Brincadeiras de antigamente

Brincadeiras de antigamente

Ensinar brincadeiras de antigamente virou trabalho 

Hoje (28/5) é o dia Internacional do Brincar, mas quem ainda brinca de roda, bumba meu boi e pião nas grandes cidades brasileiras? O resgate dessas e outras brincadeiras de antigamente, repassadas naturalmente às crianças pelas famílias durante gerações, é o trabalho de uma startup preocupada em disseminá-las na cidade de São Paulo. O objetivo, segundo os criadores da Festa de Rei – Brincadeiras Culturais, é preservar a cultura tradicional brasileira a partir de atividades livres, em contato com a natureza e que estimulam a descoberta de novas experiências.

A iniciativa foi idealizada por uma dupla apaixonada por cultura popular, a administradora Beatriz Zulueta, 29, e o professor de capoeira Juarez Ferreira, 33. Eles começaram, um ano e meio atrás, promovendo oficinas gratuitas de contação de histórias, projetos musicais e atividades lúdicas. “Queríamos ver qual era a aceitação desse tipo de atividade e descobrimos que havia muito interesse de adultos e crianças”, conta Beatriz, que há um mês deixou o emprego em uma editora para se dedicar exclusivamente à Festa de Rei.

O negócio da Festa de Rei, segundo os fundadores, atende a uma demanda moderna, principalmente em famílias urbanas, em seus apartamentos. “Os pais não estão mais conseguindo estimular essas brincadeiras e resolvemos fazer isso para as crianças”, explica o professor Juarez que também atua como educador no colégio Invenções e no projeto social Sambaqui – Chão do Meu Terreiro.

crédito Michel Swan/ Flickr

 

A necessidade de buscar a essência do brincar na sociedade contemporânea tem sido o cerne de diversas discussões, principalmente quando se trata de atividades externas e que envolvem desenvolvimento motor e muita criatividade. O Porvir já ouviu de especialistas que estimular essas atividades é parte importante do aprendizado infantil. Leia entrevistas com Marcos Ferreira Santos, professor de Educação da USP e com a educadora Renata Meirelles.

Preocupada em promover o livre brincar, a empresa promove apresentações e oficinas de dança, teatro, leituras de poesia, brincadeiras de roda, números de circo realizados em praças, parques, livrarias, editoras e festas. Um de seus principais apoiadores, a Casa do Brincar, localizada no bairro Pinheiros, é um dos locais onde os serviços de brincadeiras também são pagos.

Empresas ou famílias podem contratar a Festa de Rei para promover atividades no local ou em outros buffets, mas mesmo nessas ocasiões Beatriz e Juarez consideram que o trabalho tem um papel social. “Não somos recreadores, mas facilitadores de uma vivência. Procuramos envolver a família e difundir valores dos quais as crianças estão muito afastadas”, explica Beatriz.

Encontro

Para julho, os profissionais da brincadeira preparam o que consideram o evento mais importante que já fizeram, o 1o Encontro Criança e Cultura, Todo Menino é um Rei, no Parque Novo Mundo, na zona Norte da capital paulista. Uma equipe de cerca de 15 profissionais promoverá números musicais (coco, forró, cavalo marinho, ciranda), de circo (equilibrismo, perna de pau, malabarismo, brincadeira em tecido e palhaço), lenda e história (conto tradicional com utilização de bonecos de manipulação), além de atividades com instrumentos percussivos, brincadeiras tradicionais (pula saco, corrida do limão, chinelão, amarelinha, pega-pega),  oficinas de brinquedos artesanais e grafite.

Para viabilizar esse encontro, para o qual a Festa de Rei espera reunir 200 pessoas, foram arrecadados R$ 5.000 via financiamento coletivo e outras doações. A ideia é que seja o primeiro de outros que percorrerão a periferia de São Paulo, mas para isso a empresa ainda busca outras parcerias e verbas públicas. “Queremos levar a cultura de raiz para o maior número de crianças”, diz Beatriz.

‘Inovar é resgatar as brincadeiras tradicionais’

Ferramentas tecnológicas têm tomado cada vez mais conta das salas de aula e se tornado sinônimos de inovação e modernidade na educação. Recentemente, o governo federal destinou R$ 180 milhões à distribuição de tablets para professores do ensino médio. Mas quando o assunto é educação na primeira infância, como inovar? Especialistas nessa etapa da vida defendem que tempo para brincar livremente é importante para o aprendizado.

“Curiosamente, o que tem de mais inovador atualmente são as brincadeiras tradicionais. Hoje, as escolas têm pouco espaço para que as crianças brinquem. Embora as pessoas tendam a ver a brincadeira como um lugar à parte, é justamente nestes momentos que acontece boa parte do processo de ensino e aprendizagem”, afirma Marcos Ferreira Santos, professor de Educação da USP (Universidade de São Paulo) e membro da Aliança pela Infância.

Para o especialista, a brincadeira de uma criança equivale, por exemplo, ao trabalho de um cientista. “Imagine um cientista em seu laboratório, enquanto desenvolve um experimento químico. Ele tem que imaginar situações, ver se aquilo funciona ou não”, compara. “Por meio das brincadeiras, as crianças estão aprendendo, experimentando coisas, descobrindo outras possibilidades.”

“Às vezes, algo é inovador porque abre espaço para essas brincadeiras tradicionais. Quanto mais espontânea, mais verdadeiro é a aprendizagem”.

Mexer na areia, tomar banho de mangueira, se sujar com lama, correr, brincar ao ar livre e ter contato com os animais são algumas das atividades consideradas importantes para o processo de aprendizagem infantil.

Segundo Santos, em geral, os adultos reconhecem apenas a sala de aula como espaço para aprender. “O problema em muitas escolas é o curto intervalo para atividades livres, normalmente de 15 a 20 minutos.” Ele acredita que uma das alternativas para inovar é ampliar  esse tempo: “Às vezes, algo é inovador porque abre espaço para essas brincadeiras tradicionais. Quanto mais espontânea, mais verdadeira é a aprendizagem”.

A fala de Santos é reforçada também por Gandhy Piorski, especialista em brincar que discursou na Premiação Programa Pelo Direito de Ser Criança, que condecorou escolas brasileiras que reconhecem a importância do brincar e do aprender pela experiência.   “Diante do universo que temos hoje, a proposta pedagógica deve ter no seu cerne o respeito ao movimento da criança. ”   

Os dois especialistas fizeram parte do corpo de jurados do prêmio. O Porvir esteve presente no evento e conheceu alguns projetos, leia a matéria aqui.

http://porvir.org

 




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