Escolas para a classe A
Escolas para a classe A na mira dos investidores
Filão busca atender demanda por ensino bilíngue com currículo flexível. Rio terá duas novas redes
POR GLAUCE CAVALCANTI 23/10/2016
Antecedência. Tour com os pais dos futuros alunos da Eleva, em Botafogo: com matrículas esgotadas para 2017, escola já abriu pré-matrícula para 2018 - Analice Paron/4-5-2016
Após um recente boom no ensino superior, a educação básica privada — da creche ao vestibular — para a classe A se tornou o centro das atenções dos grandes grupos do setor no país. O filão, somado à demanda por novos modelos de ensino, bilíngues e que combinem alta qualidade acadêmica ao desenvolvimento do aluno de forma individualizada, está trazendo projetos em uma categoria super premium ao mercado. A Concept, lançada pelo Grupo SEB, que abre as primeiras unidades em Salvador (BA) e Ribeirão Preto (SP) em 2017, e chegará ao Rio e a São Paulo em 2018, quando terá um centro de aprendizagem em Palo Alto, no Vale do Silício, nos EUA. No ano que vem, a Escola Eleva — projeto sob o guarda-chuva da Gera Venture Capital, fundo que tem Jorge Paulo Lemann como principal investidor — abre as portas no espaço onde funcionou a Casa Daros, em Botafogo.
— A expansão (no ensino privado) começou pelo mercado superior. Mesmo antes da revisão das regras do Fies, já se sabia que chegaria um momento de parada. A experiência em outros países mostra que a expansão calcada em crédito estudantil público não é sustentável. O mercado já apontava que a educação básica seria a bola da vez — avalia Paulo Presse, da Hoper Consultoria, especializada na área de educação.
Na educação básica, ao contrário do que ocorre no ensino superior, a maioria dos alunos (82%) está matriculada na rede pública. O total de matrículas, contudo, vem encolhendo. Em 2015, houve queda de 2% na comparação com o ano anterior. Sobre 2011, a retração foi de 1,1%. A exceção à curva está na educação infantil (para crianças de até 5 anos), que cresceu 5,2% em 2015 e 7,3% em cinco anos.
— Existe evasão escolar, mas a curva demográfica do Brasil já se traduz em um número menor de crianças e adolescentes em idade escolar. Na educação infantil, a expansão é puxada pela obrigatoriedade do ensino, que fez o governo criar unidades e vagas. Aconteceu o mesmo na rede privada, puxada pelo ganho de renda da população — conta Presse.
No todo, embora as matrículas tenham caído, a fatia das escolas privadas de educação básica cresceu de 16,3% para 16,6% no ano passado.
— A educação básica é, sem dúvida, a próxima onda. Tem um ciclo quatro vezes mais longo que o dos cursos do ensino superior, com matrículas e mensalidades mais altas. É um negócio extremamente pulverizado e difícil de consolidar. A oferta tem mais a ver com perfil e proposta de valor do que preço — explica Thamila Zaer, diretora executiva do Grupo SEB, filha e possível sucessora de Chaim Zaher, à frente do grupo paulista e o maior acionista individual da carioca Estácio.
SEB QUER ABRIR CAPITAL EM 2018
Estratégia. Chaim Zaher e a filha, Thamila: grupo SEB trará o modelo de escola Concept ao Rio em 2018 e já procura terrenos na Zona Sul ou na Barra- Monica Imbuzeiro
O SEB, que totaliza 45 mil alunos em 39 escolas em oito estados, já trabalha para fazer a abertura de capital em Bolsa de seus negócios no ensino básico em 2018, conta Zaher. O grupo conta com três modelos de colégios: o de entrada, com conteúdo forte e perfil de aprovação no vestibular; as escolas premium, focadas em formar cidadãos para o mundo, com maior ênfase em troca de experiências, certificações e ensino bilíngue. E por fim, vem a Concept, de currículo flexível, metodologias ativas de ensino — elaboradas a partir de estudos em países com experiências de ponta na área, como Finlândia e Cingapura — e equipe de professores contratados para trabalhar exclusivamente para a escola.
— A Concept é um projeto de vanguarda e inspiração para o grupo, no qual investimos mais de R$ 150 milhões. Cada escola, incluindo a construção do prédio, custa cerca de R$ 50 milhões. Estamos buscando um terreno para a unidade do Rio, que ficará na Zona Sul ou na Barra. A meta é ter escolas dos três perfis em que atuamos na cidade em 2018, o que também pode acontecer via aquisições — conta Zaher, que esteve com o secretário estadual de Educação do Rio, Wagner Victer, na última quinta-feira.
A Eleva é voltada para ensino fundamental e médio. Também será bilíngue, terá horário integral e um projeto que combina excelência acadêmica e o que chamam de desenvolvimento de habilidades de vida, com ensino forte e novas práticas, ferramentas e tecnologias de aprendizagem. Reserva um percentual de 10% das vagas a bolsistas. As matrículas para 2017 estão esgotadas. Foram oferecidas 370 vagas entre cinco séries diferentes: primeiro, segundo, terceiro e sexto anos do ensino fundamental e a primeira série do ensino médio.
As vagas do primeiro ano do fundamental foram preenchidas de acordo com o critério de chegada. O número de inscritos superou o de vagas no primeiro dia. Nas demais séries, o processo levou meses e envolveu avaliação do aluno e conversa com os pais. Em nota, a escola afirma que atrai “famílias que valorizam a educação, que buscam para os filhos uma visão de mundo mais abrangente, mas que não abrem mão de um ensino forte”. Semana passada, a escola deu início ao processo de pré-matrícula para as 88 vagas abertas no primeiro ano do fundamental para 2018, que se encerra no fim do mês.
A especialista em educação Andrea Ramal explica que há demanda por um ensino mais dinâmico, de acordo com o mercado de trabalho globalizado e competitivo. O Enem, ao definir as provas com base em conjuntos de conteúdo, como Ciências da Natureza, ao invés de Química, Física e Biologia, pontua ela, também colaborou para essa demanda, assim como para o investimento na melhora da qualidade de ensino e resultados das escolas em geral.
— As escolas estão demorando a mudar seus modelos de ensino, enquanto há demanda crescente por novas metodologias, tecnologia bem utilizada, esporte e arte dentro do espaço escolar, horário integral. Não faltam escolas. O que falta é diversificar a oferta. Temos boas escolas, mas que fazem mais do mesmo.
As escolas de grife que chegam ao mercado ano que vem têm mensalidades que são mais do que o dobro da média cobrada pelas de categoria premium no país, de R$ 1.305, segundo a Hoper. Saem a partir de R$ 3.500 na Concept e de R$ 3.900 na Eleva. O preço não está muito distante do cobrado por escolas classe A de Rio e São Paulo, mas fica abaixo dos valores de escolas estrangeiras com filiais cariocas, como a americana ou britânica.
No caso da Eleva, a mensalidade inclui almoço, mas não as atividades extras. A escola terá parcerias como escola de vôlei de Bernardinho, jiu-jitsu com Leão Teixeira e ballet Dalal Achcar. No total, o grupo tem 60 escolas com 30 mil alunos, com unidades em Rio, Minas Gerais e Paraná.
MENSALIDADE E APOSTILAS
O cirurgião-dentista carioca Antonio Marçal Neto matriculou a filha Maria Clara, de 7 anos, na Eleva. A menina estuda desde os 3 anos na Our Lady of Mercy (OLM), escola americana com sede em Botafogo.
— Sempre me preocupei com a qualidade da educação. Admiro o Lemann. Fizemos a mudança avaliando resultados mais à frente, em busca de uma educação que invista na individualidade da criança, num ensino mais forte aliado a tecnologias e atividades como arte e esportes.
A educação básica oferece às empresas oportunidades de ganhos em duas vias: valor da mensalidade ou Sistemas de Soluções Educacionais, as antigas apostilas de ensino, com a venda de metodologia e material didático a escolas públicas e privadas. A Eleva, segundo a Hoper, entrou no mercado de sistema educacional e comprou redes como Pensi e Elite, no Rio, e tem plataforma digital focada no Enem. O SEB foi um forte grupo na área de sistemas educacionais, mas se desfez do negócio em 2010. Em colégios, atua com marcas como Dom Bosco e Pueri Domus.