Bullying na escola
Agressões pioraram nos últimos anos?
Do UOL, em São Paulo
Problema antigo
As agressões e intimidações do tipo sempre existiram no ambiente escolar, mas algumas pessoas têm a impressão de que os casos de bullying estão mais comuns. O fato é que, desde que o termo caiu no uso popular, todos passaram a ter mais consciência dessa forma de violência. Talvez venha daí a sensação de que o problema está mais frequente.
Essa percepção está equivocada e não há dados científicos que comprovem o crescimento de casos de bullying nas escolas, segundo Nelson Pedro da Silva, doutor em psicologia escolar pela USP (Universidade de São Paulo) e professor da Unesp (Universidade Estadual Paulista).
A mídia e o uso da internet é que potencializam a propagação das informações sobre esse tipo de agressão e a divulgação das consequências para a vítima - consequências bem graves, em alguns casos, de acordo com a doutora em educação Miriam Abramovay, coordenadora da área de Juventude e Políticas Públicas da FLACSO (Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais).
"Durante anos nem se falava sobre isso, mas elas [as mídias] contribuíram para disseminar o termo bullying e aí ele se tornou usual, corriqueiro. Hoje para muitos tudo é bullying, o que não é verdade. É preciso compreender a violência escolar como um todo", destaca Abramovay.
Afinal, quando o bullying existe?
Há sofrimento para a vítima
Há violência física/psicológica
A intimidação é constante
Há relação desigual de poder
Não há motivação evidente
Com a palavra... as vítimas
Baleia, feia, horrorosa
"Sempre fui gorda e era agredida verbalmente com aqueles apelidos: baleia, feia, horrorosa. Era a última a ser escolhida [nas aulas de educação física] e as meninas normalmente brigavam para não me ter no time. Havia também o costume de sacanear qualquer colega que demorasse muito para voltar do banheiro e isso fez com que eu desenvolvesse crises de ansiedade. Ficava horas no banheiro por achar que iria passar mal na sala e quando voltava, era sacaneada em dobro. Eu me sentia a pior pessoa do mundo e a pior coisa era que eu dava crédito a todos os agressores e achava que eles estavam realmente certos.
"Pensei em me enforcar na época"
"Sempre sofri bullying por ser gorda, mas as lembranças mais marcantes são as da 3ª série (hoje 4º ano). Eu tinha oito anos. Estudei em um mesmo colégio da 3ª a 7ª série e o bullying só parou quando eu mudei de colégio. Sempre fui gorda e era agredida verbalmente por isso com aqueles apelidos como baleia, feia, horrorosa etc. Era um grupo de colegas que de alguma maneira agredia e controlava a minha vida. Eles xingavam e reparavam em tudo o que eu fazia para xingar mais. Eu sempre fui uma aluna mediana. Tímida talvez, mas a timidez que eu tinha não era com os professores e sim com os alunos pelo medo de suas reações comigo.
Havia também o costume de sacanear qualquer colega que demorasse muito para voltar do banheiro e isso fez com que eu desenvolvesse crises de ansiedade. Quando eu tinha que fazer cocô, eu sabia que não podia demorar porque seria sacaneada quando voltasse. Aí em pouco tempo isso se tornou um problema: eu passei a ter dores de barriga por ter medo de ter dor de barriga. Ficava horas no banheiro por achar que iria passar mal na sala e quando voltava, era sacaneada em dobro. Fiquei conhecida na escola. Os inspetores batiam na porta para que eu saísse e tudo aquilo só me angustiava mais.
Também sofria na educação física. Era um colégio em que muitos alunos eram bons nos esportes e eu era péssima. Era a última a ser escolhida e as meninas normalmente brigavam para não me ter no time.
Eu me sentia a pior pessoa do mundo e a pior coisa era que eu dava crédito a todos os agressores e achava que eles estavam realmente certos. Pensei em me enforcar na época. Minha mãe soube disso muito tempo depois, quando eu já tinha dezessete anos, quando leu meu diário e se sentiu muito culpada.
Minha família era constantemente chamada no colégio porque me tornei bastante agressiva, chegando a agredir fisicamente alguns colegas. Também falava muitos palavrões e xingava muito. Era um colégio de padres e ali eu fui colocada na posição de problema. O problema era eu e não o que faziam comigo que tivesse engatilhado aquele comportamento. Aí eu era chamada para conversar com os inspetores, os psicólogos do colégio etc. Inclusive, os meus melhores amigos nessa época eram os inspetores do colégio.
Hoje considero completamente superada [a consequência do bullying]. Só enfrentei o problema aos dezessete anos, quando, em depressão, minha mãe me levou para fazer terapia. O que me ajuda até hoje e o que tornou a minha autoestima indestrutível foi entender, finalmente, que ninguém tem o direito de dizer o que você é, ou o que parece, muito menos de julgar se você é bonito ou feio. Aprendi a não acreditar no que as pessoas dizem, aprendi a gostar de mim exatamente pelo que sou e não deixar ninguém interferir nisso.
Não acreditem no que dizem. Tentem ignorar e se defender da maneira que puderem. Não abaixem a cabeça, não se deixem ser massacrados pela atitude do outro. Normalmente quem pratica bullying é inseguro e precisa de alguém menor para humilhar. Portanto, não deixem que ninguém faça você se sentir mal porque absolutamente ninguém, nem seu pai nem sua mãe, tem o direito de dizer quem você é ou julgar sua beleza."
Lídia Orphão de Souza, 30 anos
http://educacao.uol.com.br/especiais/bullying.htm#capa/1