Diário do IV SEB

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Luiz Araujo




No dia 20 de fevereiro, no Centro de Convenções da UNICAMP, teve início o IV Seminário de Educação Brasileira, evento educacional promovido pelo CEDES (Centro de Estudos Educação e Sociedade).



Este evento é um espaço qualificado de debate das políticas educacionais e tem este ano como temática o Plano Nacional de Educação com foco na política de responsabilização, regime de colaboração e sistema nacional de educação.

A conferência de abertura foi proferida pelo economista Márcio Pochmann, ex-presidente do IPEA. A sua fala trouxe para a área educacional dois elementos bastante instigantes.

O primeiro elemento é que vivemos uma fase de transição do padrão de sociedade, pois estaríamos transitando para sociedade pós-industrial ou do conhecimento. Márcio apresentou cinco referências desta nova sociedade:

a. Profunda alteração demográfica, inclusive superando demanda enorme de atendimento de crianças e jovens. Fase de redução relativa e absoluta do número de crianças e jovens no total da população. Falta expertise para tratar o envelhecimento populacional;

b. Alteração da expectativa de vida, a qual deverá chegar a 100 anos;

c. Alteração de gênero, separando o sexo para a reprodução;

d. Alteração na vida com o trabalho, devido ao predomínio do material imaterial. Viver e trabalhar simultaneamente. Hoje 70% são trabalhos no setor terciário em nosso país.

e. Alteração da relação com o trabalho e educação. O atual modelo está esgotado, pois era só para o segmento mais jovem. Nova sociedade exige estudar a vida toda.


Vários aspectos deste elemento incidem diretamente no papel da educação, inclusive no que diz respeito à demanda de vagas e na exigência de formação educacional.


O segundo elemento colocado foi que continuamos vivendo uma crise do modo de produção capitalista, que deve ser de longa duração, e que as crises são importantes para países como o Brasil por que abrem oportunidades, basta ver a história do país.

Haveria um esgotamento da fase liberal do capitalismo. Cada vez temos limitação das liberdades individuais. Vivenciamos o desaparecimento da liberdade de iniciativa e competição. Temos 500 grandes corporações que dominam o mercado mundial e definem os rumos e respondem por 50% do PIB Mundial e 50% do comércio mundial, feito entre cadeias de valor agregado e não tendo mais como referência os países. Estas corporações respondem por 70% da pesquisa.

Este quadro afeta diretamente a democracia, pois as corporações interferem diretamente nos pleitos. As empresas transformam os Estados nacionais em aparato funcional aos seus interesses.

Estaríamos diante de limites ao crescimento da produção e ao consumo quando discutimos a sustentabilidade ambiental. A universalização do padrão americano se mostrou inviável.

Por fim, o capitalismo, como regra, valoriza o capital por meio da escassez. Vivemos um quadro do excesso de produção, mesmo que exista um problema crônico de distribuição e tenhamos gente morrendo de fome. Mas o problema não seria a falta de produção.

Os dois elementos colocariam a educação nesta nova sociedade em um papel central.

Primeiro por que conhecimento pressupõe capacidade de sistematizar informações. Cada vez está sendo superado o universo de especialistas e aparece a demanda por um novo profissional.

Segundo, por que a universidade passará a ser o piso e não o teto, pois hoje ela seria para 5% da população e não será mais. Haverá postergação no ingresso no mercado de trabalho. Os ricos já fazem isso. Há resistência ao ver o mundo desta forma. Gastamos 5% em toda a educação, e as corporações gastaram 1% só na formação dos seus trabalhadores.

Terceiro, teremos que tratar a educação na inatividade, ou seja, o que oferecer com cidadãos até 24 anos e depois dos 70 anos.

O quarto desafio é enxergar a centralidade do trabalho imaterial. O nosso tempo de trabalho foi intensificado e o trabalho não tem mais um local determinado. A riqueza que está sendo produzida não é disputada nem tributada.

E por fim, nosso país tem grande responsabilidade no cenário de crise mundial. Precisamos realizar reformas clássicas que não foram feitas.

É sempre bom ter a oportunidade de assistir um debate que apresente novas temáticas e novos desafios.

Escolher que debate participar em um evento rico de discussão é sempre angustiante. Na tarde do primeiro dia decidi contribuir com o debate sobre federalismo, desigualdade e financiamento da educação. Ao final do dia fiquei satisfeito com a escolha.

O debate sobre este tem foi feito por três pesquisadores, cada um expondo caminhos e facetas distintas do problema.

O professor chileno Sebástian Donoso buscou problematizar a formulação de políticas públicas descentralizantes em matéria de financiamento educacional. Apresentou alguns temas chaves para a constituição de um sistema educacional. Para ele é preciso discutir a sustentabilidade social, financeira e política, a governabilidade de demandas de equidade e o papel do território.

Donoso destacou que a educação deve ser uma ferramenta de equidade, ou seja, a prestação deste serviço deve incidir sobre as desigualdades sociais existentes.

É preciso também que fiquem claros os pressupostos para a constituição de um modelo de financiamento. Este modelo deve estar ancorado na factibilidade da construção de um pacto social, em uma governabilidade em médio prazo, na existência de instrumentos de financiamento que representem o fenômeno em sua complexidade e, por fim, a presença de soluções viáveis e resultados concretos a curto, médio e longo prazo.

Destacado de sua fala a afirmação de que há países centralizados e há países descentralizados com bons resultados educacionais. E que, portanto, seria simplismo reduzir o debate sobre financiamento e desigualdade apenas a esta questão.

A segunda apresentação coube a professora Marta Arretche, que apresentou trabalho de pesquisa que está construindo indicadores que permitam avaliar o desempenho das políticas públicas de saúde e educação.

Para ela a grande pergunta é qual é a desigualdade existente e o quanto tem de dimensões territoriais. Parte da certeza de que os atuais indicadores são insuficientes e concentrados em uma apenas dimensão. Defende que uma avaliação seja abrangente em termos de resultados.

Apresentou o Índice de desempenho da saúde e educação, composto de dez indicadores para cada política pública. Os indicadores pré-existentes utilizados são convertidos em escala que varia de zero a um. Não há parâmetro externo e sim relação entre o pior e melhor dentro do universo, ou seja, compara os municípios entre si.

A conclusão preliminar da expositora é que, por um lado, houve melhorias em termos de desigualdade entre os municípios no decorrer da última década. Mas, por outro lado, a educação conseguiu menos progressos do que a saúde. Parece que a educação continua vinculada a desigualdade de renda dos municípios e a saúde se tornou mais equalizada.

Assim, ela conclui que a saúde é menos desigual que a educação, mesmo que ao final d década tenha havido uma melhora nos indicadores educacionais.

Seu trabalho permite inúmeras reflexões. A primeira é sobre a necessidade de profundo questionamento acerca dos limites dos atuais indicadores educacionais, parciais e centrados em poucas variáveis da realidade. A segunda diz respeito ao fato de que precisamos verificar por que a educação não tem sido eficaz na redução das desigualdades territoriais.

O último expositor foi Jorge Abrahão, pesquisador da área do financiamento, que sistematizou os grandes desafios colocados no debate do Plano Nacional de educação, mostrando dados sobre desigualdades territoriais e também entre os estratos sociais.

E trouxe uma inovadora reflexão sobre a necessidade de medidas práticas para viabilizar recursos para que o gasto educacional chegue ao final da década a 10% do PIB.

Do conjunto das exposições ficou clara a necessidade de que os educadores se debrucem sobre a temática da desigualdade territorial e sua influência no processo de constituição de um novo plano nacional da educação.



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