Fundo Especial do Petróleo.
Foram vetados os dispositivos constantes da Lei nº 12.734 de 2012, fruto da mobilização dos estados e municípios não produtores ou confrontantes. Duas mudanças ensejaram os vetos: a alteração das alíquotas dos contratos vigentes e a não participação dos estados produtores e confrontantes da divisão dos recursos do Fundo Especial do Petróleo.
Onde entra a educação neste debate?
Em dezembro de 2010 o Congresso Nacional aprovou a Lei 12.351, que no parágrafo 2º do seu artigo 47 continha a seguinte redação:
§ 2º Do total da receita a que se refere o art. 51 auferida pelo Fundo de que trata o caput 50% (cinquenta por cento) devem ser aplicados em programas direcionados ao desenvolvimento da educação pública, básica e superior, sendo o mínimo de 80% (oitenta por cento) destinado à educação básica e infantil.
O referido parágrafo estabelecia que 50% de toda receita do Fundo Soberano deveria ser aplicado em educação, sendo que no mínimo 80% na educação básica. Lembro que o referido Fundo é constituído de recursos oriundos da área do pré-sal (parcela do bônus de assinatura dos contratos, parcela dos royalties e das receitas comercializadas de áreas no regime de partilhas, dos royalties e da participação especial das áreas localizadas no regime de concessão e de aplicações financeiras).
O debate sobre novas fontes de financiamento para fazer frente aos enormes desafios educacionais de nosso país consumiram parte do debate do PNE na Câmara dos Deputados. O resultado foi a aprovação em 2011 de duas redações bastante afirmativas sobre o tema. A primeira está no parágrafo 4º do artigo 5º e a segunda é a estratégia 20.3:
Artigo 5º ...........................................................................................................
§ 4º. Serão utilizados 50% (cinquenta por cento) dos recursos do pré-sal, incluídos os royalties, diretamente em educação para que, ao final de 10 (dez) anos de vigência do PNE, seja atingido o percentual de 10% (dez por cento) do Produto Interno Bruto para o investimento em educação pública.
Estratégia 20.3 - Destinar, na forma da lei, 50% (cinquenta por cento) dos recursos da União resultantes do Fundo Social do Pré-sal, royalties e participações especiais, referentes ao petróleo e à produção mineral, à manutenção e desenvolvimento do ensino público.
A redação aprovada na Câmara é mais ampla do que o texto aprovado em 2010, pois abrange não só os recursos do Fundo social, mas alcança os valores recebidos pela União a titulo de royalties e participação especial.
A Medida Provisória nº 592 de 2012, além de estabelecer formato de distribuição dos recursos dos royalties, preenchendo o vácuo jurídico deixado pelos vetos a lei aprovada sobre o tema, teve a virtude de recolocar o debate da destinação de royalties para a educação.
O tema aparece em dois momentos. No parágrafo 3º do artigo 47 podemos ler:
Artigo 47............................................................................................................
§ 3º Do total do resultado a que se refere o caput do art. 51 auferido pelo FS, cinquenta por cento deve ser aplicado obrigatoriamente em programas e projetos direcionados ao desenvolvimento da educação, na forma do regulamento.
E no seu artigo 50-B apresenta o seguinte texto:
Art. 50-B. As receitas de que tratam os arts. 48-A, 49-A e o § 5º do art. 50 serão destinadas, exclusivamente, para a educação, em acréscimo ao mínimo constitucionalmente obrigatório, na forma do regulamento.
O que isto quer dizer?
1. Que apenas o rendimento das aplicações dos recursos depositados no Fundo Social será objeto de vinculação para a educação (50%).
2. Apenas os recursos de contratos do regime de concessão posteriores a 03.12.2012 serão destinados integralmente à educação.
3. Há enorme dificuldade de calcular qual será o montante do primeiro item, sendo que alguns estudiosos afirmam que “se os recursos destinados ao FS fossem capitalizados entre 2013 e 2020, ao final desse último ano aí estariam, no máximo, perto de 16% do PIB. Um rendimento de 2% em 10 anos, calculado sobre esse capital, daria retorno anual de 0,03% do PIB; e, de acordo com a MP 592, metade disso, ou 0,015% do PIB, iria para a educação”.
4. O principal regime de exploração das áreas do pré-sal será o de partilha, conforme Lei nº 12.351 de 2010. Segundo o consultor legislativo da Câmara dos Deputados Paulo César Lima, a área do pré-sal corresponde a 149.000 km², sendo que 28% já foram concedidos (a Petrobrás domina 24%) e ainda restam, portanto, 72% para serem licitados. Nestas áreas a educação somente receberá 450% da rentabilidade da parcela que cabe a União e que estará no Fundo Social.
5. Poderemos ter contratos no regime de concessão em áreas fora do pré-sal. Ou seja, a educação só participará com 100% dos recursos dos royalties em áreas novas e licitadas pelo regime de concessão e que estejam fora do pré-sal.
Na madrugada de hoje ( 07/3) o Congresso Nacional derrubou os vetos apostos pela presidenta Dilma a Lei nº 12734, de 30 de novembro de 2012. A referida Lei havia estabelecido uma repartição dos royalties de forma a beneficiar de maneira mais significativa todos os estados e municípios e não somente os denominados “produtores” ou “confrontantes”.
Segundo as informações da secretaria da mesa do Congresso, no Senado, 63 dos 81 senadores votaram, sendo 54 pela derrubada do veto. Na Câmara, votaram 405 dos 513 deputados, sendo 349 pela derrubada de alguns dos 142 vetos e 354 pela derrubada de outros (estavam em análise 142 vetos). Sendo assim, houve maioria nas duas Casas para a derrubada.
Agora o presidente do Congresso, senador Renan Calheiros, enviará a parte remanescente do projeto vetado à presidenta da República para promulgação. Promulgado o texto, Dilma Rousseff o enviará à publicação no Diário Oficial da União. A nova lei passará a vigorar a partir da data de sua publicação.
Em 2011 foram distribuídos 15,2 bilhões de reais e os chamados estados produtores (Rio e Espírito Santo principalmente) ficaram com 13,4 bilhões e os demais estados e municípios com apenas 1,8 bilhão de reais.
A previsão é que seja distribuído para estados e municípios em 2013 um valor aproximado de 21,7 bilhões de reais e pelos novos critérios os dois estados citados acima (e seus municípios) ficarão com 11,2 bilhões e os demais estados e municípios ficarão com 10,4 bilhões. Isso significa que os demais estados, comparando com os números de 2011, receberão 8 bilhões a mais.
Este recurso não possui vinculação obrigatória para a educação, mas se fosse usado prioritariamente nessa função seria de enorme importância. Para se ter uma ideia da ordem de grandeza basta comparar com o valor de complementação da União para os nove estados beneficiados por este instrumento no FUNDEB.
Em 2013 deverão ser repassados 10,7 bilhões de reais, estando incluído neste valor o montante de um bilhão para auxiliar no pagamento do piso e que nunca é liberado para ninguém e volta para o fundo. Este valor irá beneficiar o Alagoas, Amazonas, Bahia, Ceará, Maranhão, Pará, Pernambuco, Paraíba, Piauí.
Pois bem, com a derrubada dos vetos somente estes nove estados receberão de royalties o montante de 4,7 bilhões, ou seja, 45% de tudo que receberão de complementação.
É verdade que ainda ocorrerão recursos ao STF, mas todo este dinheiro deveria ter uma destinação específica, que realmente fizesse diferença nas demandas sociais reprimidas. A educação, por todos os estudos feitos, é uma das áreas que mais impactaria no futuro da economia e do desenvolvimento do país. Dispersar esses recursos não me parece que contribua para superar as enormes dificuldades de nossas políticas públicas, mesmo que ajude a estados e municípios a respirar em tempos de crise.
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