Deficiência na educação do RS
Estudo destaca deficiência na educação do Rio Grande do Sul
Números apontam recursos muitas vezes mal aplicados e resultados insatisfatórios
Problemas como salas de aula inadequadas e salas de informática ultrapassada fazem parte da rotina de quem ensina na Capital | Foto: Samuel Maciel
A educação do Rio Grande do Sul, ano após ano, mostra que precisa de atenção. Números apontam recursos muitas vezes mal aplicados e resultados insatisfatórios. Os dados chamam a atenção e revelam circunstâncias vividas diariamente nas escolas públicas. Um estudo do projeto Gestão Pública Eficaz, do Sescon/RS, em parceria com a PUCRS, mostrou que, de 2004 a 2015, o Rio Grande do Sul foi um dos estados que menos incrementou seus investimentos em Educação. Ao mesmo tempo, entre os municípios gaúchos com mais de 80 mil habitantes, Porto Alegre foi o que mais investiu na área. No entanto, Estado e Capital tiveram um desempenho pouco satisfatório.
• Por trás dos números, a realidade do dia a dia dos estudantes
O relatório utilizou valores divulgados pelo Tesouro Nacional por meio do Finbra (Finanças do Brasil) e cruzou dados com as bases do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira Legislação e Documentos (Inep) dos alunos da rede pública, que faz o cálculo conforme o aprendizado dos alunos em português e matemática na Prova Brasil e a taxa de aprovação escolar. Os números mostraram que, em 2004, o Rio Grande do Sul era o sexto Estado que mais investia em Educação, com aproximadamente R$ 4,5 bilhões. No entanto, em 2015, o valor era de R$ 4,8 bilhões, ou seja, apenas 8,2% de crescimento real. Já o Paraná, por exemplo, investiu R$ 4,07 bilhões em 2004 e passou para R$ 9,6 bilhões em 2015, aumento de 135% nestes 11 anos.
O estudo também comparou gastos e, dividindo os investimentos pelo número de matrículas na rede estadual, mostrou que o Estado foi o que menos gastou por estudante. Em 2014, os custos por aluno no Rio Grande do Sul foram de R$ 4.888,00, sendo que a média nacional foi de R$ 7.623,00. O Rio de Janeiro, por exemplo, atingiu R$ 10.458,00. Na comparação entre as notas, seguimos perdendo. Em 2005, o Estado era o quinto colocado no ranking de notas ao final do 5º ano do Ensino Fundamental, correspondente à 4ª série antes da reformulação. A média gaúcha era de 4,2 e, em 2015, foi para 5,5, ou seja, se aproximando da meta 6,0 para 2022. Mas, apesar do aumento, caiu de patamar, passando para nono colocado.
Já no 9º ano (antiga 8ª série), houve uma forte queda nas notas de todos os estados maior valor obtido foi de 4,7 e o Rio Grande do Sul seguiu sendo ultrapassado. Em 2005, ocupava a quarta colocação, com média de 3,5. Já em 2015, com média 4,0, foi para a 12ª colocação. Mas é no Ensino Médio responsabilidade do governo estadual que a situação realmente se agrava. Em 2004, o Estado, com média 3,4, perdia apenas para Santa Catarina. Em 2015, ficou com 3,3, despencando para a 14ª posição.
No que se refere às redes municipais, o estudo apontou que Porto Alegre, entre as 25 cidades com mais de 80 mil habitantes, é de longe a que mais aplicou em Educação de 2007 a 2015, ano em que gastou R$ 950,8 milhões na área. A segunda colocada, Caxias do Sul, investiu R$ 310,1 milhões. A Capital permanece como a que mais gasta quando o cálculo é feito por aluno da rede municipal. Em 2015, o gasto médio foi de R$ 19.718,00, um crescimento real de 48% desde 2007, quando a média era de R$ 13.322,00.
Quando a comparação é feita por desempenho, no entanto, mesmo gastando mais, Porto Alegre fica em último lugar ao final do 5º ano. Em 2015, a média foi de 4,6, atrás de Santana do Livramento (4,7), município que teve o menor gasto por aluno, com R$ 4.505,8. Já Ijuí, que gastou R$ 7.498,2 por aluno, ficou em primeiro lugar em desempenho, com média 6,8. Os únicos outros a passarem da média 6,0 foram Bento Gonçalves (6,3), Lajeado (6,2) e Caxias (6,0).
Ao final do 9º ano, porém, nenhum município atingiu a média adequada. Mesmo assim, Ijuí ficou com a melhor nota (5,3) e Porto Alegre conseguiu ultrapassar Alvorada (3,4), Bagé (3,6) e Pelotas (3,7), mas seguiu bastante abaixo no ranking, com 3,8. Em 2005, a nota média era de 3,2, quando ficava na frente apenas de Alvorada (3,1). Erechim e Bento Gonçalves, que são os dois municípios que mais investem por aluno depois da Capital (R$ 10.188,3 e R$ 9.797,7), conseguem justificar os gastos em rendimento. Isso porque, nas notas do Ideb, Erechim ficou na quarta colocação ao final do 5º ano (6,2) e em segundo lugar ao final do 9º ano (5,0), e Bento Gonçalves ficou em segundo nas duas, com 6,3 no 5º ano e 5,0 no 9º.
Todos esses números podem sugerir variadas interpretações. Há os que defendam a compra de vagas em escolas privadas, os que critiquem a gestão do ensino público e os que entendem que não se pode comparar desempenho entre ensino público e privado porque, muitas vezes, abrangem realidades sociais muito diferentes. Além disso, ainda existem diferentes ideias sobre onde os recursos devem ser aplicados prioritariamente.
Crítica à gestão pública
Para um dos responsáveis pela condução do estudo, o doutor em Economia e professor da Escola de Negócios da PUCRS, Gustavo Moraes, o que mais chamou atenção no levantamento foi a questão dos municípios. “Nos municípios do Rio Grande do Sul, a rede de Educação tem um custo médio por aluno muitas vezes igual ou superior à rede privada e, como nós sabemos, não tem desempenho equivalente. Esse foi o dado mais surpreendente. Eu até imaginava uma situação dessas, mas não generalizada”, afirma. Ele observa ainda que se esperava que Porto Alegre, por ser a Capital e ter um nível cultural e número de profissionais mais elevado, tivesse desempenho melhor. Mas, pelo contrário, até mesmo localidades do Interior conseguiram ser superiores nas avaliações, mesmo investindo menos.
O professor acha interessante comentar a relação entre investimentos e resultados. A infraestrutura, de acordo com Moraes, é um gasto que comprovadamente traz mais retornos para a educação do que outros. Segundo ele, embora os salários dos professores sejam reduzidos e devam ser reajustados, há uma necessidade muito grande neste outro aspecto, que não tem aparecido entre as prioridades. Mesmo que exista uma diferença nos números entre Porto Alegre e o Estado, os resultados são, sempre, muito semelhantes. “Existe um contraste muito grande, mas a tônica da mensagem é a mesma: estamos gastando muito e desempenhamos pouco. Não é que nós necessitamos de mais gastos, nós precisamos realocar os gastos.”
É importante ressaltar, ainda conforme o professor, os bons exemplos trazidos pelo estudo. São municípios que apresentam investimento baixo por aluno e que, mesmo assim, conseguiram alto rendimento. É o caso de cidades menores, como Campo Bom e Guaporé, que tiveram gasto médio, de 2011 a 2015, de R$ 6.048,00 e R$ 6.873,00, e nota média no Ideb de 6,8 e 6,6 no 5º ano, por exemplo.
Para o presidente do Sescon/RS, Diogo Chamun, a Educação estadual é a que mais chama a atenção, pois, na avaliação dos três anos, decresceu na comparação com outros estados. Ao analisar os dados, diz que o montante de recursos aplicados não quer dizer nada se os resultados forem fracos. Este é o 35º relatório produzido pela entidade, sempre com foco no orçamento, na arrecadação e na aplicação da verba pública.
A educação é o tema que o Sescon considera central para a saída das crises pelas quais o país passa, como política, econômica e até ética. Mas, seja nessa ou em qualquer outra área, entende que deve haver mais avaliação e fiscalização. “Hoje a estrutura pública no Brasil não ajuda na questão do resultado, porque há uma estabilidade do servidor. Não há meritocracia, simplesmente os servidores são contratados com garantia de emprego para cumprir sua obrigação. Então, a gente fica dependendo de um perfil empreendedor dos servidores para fazer coisas diferentes. Eu acho isso uma dinâmica muito ruim”, afirma o presidente ao questionar a estrutura pública como um todo