Sala de aula da Kroton (Germano Lüders//EXAME)
São Paulo – A semana começou com a notícia de que a Kroton – dona da rede de ensino superior Anhanguera – fechou a compra da Somos – dona de marcas como Ática, Scipione e Anglo. Na proposta, a Kroton oferece 4,5 bilhões de reais por 73% da Somos.
Se aprovado pelo Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), o negócio consolida a aposta da gigante da educação no segmento do ensino básico, ainda dominado por pequenos grupos empresariais, muitos deles familiares.
A atenção da Kroton para o setor ganhou força depois que o Cade vetou a compra da Estácio, sua maior concorrente na educação superior. Sem ter para onde crescer neste mercado, a Kroton voltou seus olhos para as escolas.
A proposta de aquisição da Somos foi vista com otimismo no mercado financeiro. Na segunda-feira, as ações da Kroton tiveram alta de quase 6%, enquanto a Somos registrou ganhos de 53%.
Mas, e o setor de educação, o que pensa da transação?
O site EXAME conversou com especialistas para discutir os possíveis efeitos da presença mais agressiva da Kroton na educação de crianças e adolescentes no país.
Vale lembrar que a empresa já atua neste setor – a origem da Kroton está no Colégio Pitágoras, nascido em Belo Horizonte. Há pouco tempo, a Kroton anunciou sua primeira compra no ensino básico: o Centro Educacional Leonardo da Vinci, em Vitória (ES), o qual atua no setor de alta renda.
A aquisição da Somos eleva essa presença na educação básica a outro patamar. Se a aquisição for confirmada, a empresa passa a ter forte presença nos sistemas apostilados, método de ensino que organiza o conteúdo aula a aula.
Com isso, uma parcela dos educadores e estudiosos do assunto teme que esse tipo de sistema ganhe ainda mais espaço nas escolas, gerando uma educação padronizada e pouco crítica. Outro temor é que a busca por maiores lucros se sobreponha à boa formação do aluno.
“[Nas escolas de sistema apostilado] a qualidade é baixa, o professor vira um executor de sequências de aulas didáticas, ele não tem tempo de pensar. E o estudante vira uma commodity”, critica Fernando Cássio, professor e pesquisador em políticas educacionais da Universidade Federal do ABC.
Ainda segundo o professor, a aposta da Kroton no setor pode levar a um crescimento das escolas particulares mais baratas, voltadas à população de baixa renda. “O esforço da Kroton será tentar tirar matrículas do setor público, investindo em propaganda pra disfarçar a mediocridade pedagógica desses sistemas”, afirma.
Foco no aprendizado
Já para Chico Soares, professor aposentado da UFMG e ex-presidente do Inep, a maior presença da Kroton no ensino básico não é necessariamente ruim. “Meu critério é o aprendizado do aluno. Se for verificado que eles estão aprendendo mais, é o que importa”, avalia.
Segundo o professor, a presença de um grande grupo como a Kroton no segmento pode ajudar a levar a tecnologia para a melhoria do ensino, através do acompanhamento de métricas de aprendizado, por exemplo.
Outro ponto é que, como a empresa atua também na formação dos profissionais que trabalharão nas escolas, abre-se a possibilidade de uma relação mais direta entre as necessidades verificadas em sala de aula e a formação do professor, afirma Soares.
“Se essa compra da Somos valoriza o que é bom, pode-se ter um efeito interessante, porque vou ter mais criança aprendendo. Mas, se é só um arranjo financeiro, com padronização e precarização dos professores, aí não interessa. É importante termos a noção de que esse grupo tem um papel diante do país, não só diante de seus acionistas”, resume Soares.
Do ponto de vista do mercado, a aquisição da Somos pela Kroton “é um grande movimento que fará com que os outros grupos acordem”, avalia Francisco Borges, consultor da Fundação FAT em Políticas Públicas voltadas à Educação.
Segundo Borges, os maiores concorrentes da Kroton no setor são a Editora Moderna, de material didático, e os grupos Positivo e Objetivo, de educação. “Mas não vejo, em nenhum desses grupos, força para fazer frente à Kroton”, avalia.
A visão da Kroton
As críticas aos sistemas apostilados são “desinformadas” na visão de Mario Ghio, vice-presdiente de educação básica da Kroton.
“Esses sistemas garantem uma qualidade mínima. Não se espera que o professor seja piloto de apostila, ele precisa trazer sua cor pessoal. Mas vários indicadores mostram que as escolas que usam esses sistemas vão melhor no Enem do que as que não utilizam”, afirma.
O vice-presidente argumenta ainda que a empresa se preocupa, sim, com a qualidade da educação. “Caso contrário, o negócio não é viável. No fim todos querem qualidade”, diz.
Ghio nega que a empresa tenha a intenção de investir em escolas particulares mais baratas, focadas no segmento C e D.
A estratégia, por enquanto, é adquirir unidades “premium”, para replicá-las em outros bairros – Ghio garante que a Kroton não pretende mexer no projeto pedagógico dessas escolas, mas sim abrir novas unidades com aquele mesmo modelo.
Para os estudantes menos abastados, o foco continua sendo os sistemas apostilados.
https://exame.abril.com.br/negocios/o-que-a-expansao-da-kroton-representa-para-a-educacao-no-pais/
A Kroton mira o nicho e a massa no ensino básico
A compra da Somos mostra que o maior grupo de ensino do planeta tem uma estratégia de mão dupla para crescer
Por Denyse Godoy 23 abr 2018
Kroton: Foram mais de 20 aquisições para se transformar na maior empresa de educação do planeta. (Germano Lüders/Site EXAME)
São Paulo – O grupo de ensino Kroton é uma máquina de fazer aquisições. Foram mais de 20 em sua caminhada para se transformar na maior empresa de educação do planeta. A lógica que predominou por uma década de crescimento alucinante era mais ou menos essa: comprar redes em mercados estratégicos, implementar os processos da Kroton, melhorar as margens, partir para a próxima.
A escalada parou, como se sabe, quando o Cade, o conselho de defesa da concorrência, vetou ano passado a compra da Estácio, o segundo maior grupo de ensino do país. Desde então, a Kroton voltou as atenções para o mercado de educação básica. Para crescer no mercado de escolas, a empresa continuou comprando, mas mudou a estratégia. Se antes a ordem era escala, escala e escala, agora a Kroton adotou uma via de mão dupla.
Isso ficou claro na manhã desta segunda-feira, quando a Kroton anunciou a compra da Somos Educação, dona do sistema de ensino Anglo e de editoras de livros didáticos como a Ática, por 4,5 bilhões de reais. O anúncio fez as ações da Somos subirem 49% até as 17h.
Há duas semanas, a Kroton havia anunciado sua primeira compra no ensino básico: o Centro Educacional Leonardo da Vinci, em Vitória (ES), o qual atua no setor de alta renda. O valor do negócio não foi divulgado, mas no mercado estima-se que tenha ficado em cerca de 120 milhões de reais. À época, Rodrigo Galindo, presidente da Kroton, disse que o objetivo da empresa é adquirir escolas de prestígio Brasil afora e, com a mesma marca e metodologia, abrir novas unidades em regiões próximas. Cada escola comprada ganharia cerca de cinco novas unidades numa mesma região – a Kroton avalia que há espaço para 13 aquisições pelo país. Cada uma dessas regiões manteria sua própria marca e metodologia. Ou seja, sai a escala, entra o sob medida. Sai a classe BC e entra a AB.
Com a Somos, a Kroton mostra que, em paralelo com o crescimento região a região, vai apostar também na escala no ensino básico. Além de fornecer material didático e sistemas de ensino, a Somos também administra marcas que oferecem cursos no chamado contra-turno do horário escolar tradicional, como os de idiomas. E aí não entram as diferenças regionais: curso de idiomas é igual do Rio Grande do Sul ao Amapá.
“O negócio surpreendeu o mercado, que estava esperando aquisições menores por parte da Kroton. Mas foi uma surpresa positiva, porque a Kroton escolheu justamente uma das maiores empresas desse segmento, que tem marcas fortes não só em escolas mas em livros didáticos, material de apoio para o sistema público de ensino. É um ativo que estava barato na bolsa”, diz Felipe Silveira, analista da corretora Coinvalores. “O segmento de educação básica, que ainda é muito fragmentado no país, está passando mesmo por um momento de consolidação, com diversos grandes players de olho em escolas para comprar.”
A aquisição da Somos é o primeiro grande negócio da Kroton após o Cade barrar a aquisição da rede de universidades Estácio, em junho do ano passado. “Desde esse revés no Cade, o discurso da Kroton era o de que a empresa focaria no crescimento orgânico. Mesmo a compra do Leonardo se encaixava nesse tipo de , porque não há espaço no segmento premium do ensino básico para tantos negócios assim”, diz Eduardo Guimarães, especialista em ações da consultoria de investimentos Levante. “Mas essa transação com a Somos lembra o velho estilo da Kroton, agressivo em aquisições. É uma volta desse DNA. E parece natural que siga nesse caminho, já que tem bastante dinheiro em caixa.” Saiba mais: Qual é a hora certa de investir mais no seu negócio? A BizCapital te mostra
A aquisição da Estácio estava estimada em 5,5 bilhões de reais. A Kroton vai pagar 4,6 bilhões de reais pela Somos, sendo 4,1 bilhões de reais à vista, uma quantia quase 60% acima do valor de mercado da empresa. O grupo ainda terá que desembolsar um montante extra para comprar as ações detidas pelos minoritários da Somos em uma OPA (Oferta Pública de Aquisição), segundo as regras do mercado de capitais brasileiro.
Somando com a quantia a ser paga aos minoritários, o valor do negócio sobe para 6,6 bilhões de reais. Desse montante, 5,5 bilhões de reais serão captados no mercado, liberando caixa para que a Kroton continue fazendo aquisições menores em educação básica. No final de 2017, a companhia tinha 1,7 bilhão de reais (na teoria, mesmo depois da compra da Somos sobra caixa para novas aquisições).
Como a Somos tinha um volume de negociações pequeno – enquanto a gestora Tarpon Investimentos possuía uma fatia de 74,8% na empresa e o GIC, fundo soberano de Singapura, controlava outros 18,5%, somente cerca de 6% das ações da companhia estavam nas mãos de minoritários –, a expectativa dos especialistas é de que a Kroton feche o capital da sua nova subsidiária, deslistando-a da B3, a bolsa de valores brasileira.
O passo seguinte da nova gestão da Somos, segundo o modelo utilizado pela Kroton nas suas aquisições, é fazer uma forte reforma financeira na casa nova, enxugando despesas e melhorando a margem de lucro da companhia comprada. Em 2017, a margem Ebitda (lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização) da Somos foi de 30%. Os resultados da sua nova controladora em aumentar tal percentual podem justificar para os seus investidores, no médio e no longo prazo, o preço considerado salgado dessa compra. Levando em conta o histórico da Kroton nesse tipo de transação, os acionistas da empresa parecem confiantes no sucesso: no meio da tarde desta segunda-feira, a ação do grupo de ensino subia 5,11% – ou mais de 1 bilhão de reais.
https://exame.abril.com.br/negocios/a-kroton-mira-o-nicho-e-a-massa-no-ensino-basico/
Quanto a Kroton paga a professores e demais funcionários? Veja salários
Confira os salários para professores e mais 14 cargos na Kroton, gigante da área de educação que acertou a compra da Somos hoje
Por
Camila Pati 23 abr 2018
Sala de aula: professor universitário ganha por volta de 4 mil reais (Thinkstock/Thinkstock)
São Paulo – Com domínio consolidado no ensino superior, a Kroton Educacionalacertou hoje a compra da Somos Educação, num movimento definitivo de conquista de espaço na educação básica brasileira.
A assinatura foi divulgada hoje em fato relevante na CVM (Comissão de Valores Mobiliários) e o valor estabelecido é de 4,5 bilhões de reais que serão pagos à controladora da Somos Educação, a Tarpon.
Esbanjando apetite no mercado educacional, a Kroton recebeu, na plataforma Love Mondays, mais 130 avaliações de funcionários e ex-funcionários nos últimos 12 meses. Pouco mais 70% dos usuários disseram que recomendariam a empresa a um amigo. Confira os índices de satisfação, medidos de acordo com as informações espontâneas dos usuários da comunidade de carreira.
Alguns pontos positivos destacados por um analista, que deixou a empresa neste ano, e que recomenda a empresa são o investimento em tecnologia e treinamentos e as possibilidades internas de crescimento. Já o ritmo constante de mudanças requer, segundo esse mesmo funcionário, esforço físico e mental para superar desafios.
Outro ex-funcionário, da área de RH, elogia a política de remuneração e a plataforma de treinamentos, mas critica a liderança a quem recomenda colocar um olhar mais voltado ao lado humano acima da lucratividade. No quatro trimestre, a Kroton teve lucro líquido ajustado de 488,64 milhões de reais.
“Gestores operacionais e nada resolutivos. Focam muito em achar o culpado e não resolvem os problemas. Empresa que estimula muito o lado competitivo dos colaboradores, o que torna alguns ambientes de trabalhos não sadios”, escreveu o profissional, em avaliação publicada há pouco mais de 10 dias.
A estrutura de trabalho, a equipe e os treinamentos oferecidos são elogios que se repetem. Do lado das críticas, a falta de oportunidade de carreira parece ser uma fraqueza da Kroton, como empregadora, segundo as percepções divulgadas pelos funcionários e ex-funcionários.
Um roteirista e um analista administrativo são exemplos de profissionais que reclamam de pouca chance de crescimento. “Acredito que a empresa se preocupa excessivamente com o seu crescimento e por diversas vezes se esquece de que este não existiria sem os seus funcionários. Existem diversas áreas em que é possível se desenvolver e conseguir promoções de acordo com as suas entregas, no entanto, em outras, isso só é possível caso alguém do time saia e/ou tenha indicação”, escreveu o analista, que deixou a empresa em 2017.
Se a oportunidade de carreira é o item mais mal avaliado entre os componentes de satisfação profissional, a política de remuneração é a que tem a nota mais alta. De estagiário a diretor, confira a seguir os salários informados para 15 cargos:
https://exame.abril.com.br/carreira/quanto-a-kroton-paga-a-professores-e-demais-funcionarios-veja-salarios/