Reflexões sobre os tipos de escolas existentes
Reflexões sobre os tipos de escolas existentes
– Em qual você acredita?
Regina Milone
Temos escolas, públicas e particulares, mais ou menos comprometidas com projetos pedagógicos bem embasados, conhecidos e continuamente construídos por todos, assim como temos escolas onde o modelo tradicional, onde ninguém escolhe nada e apenas se segue programas curriculares pré-estabelecidos, continua imperando (estou simplificando um pouco, colocando apenas dois grandes grupos existentes, pois considero muitos outros decorrentes destes). Com qual você se identifica?
Uma das coisas que mais me choca, como pedagoga, é ver o despreparo geral dos educadores – professores, diretores, supervisores, coordenadores, funcionários de apoio e, infelizmente, muitos pedagogos também -, tanto em relação a pensar a Educação quanto em relação a refletir sobre a prática, sua e de muitos outros, em outras escolas, estados e mesmo países. A visão é tão estreita que chega a dar dó. O trabalho do educador, a princípio, é um trabalho intelectual (ou deveria ser!). O educador que não pensa sobre o que é educar, como educar, porque educar, não deveria nem ser considerado verdadeiramente um educador, em minha opinião. Mas, infelizmente, a preguiça da qual tantos alunos são acusados está igualmente presente nos “educadores”. A maioria não quer estudar, não gosta de estudar, pouco ou nada lê (quer que o aluno goste de ler e estudar como???) e nunca sequer se questionou sobre essas coisas!
Em quantas reuniões pedagógicas, que coordenei junto com colegas, com a presença de professores, diretores e demais profissionais da parte administrativa da escola, todos faziam pequenos grupinhos e ficavam de bate-papo, sem o menor respeito pela fala dos pedagogos e de outros colegas, tornando a sala tão barulhenta e cheia de “zum-zum-zum” quanto os professores sempre reclamam que são as salas onde dão aula, por causa dos alunos. É uma falta de autocrítica absurda! Impressionante. Agiam e agem (todos os educadores presentes, incluindo os professores), muitas e muitas vezes, da mesma forma que tanto criticam nos alunos! Fazem igualzinho. Os professores, por exemplo, costumam só parar para prestar atenção em algo quando é para reclamar de alguém: dos alunos, da Secretaria de Educação, da Direção da escola, dos supervisores, dos pedagogos, das famílias dos alunos, etc. E então, invariavelmente, essas reuniões viram muros de lamentações, onde ninguém pensa, reflete, ouve ou vê verdadeiramente ao outro ou a si mesmo. E saem sempre reclamando dessas reuniões também, sem pensar que ela é construída por todos que delas participaram!
E as reuniões onde insistimos (nós, pedagogos) em que representantes dos alunos e dos pais também participassem (eu era uma que sempre insistia nisso)? Na maioria esmagadora das escolas em que trabalhei e das tantas outras que tive contato, ninguém queria isso, embora muitos não assumissem claramente.
Sou professora também, mas, como pedagoga, na faculdade e dentro da escola, aprendi muito mais sobre Educação e sobre todos os elementos que interagem para que ela aconteça do que aprendi como professora. Especialmente porque pude observar muito, ouvir a todos, individualmente e em grupo, me colocando no lugar de cada um sem chegar com uma idéia pré-concebida de como esse lugar seria, o que me fez ter uma visão muito mais ampla da realidade do que tinha quando era apenas professora. E tive humildade para aprender com isso.
Então hoje estou aqui, entre outros motivos, não para passar a mão na cabeça dos professores, tratá-los como vítimas ou “sábios incompreendidos e injustiçados”, pois eles não são, em minha opinião. Quem já leu outros artigos meus sabe que defendo salários muito maiores para os professores, número muito menor de alunos por turma, mais verbas para a Educação, entre outras medidas pra lá de urgentes, mas também sempre defendi e defendo que o professor deve ser, antes de tudo, um EDUCADOR e que não se pode dizer que houve ensino real – por mais que o professor tenha se esforçado dentro da falta de condições atual das escolas, principalmente as públicas – se não houve aprendizagem, porque quem ensina, ensina alguma coisa a alguém e se esse “alguém” não está aprendendo é porque algo no modelo de ensino, além de todas as questões políticas, macro, já citadas em tantos artigos por aqui, precisa mudar. Existe um PROCESSO ensino-aprendizagem e essa é uma via de mão dupla! E me sinto totalmente à vontade para dizer isso por também ter trabalhado como professora e por ter tido a maravilhosa experiência de colocar o meu filho para estudar numa escola verdadeiramente construtivista na prática (não só no discurso), uma escola onde a autonomia, a criatividade e o ritmo de cada aluno são respeitados, onde não há “decoreba” e sim desenvolvimento real do raciocínio, da sensibilidade, da iniciativa, do espírito de grupo, da cidadania, entre outros “conteúdos” que considero, esses sim, um milhão de vezes mais importantes do que os ultrapassados (e sempre esquecidos depois…) conteúdos curriculares que ainda se tenta, na grande maioria das escolas (e isso não acontece só no Brasil), empurrar goela abaixo dos alunos.
Alguém pode responder, com SINCERIDADE, o que se lembra dos conteúdos estudados na escola, depois de aprender a ler e escrever??? Ou esquecemos quase tudo, lembrando apenas um pouco do que gostávamos mais? É preciso coragem e honestidade para dizer que não lembramos porque aquilo não fazia sentido para nossas vidas! Era um universo à parte, chato, obrigatório, longo e que todos seguiam porque “sempre foi assim”. Então porque tantos ficam tão chocados com o desinteresse que milhares de alunos demonstram ter pela escola?
Além disso, ficar horas seguidas sentado, ouvindo, escrevendo e pensando, todos os dias, não é fácil nem para crianças e nem para adolescentes, pois vai totalmente contra a própria energia natural dessas faixas etárias, que pedem mais dinamismo e participação, mas não a participação que costumamos lhes sugerir e sim espaço para que possam inclusive escolher que tipo de participação poderiam ter para aprender. Mas ainda estamos longe disso, pois o modelo que impera é o tradicional, onde professor ensina (ou tenta, na nossa triste realidade…) e o aluno aprende (ou tenta… e muitos nem isso fazem).
Fui a melhor aluna da minha turma durante toda a minha vida escolar. Eu não partia pra decoreba e sim procurava entender e, assim, aprender de verdade. Mas há muitos e muitos anos não me lembro de praticamente mais nada do que estudei na escola! Aliás, mal entrei pra faculdade, já não lembrava de mais quase nada do que “aprendi” antes. Lembrava de professores maravilhosos que tive, diretores presentes (quando existiam), colegas queridíssimos (alguns reencontrei via internet nos últimos anos e foi ótimo!), mas as matérias que estudávamos? Não lembro de praticamente nada!!!
E eu sou apenas um exemplo entre milhares.
Por essas e outras é que questões sobre “que escola queremos afinal” são FUNDAMENTAIS quando se fala em melhorar a Educação, pública e particular, no Brasil.
A escola onde meu filho estudou, para quem ficou curioso, chama-se EDEM – http://www.edem.g12.br/v2/index.php – e é particular. Não trabalho lá e não ganho um tostão para fazer propaganda deles. Apenas falo dela para que as pessoas que, em algum momento, tenham o mínimo de curiosidade e abertura intelectual e profissional para ver outras realidades, saibam que escolas assim existem SIM e funcionam muitíssimo bem! Inclusive aprendendo com seus erros e se reconstruindo constantemente, o que é outra qualidade que valorizo bastante. Uma escola onde o mais importante é a liberdade e o respeito às diferenças, onde a inclusão funciona, entre outras coisas. Mas, ao mesmo tempo, uma escola que, no Ensino Médio, vira outra escola, se descaracterizando bastante (infelizmente…), por cobrança dos próprios pais dos alunos que só pensam em seus filhos passando no Vestibular e em outros concursos futuros… Mas isso já é assunto para outro artigo.
Um exemplo de escola, que funciona muito bem dentro da filosofia construtivista desde 1976, é a Escola da Ponte, em Portugal. Deixo aqui alguns links para quem se interessar em conhecê-la ao menos um pouquinho:
Site oficial da Escola da Ponte: http://www.escoladaponte.com.pt/
Escola da Ponte: http://www.youtube.com/watch?v=VekBzEu6AWg
Rubem Alves fala sobre a Escola da Ponte: http://www.youtube.com/watch?v=MtGyHzIafLc
Resumo do livro de Rubem Alves: A escola que sempre sonhei sem imaginar que pudesse existir – http://www.cienciashumanas.com.br/resumo_artigo_4921/artigo_sobre_a_escola_que_sempre_sonhei_sem_
imaginar_que_pudesse_existir
A ESCOLA DA PONTE – CRÔNICA DE RUBEM ALVES: http://www.webestudante.com.br/we/index.php?option=com_content&view=article&id=1096%3Aa-
escola-da-ponte-cronica-de-rubem-alves&catid=95%3Atemat-do-cotidiano-escolar&Itemid=51
José Pacheco e a Escola da Ponte: http://revistaescola.abril.com.br/formacao/formacao-inicial/jose-pacheco-escola-ponte-479055.shtml
Pesquisem, busquem, reflitam… Debater só sobre salários, sobre a desvalorização do professor e outros assuntos que já são debatidos e acompanho há pelo menos uns 30 anos (e já vem de antes disso!) não é suficiente para melhorar a Educação. É preciso se discutir que Educação queremos, que tipo de escola queremos e, nessa escola, qual o papel do professor que, em minha opinião, tinha que ser muito diferente do que é hoje (até para não continuar essa sobrecarga sobre eles…), assim como todos os outros papéis dos demais profissionais da escola. Senão os debates ficam só na eterna repetição que eu, sinceramente, acho cada dia mais sem sentido…
Abraços,
Regina Milone
Pedagoga, Arteterapeuta e Psicóloga
Rio, 21/12/2012