Ameaçados de extinção

Ameaçados de extinção

Conheça 11 projetos científicos ameaçados de extinção pelo governo Sartori

A Seção de Paleontologia do Museu de Ciências Naturais possui uma coleção de 15 mil espécies. “O que mais nos assusta é o que vai acontecer com todo esse material", diz a paleontóloga Ana Maria Ribeiro. (Foto: Maia Rubim/Sul21)

A Seção de Paleontologia do Museu de Ciências Naturais possui uma coleção de 15 mil espécies. “O que mais nos assusta é o que vai acontecer com todo esse material”, diz a paleontóloga Ana Maria Ribeiro. (Foto: Maia Rubim/Sul21)

Marco Weissheimer

A Fundação Zoobotânica do Rio Grande do Sul é uma das principais entidades responsáveis pela elaboração da lista de espécies da fauna e da flora ameaçadas de extinção no Estado. Por uma ironia perversa motivada por uma escolha do governo José Ivo Sartori (PMDB), a própria Fundação ingressou numa lista de extinção, juntamente com outros órgãos públicos responsáveis pela produção de conhecimento no Estado. Mas não é apenas a Fundação que está ameaçada de extinção. O que boa parte da população não sabe é que a instituição abriga importantes pesquisas e projetos científicos reconhecidos nacional e internacionalmente que passaram a fazer também das espécies ameaçadas de extinção.

Em agosto de 2015, ao apresentar o documento da Fase 3 do “ajuste fiscal gaúcho”, o governador Sartori falou que iria “fazer o que precisa ser feito para um Rio Grande do Sul sustentável”. Paradoxalmente, uma das medidas apresentadas para garantir um “RS sustentável” foi a extinção de uma fundação que se dedica justamente a defender e promover a sustentabilidade. O “sustentável” de Sartori, neste caso, não tinha nada a ver com a questão ambiental, mas sim com um regime de “austeridade financeira”.

Na contramão do que ocorre nos países mais avançados do mundo, esse conceito de modernidade abre mão da ciência como um espaço e instrumento para a promoção de desenvolvimento humano, econômico e social. O objetivo central da Fundação Zoobotânica é a promoção e conservação a biodiversidade no Rio Grande do Sul. Para isso, conta com um jardim botânico, um parque zoológico e um museu de ciências naturais, que atuam nas áreas de pesquisa, educação ambiental, conservação e lazer. A instituição mantem coleções científicas de plantas e animais, atuais e fósseis, que subsidiam pesquisas realizadas por especialistas do Brasil e do Exterior.

Para o governador Sartori, porém, extinguir essa instituição é uma condição para a “modernização administrativa do Rio Grande do Sul”. Conheça alguns dos projetos científicos ameaçados de extinção no Estado em nome dessa “modernização”:

O Jardim Botânico possui estufas com coleções de bromélias, orquídeas, cactos, suculentas e outras plantas, que são acessadas por pesquisadores do Brasil e do Exterior. (Foto: Maia Rubim/Sul21)

O Jardim Botânico possui estufas com coleções de bromélias, orquídeas, cactos, suculentas e outras plantas, que são acessadas por pesquisadores do Brasil e do Exterior. (Foto: Maia Rubim/Sul21)

Conservação de espécies vegetais nativas do RS, especialmente aquelas ameaçadas de extinção

Instalado em uma área de 39 hectares, o Jardim Botânico é uma coleção viva de plantas nativas do Rio Grande do Sul e também de outras regiões. Cada exemplar é identificado, catalogado e monitorado durante seu crescimento e vida no parque. O Brasil tem 82 jardins botânicos sendo que, deste total, apenas quatro tem conceito A. Um deles é o da Fundação Zoobotânica. A conservação dos ecossistemas do Estado é prioridade para o Jardim Botânico. Grande parte da sua área é ocupada por espécies representantes dos principais ecossistemas florestais do Estado.

Educação ambiental para estudantes e professores

A Fundação recebe cerca de 70 mil visitantes por anos, especialmente estudantes de escolas que aprendem sobre a flora nativa do Estado e participam de atividades de educação ambiental. Os professores dessas escolas também recebem formação ambiental. Em 2003, o Jardim Botânico foi decretado patrimônio cultural do Estado.

Coleções de plantas envasadas

O Jardim Botânico possui estufas com coleções de bromélias, orquídeas, cactos, suculentas e outras plantas, que são acessadas por pesquisadores do Brasil e do Exterior. “Cada uma dessas coleções é uma biblioteca, um registro da história da biodiversidade do nosso Estado. Além de cuidar dessa biblioteca, atendemos também demandas da própria Sema (Secretaria Estadual do Ambiente), fazendo planos de manejo de unidades de conservação”, relatam as biólogas Natividad Fagundes e Priscila Porto Alegre Ferreira, da Seção de Coleções da Fundação.

"Cada uma dessas coleções é uma biblioteca, um registro da história da biodiversidade do nosso Estado", diz a bióloga Natividad Fagundes. ( Foto: Maia Rubim/Sul21)

“Cada uma dessas coleções é uma biblioteca, um registro da história da biodiversidade do nosso Estado”, diz a bióloga Natividad Fagundes. ( Foto: Maia Rubim/Sul21)

Plantas raras endêmicas ou ameaçadas de extinção do RS

Natividad Fagundes e Priscila Ferreira destacam também ao projeto que envolve a conservação de plantas raras endêmicas (que ocorrem apenas em um determinado local) ou ameaçadas de extinção no Rio Grande do Sul. Em 2002 foi inaugurada no Jardim Botânico uma coleção de ”Espécies raras, endêmicas ou ameaçadas de extinção do Rio Grande do Sul”, onde estão plantadas árvores como a Callisthene inundata, espécie rara e endêmica que é encontrada apenas no Vale do Rio das Antas.

Coleção de plantas medicinais

O Jardim Botânico também abriga uma coleção de plantas medicinais com cerca de 200 espécies, entre nativas e exóticas. Essa coleção faz parte de um projeto de constituição de uma cadeia produtiva de plantas medicinais no Estado. Ela já fornece mudas dessas plantas para hortas e postos de saúde. Cerca de 25% dos fármacos empregados hoje derivam de produtos naturais, principalmente de plantas.

Banco de sementes

Criado em 1999, desenvolve trabalhos de pesquisa com espécies nativas do Estado, envolvendo germinação e armazenamento de sementes, propagação in vitro e desenvolvimento de mudas, que são vendidas ao público. Além disso, realiza pesquisas em estudos embriológicos, conservação de germoplasma, propagação vegetal e cultivo de tecidos vegetais.

O Museu de Ciências Naturais conta com coleções de insetos, aranhas, répteis, peixes e várias outras espécies que são um registro da biodiversidade do RS. (Foto: Maia Rubim/Sul21)

O Museu de Ciências Naturais conta com coleções de insetos, aranhas, répteis, peixes e várias outras espécies que são um registro da biodiversidade do RS. (Foto: Maia Rubim/Sul21)

Coleções científicas de várias espécies de animais

O Museu de Ciências Naturais conta com coleções de insetos, aranhas, répteis, peixes e várias outras espécies que, assim como ocorre no caso das coleções de flora, são um registro da história da biodiversidade do Rio Grande do Sul. “Essas coleções possuem animais que vem sendo coletados desde as décadas de 40 ou 50. Temos casos como o do peixe elétrico do Rio Grande do Sul e de uma coral verdadeira que foi coletada nos altos da rua Coronel Bordini, em Porto Alegre, há algumas décadas”, assinalam os biólogos Patrick Colombo, Vinicius Bertaco e Roberto Oliveira, que trabalham com essas coleções.

O Museu possui a terceira maior coleção de aracnídeos do Brasil, com mais de 1.200 espécies, sendo 800 delas do Rio Grande do Sul. O biólogo Ricardo Ott, responsável por essa coleção, manifesta preocupação com o destino da mesma, caso a fundação seja extinta. “Esses potes precisam de manutenção de três em três meses pelo menos. Quem é que vai cuidar disso? Todo esse acervo vai acabar sendo jogado fora”, adverte.

Produção de soro antiofídico

A Fundação Zoobotânica é a única instituição da Região Sul do Brasil que fornece veneno ao Instituto Vital Brazil, do Rio de Janeiro, produtor de soro antiofídico. O serpentário da Fundação tem mais de 300 cobras. Essa parceria tem algumas características peculiares. O veneno das cobras cascaveis gaúchas possui um componente em concentração superior à encontrada em cobras similares que vivem em outras regiões do país. Isso permite à produção de um soro antiofídico capaz de responder a esse veneno mais potente. “No Rio Grande do Sul, ocorrem entre 800 e 900 acidentes envolvendo picadas de cobras por ano. A ausência de casos fatais se deve à existência de uma rede de postos dotados de soro bem distribuídos pelo Estado”, destaca Roberto Oliveira.

A Fundação Zoobotânica é a única instituição da Região Sul do Brasil que fornece veneno ao Instituto Vital Brazil. (Foto: Maia Rubim/Sul21)

A Fundação Zoobotânica é a única instituição da Região Sul do Brasil que fornece veneno ao Instituto Vital Brazil.
(Foto: Maia Rubim/Sul21)

Coleção de insetos com bioindicadores de qualidade ambiental

O Museu de Ciências Naturais conta também com uma coleção de insetos que é utilizada para pesquisas no Brasil e no Exterior. “Esse acervo é utilizado para diferentes tipos de pesquisa. Temos espécies de besouros que são pragas na agricultura e espécies de borboletas e besouros que são bioindicadores de qualidade ambiental”, diz o biólogo Luciano Moura, curador dessa coleção. “Isso aqui não é minha profissão, é minha paixão”, afirma ainda o pesquisador lamentando a intenção do governo do Estado de extinguir com a Fundação.

Coleção de algas e controle de algas na água

A coleção de algas do Herbário Prof. Dr. Alarich R.H. Schultz (HAS) possui espécies coletadas em vários sistemas hídricos de água doce do Rio Grande do Sul e realiza o estudo taxonômico e ecológico destas algas, fornecendo subsídios para o controle e conservação da qualidade da água consumida pela população. O herbário conta ainda com uma ainda, com uma coleção viva de cianobactérias, mantidas em meios líquidos e sólidos no Banco de Culturas da Seção de Botânica de Criptógamas, no Museu de Ciências, tendo como curadora a bióloga Vera Regina Werner. “Somos o único instituto do Rio Grande do Sul que realiza esse tipo de controle da água. É um trabalho muito importante porque a presença de cianobactérias na água pode produzir toxinas perigosas, além de mau cheiro.

“Somos o único instituto do Rio Grande do Sul que realiza controle de cianobactérias na água", diz a a bióloga Vera Regina Werner. (Foto: Maia Rubim/Sul21)

“Somos o único instituto do Rio Grande do Sul que realiza controle de cianobactérias na água”, diz a a bióloga Vera Regina Werner.
(Foto: Maia Rubim/Sul21)

Coleção de fósseis e pesquisa paleontológica

O trabalho desenvolvido pela Seção de Paleontologia da Fundação Zoobotânica está focado na pesquisa e divulgação científica relacionados à paleontologia, principalmente do Rio Grande do Sul. Também atua na formação de pesquisadores com alunos de iniciação científica, mestrado e doutorado. Além disso, faz avaliação de sítios fossilíferos no Estado, que atraem hoje a atenção de pesquisadores do mundo inteiro, especialmente na região da Depressão Central do Estado. A seção possui uma coleção de 15 mil espécies. “O que mais nos assusta é o que vai acontecer com todo esse material. A Secretaria do Meio Ambiente não tem, hoje, pessoal capacitado a cuidar desse acervo”, diz a paleontóloga Ana Maria Ribeiro, curadora da coleção de fósseis. “Esses fósseis são propriedade da União. Nós somos apenas fieis depositários deles. Eles não têm ideia do patrimônio científico que existe aqui dentro”, acrescenta o paleontólogo Jorge Ferigolo.

Galeria de imagens:

Foto: Maia Rubim/Sul21

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Paleontólogos Jorge Ferigolo e Ana Maria Ribeiro alertam para destino do acervo de fósseis. (Foto: Maia Rubim/Sul21)

Paleontólogos Jorge Ferigolo e Ana Maria Ribeiro alertam para destino do acervo de fósseis. (Foto: Maia Rubim/Sul21)

"Isso aqui não é minha profissão, é minha paixão”, diz biólogo Luciano Moura. (Foto: Maia Rubim/Sul21)

“Isso aqui não é minha profissão, é minha paixão”, diz biólogo Luciano Moura. (Foto: Maia Rubim/Sul21)

"Esses potes precisam de manutenção de três em três meses pelo menos. Quem é que vai cuidar disso?" - questiona o biólogo Ricardo Ott. (Foto: Maia Rubim/Sul21)

“Esses potes precisam de manutenção de três em três meses pelo menos. Quem é que vai cuidar disso?” – questiona o biólogo Ricardo Ott. (Foto: Maia Rubim/Sul21)

 Foto: Maia Rubim/Sul21

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