Conselhos escolares
Conselhos escolares: espaço de reflexão e democratização
(Crédito: Shutterstock)
Organizada dentro de um contexto democrático e participativo, a escola torna-se mais capaz de responder aos anseios da sua comunidade e daquela na qual se insere. No contexto escolar, as vivências democráticas podem se materializar a partir de instâncias que tenham como prerrogativa a participação e organizem o debate coletivo sobre temas que constituem esse espaço.
É dentro desse contexto que se inserem os conselhos escolares, órgãos colegiados que têm como função debater, acompanhar e deliberar sobre questões político-pedagógicas, administrativas e financeiras das escolas. Eles devem ser formados por atores que representem a comunidade escolar, tais como professores, funcionários, alunos, familiares e comunidade.
Amparo legal
A existência dos conselhos escolares atende a alguns preceitos legais existentes. A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 205, discorre sobre a educação ser promovida e incentivada com a colaboração da sociedade; no 206, assegura o princípio da gestão democrática como base do ensino.
A Lei de Diretrizes e Bases (Lei nº 9394, de 1996), por sua vez, coloca a articulação com as famílias e com a comunidade como uma das incumbências dos estabelecimentos de ensino (artigo 12); reconhece a colaboração dos docentes nas atividades de articulação da escola com as famílias e comunidades (artigo 13); por fim, possibilita aos sistemas de ensino definirem as normas da gestão democrática. Também o Plano Nacional de Educação (PNE) traz em sua meta 19 a ideia de assegurar as condições para a efetivação da gestão democrática.
Histórico
Até a década de 1960, os conselhos escolares existentes nas escolas estaduais e municipais tinham caráter consultivo e não eram paritários, ou seja, não eram compostos por um ou dois representantes que compunham a comunidade escolar. Esses atores até apareciam entre as composições, mas em minoria.
Em 1985, com a aprovação da Lei Complementar nº 444 que dispunha sobre o Estatuto do Magistério Paulista e que fixava a partir de seu artigo 95 o caráter deliberativo dos conselhos é que o modelo se amplia pelo país.
Atualmente, dados do PDDE Interativo – ferramenta de apoio à gestão escolar desenvolvida pelo Ministério da Educação (MEC), e que pede que as escolas preencham voluntariamente um cadastro, sinalizam 76 mil unidades com a instância ativa. Também somam mais de 549 mil conselheiros.
O papel dos conselhos escolares
Efetivar as ações que cabem dentro de um conselho escolar, no entanto, passa por garantir a representatividade da comunidade escolar em meio a tomada de decisões da escola, e também qualificar essa atuação, garantindo a legitimidade da instância e portanto das diretrizes da instituição.
É com o objetivo de apoiar estados e municípios na implementação e consolidação destas políticas que surge em 2004 o Programa Nacional de Fortalecimento dos Conselhos Escolares. A iniciativa, de âmbito federal, vem atuando em três frentes: elaboração de material didático, formação presencial e formação a distância.
Segundo o coordenador do programa, Roberto Junior, a ideia da iniciativa é agregar aos conselhos escolares mais do que um papel fiscalizador, de acompanhar os recursos dentro da escola, mas o de participar da elaboração, do dia a dia da escola. “Desde saber como chega o dinheiro na unidade, até saber como e com o que ele vai ser gasto”, declara.
O programa atua diretamente com a formação de técnicos da secretaria e conselheiros, buscando pautar temas que devem ser debatidos no âmbito da instância.
Entidades democráticas
Na Escola de Educação Básica Saad Antônio Sarquis, localizada no território de Crisanto Rei, em Chapecó (SC), o conselho escolar nasce praticamente junto com a escola, em 1982, como conta o diretor da instituição Paulo Sérgio Paz de Oliveira.
A instância que hoje conta com 40 cadeiras, é reconhecida como uma das entidades democráticas da instituição, ao lado da Associação de Pais e Mestres (APM) e grêmio estudantil.
Paulo reconhece algumas etapas importantes na consolidação do conselho participativo, tal como é hoje. Como primeiro passo, elenca a importância da formação aos técnicos das secretarias e conselheiros, como uma forma de explicitar aos diversos atores como se dá a contribuição de cada um. Depois, cita a mobilização constante para que a comunidade e a escola entendam a importância de trabalharem juntas. “É preciso superar a ideia de que familiares entram na escola apenas para buscar boletim do filho”, anuncia.
Outra questão, para o gestor, é superar o estigma de que um conselho escolar pode tirar o poder de um diretor. “A meu ver, ele acaba por legitimar as minhas decisões, agora pactuadas com os representantes da comunidade escolar”, percebe. Para ele, a atuação do conselho vem contribuindo com a força e coesão da Saad Antônio Sarquis.
“Um exemplo é quando recebemos o dinheiro do PDDE. É claro que quem está dentro da escola já tem uma intencionalidade com o recurso, mas é necessário ter a aceitação da maioria”, coloca o gestor.
Uma agenda de superações
Por outro lado, a formatação de conselhos escolares na perspectiva democrática e participativa ainda requer algumas superações. A obrigatoriedade do órgão colegiado nas redes educacionais, muitas vezes, faz com que ele exista de maneira formal apenas, com pouca ou nenhuma representatividade dos diversos segmentos da comunidade escolar.
O professor de Sociologia da Educação na Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (FEUSP), Elie Ghanem, entende que essa situação se explica em partes por um conjunto de informações que ainda não é partilhado na comunidade escolar, ficando restrito à direção escolar.
Outra análise do pesquisador recai sobre as próprias eleições que embasam a composição dos conselhos. Embora se espere que a eleição dos integrantes aconteça em prol de uma representatividade em cada segmento, com respeito ao voto secreto, o mais comum é que sejam feitas mobilizações com algumas pessoas para ocuparem essas cadeiras.
Ainda sob sua leitura, é necessário que os conselhos escolares se proponham também como locais de debates públicos, para que possam ser inseridos na pauta temas de interesse de quem circula, estuda ou trabalha na escola. “Hoje, só se fala em educação na escola como educação escolar, sendo o tema reduzido à modalidade convencional do ensino”, enfatiza.
Para Elie, a solução passa menos pela formalização de mecanismos e mais por uma outra perspectiva educacional do que é essa atividade participativa na escola. “É necessário modificar as relações mais comuns nesses espaços, as hierarquizadas, dando espaço ao diálogo, não só para que a gente se entenda mas para que possamos tomar decisões coletivamente. Para que haja, enfim, a identificação dos consensos e dissensos, que é sobre onde qualquer instância de participação se apoia”, defende.
Fonte: Centro de Referências em Educação Integral