Desigualdade no Brasil aumenta
Desigualdade no Brasil aumenta pela primeira vez em 22 anos
O indicador da desigualdade social, que estava em linha descendente há 22 anos, voltou a subir. Com o resultado, o Brasil voltou três anos no tempo e anulou a redução da desigualdade registrada em 2014 e 2015. As informações são do índice de Gini calculado pela FGV Social
A desigualdade voltou a aumentar no país. Ao atingir patamares recordes em 2016, o desemprego fez com que a disparidade da renda domiciliar per capita no Brasil registrasse o primeiro aumento em 22 anos, desde o início do Plano Real, mostra o índice de Gini calculado pela FGV Social. As informações foram divulgadas pelo jornal O Globo.
O indicador — que varia de zero a um e que, quanto mais perto de zero estiver, mais igual é a sociedade — chegou a 0,5229 no ano passado, alta de 1,6% em relação ao ano anterior. Com o resultado, o Brasil voltou três anos no tempo e anulou a redução da desigualdade registrada em 2014 e 2015.
“Além do aumento do desemprego, tem a inflação corroendo a renda média. O desemprego se tornou sério porque aumentou, mas também porque é de longa duração. A pessoa fica desempregada e demora a sair da situação”, analisa o economista Marcelo Neri, diretor da FGV Social e ex-presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
Segundo Neri, o aumento na desigualdade registrado no ano passado preocupa principalmente porque o bolo a ser dividido não só encolheu, mas murchou para os mais pobres.
Além do custo social, o economista observa que os efeitos sobre esse grupo são muito ruins para a economia, pois os mais pobres comprometem a maior parte da renda com consumo. Eles são, portanto, parte importante na demanda que tanto se espera destravar para que a atividade econômica brasileira volte a crescer.
Manuel Thedim, economista do Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade (Iets), não se surpreende com esses dados:
“Quem perde o emprego primeiro na recessão são os mais pobres e menos escolarizados, logo, o de menor produtividade. Um economista, na década de 1950, conseguiu comprovar que renda, escolaridade e produtividade têm uma correlação forte. Quem tem mais anos de estudo terá mais renda do que quem tem menos anos de estudo. Se o desemprego tivesse atingido os mais ricos, a desigualdade teria caído”.
Ele lembra que, quando esse trabalhador consegue uma recolocação em meio à crise, é em uma ocupação inferior:
“São pessoas que vão deixar, por exemplo, de ser vendedores de sapato e, para sobreviver, vão virar ambulantes. Além do desemprego, há a perda da qualidade do posto de trabalho para um grande grupo”.
Marcelo Lima de Carvalho, de 34 anos, é um desses cidadãos afetados pela queda na renda. Desempregado há quatro meses, o morador do Caju, Zona Norte do Rio, mantém a rotina de sair de casa às 5h30m, como quando trabalhava como garçom.
“Minha mulher está empregada, mas tivemos que cortar pela metade quase todas as coisas lá em casa. Cortamos TV a cabo, plano de saúde. Procuro emprego todos os dias. Passo o dia todo na rua, só paro de procurar alguma coisa lá pela 18h. Fiquei sem dinheiro, dependo dos bicos que as pessoas me arrumam, como pintor. Nessa crise, a gente aceita o que vier. Na minha família, meu primo e meus irmãos também estão sem emprego”, comenta.
Com a taxa de desemprego em 12,3%, atingindo 12,6 milhões de pessoas, difícil é não conhecer alguém nessa situação. E, quando a falta de emprego atinge um membro da família, não apenas o desempregado é afetado, mas toda a casa sente as consequências.
“Minha irmã trabalhava em limpeza e perdeu o emprego há dois meses. Ela mora comigo, meu irmão e minha mãe. Sem o salário dela, ficamos sem uma renda em casa, e isso impactou muito a ajuda à minha mãe, que tem muitos problemas de saúde — conta Pierre de Oliveira Rodrigues, de 31 anos, que trabalha em suporte técnico”.
trechos de matéria de Daiane Costa e Kátia Gonçalves do jornal O Globo