A hipocrisia do Judiciário

A hipocrisia do Judiciário

Luis Fernando Verissimo: A hipocrisia do Judiciário

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Quando se começa a chamar até um sistema judiciário de hipócrita, outros epítetos virão. Vivemos hoje, no Brasil, à beira de um cinismo terminal.

Luis Fernando Verissimo em 19/2/2017

O ministro Celso de Mello tem razão. O ministério dado pelo Temer ao Moreira Franco em nada se parece com o cargo que a Dilma queria dar ao Lula. A principal diferença é que o Temer inventou um ministério exclusivamente para acolher o amigo. Alvejou duas coisas com um decreto só: a ética e a austeridade propagada pelo seu governo. O codinome do Moreira Franco na Polícia Federal é “Angorá”, e Temer o tratou com o carinho que só um bicho de muita estimação merece. O que não deixou de ser bonito, como qualquer manifestação de amizade.

Na sua sentença, o ministro Celso de Mello disse que o foro privilegiado presenteado ao Moreira Franco não impede que ele sofra processos. Esqueceu-se de mencionar que o foro privilegiado beneficia os investigados com a protelação dos processos, o que, na maioria dos casos julgados pelo Supremo, resulta em prescrição ou repasses a instâncias inferiores, ou o desaparecimento. Matéria publicada em O Globo sobre o assunto, há dias, mostra que a condenação de julgados com foro especial ocorre em apenas 0,74% dos casos. Menos de um por cento! Não se acuse o respeitável ministro Celso de Mello de hipocrisia. Hipócrita é o sistema que permitiu que se chegasse a essa deformação.

Minha anedota favorita: há anos fez muito sucesso um bolero chamado “Hipócrita”. Um bêbado entra numa boate onde se apresenta um cantor. A plateia pede insistentemente que o cantor cante o bolero da moda, gritando “Hipócrita!”, “Hipócrita!”, “Hipócrita!”. O bêbado salta da sua cadeira e também começa a gritar “Filho da mãe!”, “Cretino!”. Está bem, a anedota não é tão boa assim. Eu só queria dizer que quando se começa a chamar até um sistema judiciário de hipócrita, outros epítetos virão. Vivemos hoje, no Brasil, à beira de um cinismo terminal, que aumenta cada vez que um Jucá, um Padilha, um Eunício Oliveira, um Rodrigo Maia um etc. abre a boca. A desmoralização da classe política no Brasil levará algumas gerações para ser sanada, no futuro.

Mas talvez nosso futuro não seja o desejado. Jair Bolsonaro vem aí. Ele foi o segundo colocado, depois do Lula, numa pesquisa recente sobre intenção de voto em 2018. Bolsonaro presidente? Impensável, claro. Como a eleição de Trump nos Estados Unidos. Que você viva em tempos interessantes é o que os chineses desejam ao pior inimigo.


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