BC atua em leniência
MPF deve ir ao Supremo contra MP que autoriza BC a atuar em leniência
Medida provisória impediria MPF de denunciar bancos
Instituições poderiam fechar acordos só com BC e CVM
A Estátua da Justiça, em frente ao STF Felipe Sampaio/SCO/STF - 6.out.2011
ANDRÉ SHALDERS 13.jun.2017
Um grupo de procuradores do MPF (Ministério Público Federal) estuda ir ao STF (Supremo Tribunal Federal) para tentar barrar a medida provisória 784 de 2017. O texto autoriza o Banco Central a fechar acordos de leniência com empresas e dirigentes do sistema financeiro, sem passar pelo crivo do Ministério Público.
A medida provisória também permite ao Banco Central manter em sigilo as informações reveladas pelas instituições financeiras, com o objetivo declarado de evitar choques no mercado.
Os procuradores podem ingressar com um questionamento no STF sobre a constitucionalidade da medida provisória, editada por Michel Temer no dia 8 de junho deste ano. No jargão, o instrumento é conhecido como Adin (ação direta de inconstitucionalidade).
O principal argumento é o de que, ao excluir o MPF, a medida “blinda” os bancos e seus dirigentes de uma possível denúncia e de um processo. “[O Poder Executivo] teria o poder de arquivar investigações administrativas sem que o MP sequer tenha conhecimento delas”, diz um procurador que cuida do tema.
Também causa desconfiança no Ministério Público o fato da medida provisória ter coincidido com as negociações para a delação do ex-ministro Antonio Palocci. O petista deve citar instituições financeiras em seu acordo.
Há questionamentos ainda sobre a forma como o texto foi enviado ao Congresso. O procurador Carlos Fernando dos Santos Lima publicou ontem artigo criticando duramente a medida.
A matéria chegou ao Congresso na semana passada. Aguarda neste momento a criação de uma comissão especial com deputados e senadores, onde será votada.
“Estamos estudando [ir ao Supremo]. Em princípio, a ação cabível seria uma ADI. A Constituição atribui ao MP a titularidade da persecução penal (art. 129, I). Isso significa, entre outras coisas, que só o MP pode avaliar fatos para extrair a opinião sobre a possível existência de crime e levá-la ao Judiciário. É o que se chama, no jargão, de ‘opinio delicti’. Uma MP não pode subtrair esse exame do MP em uma negociação do Executivo, que teria o poder de arquivar investigações administrativas sem o MP ter sequer conhecimento delas”, diz ao Poder360 um procurador ligado ao caso.
BANCO CENTRAL: MP NÃO TEM A VER COM DELAÇÕES
O Banco Central publicou nota na 2ª (12.jun.2017) dizendo que a edição da MP não tem relação com “boatos de delações” que poderiam citar bancos. Diz ainda que a medida não acaba com a obrigação do BC de comunicar “qualquer indício de crime” ao MPF.
Leia a abaixo a nota completa do Banco Central, enviada ao Poder360 hoje (13.jun.2017):
“1. A Medida Provisória 784 aperfeiçoa os instrumentos punitivos de natureza administrativa a cargo do Banco Central (BC) e da Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Em nada altera ou interfere na capacidade de investigação e de comprovação de ilícitos penais do Ministério Público. Tampouco altera o dever legal do BC e da CVM de comunicar indícios de crime ao MPF, previsto no art. 9º da Lei Complementar 105.
2. A possibilidade de acordo administrativo de leniência é apenas um dos vários aspectos do novo marco legal punitivo do Sistema Financeiro. A MP 784 trata de diversos aspectos da legislação punitiva do sistema financeiro, como a definição do processo administrativo em meio eletrônico, valores de multas, inabilitações, cassação de autorização para funcionar, termos de compromisso e a definição de irregularidades administrativas: são 17 tipos de irregularidades, como, por exemplo, realizar operações em desacordo com as normas, colocar embaraço à fiscalização do BC ou da CVM, desviar ou se apropriar indevidamente de recursos de clientes ou de terceiros, infringir normas sobre capital e limites operacionais etc.
3. O acordo de leniência refere-se tão somente a irregularidades administrativas das instituições financeiras e não penais, que continuarão a cargo do Ministério Público Federal (MPF). A MP não versa sobre questão penal da alçada de atuação do MPF (corrupção, lavagem de dinheiro, etc.).
4. Eventual sigilo sobre matéria administrativa da competência do BC não afasta a obrigação de o BC comunicar todo e qualquer indicio de crime ao MPF e a outros órgãos competentes, conforme previsto no art. 9º da Lei Complementar 105.
5. A proposta de atualização vem de uma recomendação do G20 para os Bancos Centrais e está sendo discutida amplamente desde o ano de 2012. Em dezembro do ano passado, esse projeto foi amplamente anunciado e divulgado na Agenda BC+. Portanto, a MP não tem relação com boatos de delações que surgiram a posteriori e cujo conteúdo é desconhecido.
6. A urgência da medida decorre da avaliação do Brasil, no âmbito do Financial Sector Assessment Program (FSAP), que começa no próximo mês, julho de 2017. 7. O BC está à disposição do Congresso, do MPF e de outras entidades para debater e aperfeiçoar o conteúdo da MP”.
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