Corte no orçamento
Corte no orçamento prejudica metas educacionais e o acesso ao ensino
Brasil precisa universalizar educação infantil em 2016, porém, 600 mil estão fora da escola. Já nas universidades, programas de pós-graduação sofreram um contingenciamento de 75% neste ano
São Paulo - Na contramão do lema "Pátria Educadora", os cortes orçamentários feitos ao longo de 2015 já estão colocando em risco algumas metas educacionais e provocando retrocesso no acesso ao ensino.
Maria Rehder, coordenador de projetos da ONG Campanha Nacional pelo Direito à Educação, informa, por exemplo, que o Brasil precisa universalizar o acesso à educação infantil até o final deste ano (Emenda Constitucional 59), o que, para ela, será bem difícil de acontecer dada a menor disponibilidade de caixa da União.
"Quando o governo iniciou o seu processo de ajuste fiscal, o primeiro corte foi no MEC, impactando recursos para a construção de creches e melhora dos equipamentos escolares", afirma. "Mas, para universalizar o acesso, é essencial que a infraestrutura escolar seja garantida", diz.
De acordo com dados mais recentes da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD, 2014), o contingente de crianças entre quatro e cinco anos fora da escola no Brasil chega a 600 mil. Especialistas destacam que esse número é bastante passível de alteração, já que todos os anos crianças nascem e passam de faixa etária.
Mariana comenta ainda que, a partir da Emenda Constitucional 59, o Brasil ampliou o ensino obrigatório da faixa de seis a 14 anos para quatro a 17 anos. Nos dados da PNAD, a quantidade de crianças e jovens fora da escola localizadas nesta última faixa alcança 2,8 milhões.
Já o professor Fernando Coelho, do curso de gestão de política pública da Universidade de São Paulo (USP) chama a atenção para o desestímulo à pesquisa e dificuldade de acesso à universidade verificados após os cortes orçamentários de R$ 10,5 bilhões no MEC.
Ele conta que, na USP, as bolsas de permanência estudantil caíram 20%. "Sem essa ajuda de custo, o aluno de baixa renda não tem condições de se sustentar na universidade. Isso já está acontecendo e vai contra todo o processo de avanço que ocorreu na última década com as políticas de incentivo de acesso e permanência estudantil", considera.
Corte na pesquisa
Fernando Coelho diz ainda que, em 2016, houve um contingenciamento de 75% nos recursos destinados para cada programa de pós-graduação nas universidades públicas. O órgão responsável por repassar a verba é a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).
De acordo com o professor, cada programa de pós-graduação nas universidades públicas recebem cerca de R$ 20 mil por ano para fazer pesquisa, participar de congressos no País ou no exterior, organizar seminários, traduzir artigos, etc. Neste ano, esses receberam apenas 25% do valor.
"Não há previsão se iremos receber o restante. O governo só empenhou 25%. Isso atrapalha muito, porque não tem dinheiro pra enviar aluno para congressos internacionais, por exemplo. É um desincentivo à pesquisa", relata o professor.
Ele informa ainda que, em 2015, o governo federal liberou a maior parte dos recursos para pós-graduação somente no final do ano. "Quando o dinheiro chega tarde, a execução orçamentária se desorganiza", ressalta, lembrando que, ao final do ano, uma boa parte dos congressos já aconteceu.
Ao mesmo tempo que a pesquisa passa por uma escassez de investimentos no Brasil, cenário macroeconômico está fazendo com que os alunos se refugiem na universidade diante da falta de emprego.
"Quando a taxa de desemprego fica alta, é comum os alunos buscarem o mestrado e o doutorado. Aumentou bastante a demanda pela pós-graduação. Na época em que o mercado de trabalho estava bom, os estudantes preferiam trabalhar a fazer uma pesquisa", observa Fernando Coelho.
O professor lista outros problemas como o congelamento dos concursos públicos nas universidades estaduais para preencher vagas dos professores aposentados. "Todos esses problemas provocam queda na qualidade do ensino".
Maurício Fronzaglia, professor de economia do Mackenzie, acrescenta ainda que esse cenário implica ainda em uma perda da qualidade da mão de obra, no longo prazo.
Maria cita outros riscos ao financiamento da educação, como a intenção do governo de elevar a Desvinculação de Receitas da União e a crise do petróleo. Segundo informações da ONG, a destinação dos royalties de petróleo e pré-sal poderiam gerar R$ 66 bilhões à educação até 2024. Porém, a crise no setor pode diminuir o montante estimado.
Paula Salati