Disciplina obrigatória, marxismo

Disciplina obrigatória, marxismo

Marxismo, a disciplina na qual todo universitário chinês deve ser aprovado

EFE Javier Borràs - UOL Educação - 19/06/2016 - São Paulo, SP

Ser aprovado na disciplina obrigatória sobre marxismo é essencial para obter um titulo universitário na China, onde o socialismo teórico perde fôlego entre os jovens, mas continua sendo a base ideológica da legenda no poder, o Partido Comunista da China (PCCh).

`É chata, não é útil e é uma perda de tempo` afirmou categoricamente um estudante de primeiro ano de Guangzhou, que prefere se manter no anonimato. `Quase 99% dos estudantes pensa igual. Não tem outra utilidade que não memorizar para o exame`.

Muitos estudantes chineses ignoram esta disciplina: aceitam que devem fazê-la para terminar a universidade, mas não veem nela utilidades práticas.

Nas aulas, segundo os estudantes, os alunos prestam pouca atenção e repassam conteúdos de outras disciplinas em seus aparelhos eletrônicos, enquanto o professor explica história chinesa e ideologia marxista, conceitos com os quais os alunos estão familiarizados desde o ensino médio.

`Para ser honesta, não acredito que seja uma disciplina útil. Simplesmente é obrigatória`, opinou uma aluna de primeiro ano de uma importante universidade de Pequim, embora, em seu caso, a aprendizagem sobre teoria marxista não vá terminar tão cedo. `Quero ser parte do PCCh, portanto tenho que estudar as leituras políticas essenciais`, destacou.

Para outro estudante entrevistado pela agência de notícias Efe, Huang Yuwei, que faz mestrado na Universidade Normal de Xangai, o fator principal é o professor.

O seu, por exemplo, gera interesse entre os estudantes e Huang considera que, graças a esta matéria, agora se preocupa mais com `o que meu país está fazendo e por que` e com as mudanças sociais em processo.

Um ponto de vista com o qual concorda Irene Torca, estudante espanhola da Universidade de Finanças e Economia de Xangai. `É uma das disciplinas mais interessantes que fiz`, contou, assegurando que lhe serviu para entender melhor a sociedade chinesa: `Às vezes aprendo mais sobre China nesta aula que lendo na imprensa`.

Irene explicou que nas aulas se fomenta o debate - especialmente sobre assuntos econômicos - e há espaço para criticar à China, embora o professor lhes peça para fundamentar suas opiniões em artigos acadêmicos, com rigor.

Apesar de tudo, o conteúdo desta disciplina obrigatória é sensível: só um aluno chinês dos entrevistados quis publicar seu nome e os dois professores de uma universidade de Xangai com os quais a Efe falou também preferiram o anonimato.

Ambos acreditam que esta disciplina deve continuar sendo obrigatória e um deles considera, além disso, que o desapego dos alunos não deve ser um critério a ser levado em conta.

`Todos têm pouco interesse em disciplinas difíceis que requerem tempo e energia, como a matemática. Apesar disso, devem estudá-las`, ressaltou.

Os dois concordam que a disciplina serve para ensinar a ideologia do governo, mas não em termos doutrinários.

Os acadêmicos marxistas na China são cada vez mais raros. Segundo o jornal oficial `Global Times`, cada vez há menos pessoas com os conhecimentos essenciais de filosofia, economia e idiomas (alemão ou russo, por exemplo) para poder estudar o marxismo, mas há bastante dinheiro disponível para investir nestes estudos.

Pequim, por exemplo, lançou no ano passado o primeiro Congresso Mundial de Marxismo, com 400 acadêmicos de todo o mundo, e atualmente constrói o fundo acadêmico Ma Zang de textos sobre marxismo, com um investimento de 152 milhões de iuanes (cerca de R$ 83 milhões).

O fenômeno vai além da China: a universidade Tsinghua lançou um curso gratuito pela internet através da famosa plataforma virtual EDX, no qual - segundo dados de há um ano - 100.000 pessoas em todo o mundo estudavam `Introdução ao pensamento de Mao Tsé-tung`.

Marxistas chineses alertaram para a marginalização desta teoria nas universidades do país, em uma batalha entre a ideologia legitimada pelo partido no governo e correntes de outro tipo, sejam conservadoras liberais ou religiosas, que ganham força e questionam o relato socialista.

No começo do ano, o ministro da Educação chinês, Iuane Guiren, garantiu que os livros que promovem `valores ocidentais` ou `difamam` o PCCh não seriam aceitos nas salas de aula universitárias.

Pouco antes, a agência oficial de imprensa `Xinhua` publicou um decreto do PCCh que pedia para as universidades `fortalecer a convicção nos ideais adequados`.

A China, à sua maneira, continua sendo marxista.




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