Cesta básica e educação

Cesta básica e educação

A distribuição de cestas básicas para a população de baixa renda, no Brasil, é motivo de debate em muitos ambientes. Nas salas de professores também. Ouço muitos comentários, sobretudo acerca de não se dar o anzol, e sim o peixe, o que provoca o aumento da indolência e da dependência. Outros afirmam que o programa é tipicamente partidário e populista, com influência possível em eleições. É bastante comum encontrarmos professores que questionam uma acomodação aos valores distribuídos, em vez das pessoas procurarem trabalho, e outros que recriminam o abandono da escola por parte de crianças que só fazem matrícula para receber o benefício.

Creio que muitos aspectos merecem uma avaliação mais profunda. Esse modelo de programa de ajuda à população carente não é brasileiro nem de partido político desse País. É baseado em um programa do Banco Mundial. No México, por exemplo, é aplicado há vinte anos. Nós não temos tempo, no Brasil, para uma avaliação do grau do impacto do programa na educação, porque os beneficiários diretos – as crianças – não chegaram ainda ao mercado de trabalho, como ocorre no México. Conforme a região ou o país, os resultados são diferentes e aplicados com objetivos também diversos. Segundo o próprio Banco Mundial, na Turquia houve uma aplicação somente na região leste daquele país, onde a população é tradicionalmente religiosa e não se costuma enviar as meninas à escola. Como o programa exige a matrícula e a presença às campanhas de vacinação, a frequência de meninas nas escolas cresceu de 20% para 65%. Em longo prazo, isso representará uma mudança estrutural na formação da população, com possível libertação da mulher participante da vida escolar.

Como o dinheiro é distribuído às mães de família, no Brasil há uma mudança social significativa, uma vez que a autoridade materna aumenta pelo fato de ela ter o controle do cartão-benefício. O México já apresenta pesquisas sobre o perfil do novo trabalhador, que chega ao mercado mais bem preparado por causa da frequência à escola e da melhor alimentação, sobretudo na infância. O Banco Mundial ainda não consegue fazer uma avaliação dos programas existentes na África. A Índia, um dos países parceiros dos Brics (grupo formado também pelo Brasil, pela Rússia, pela China e pela África do Sul), está organizando uma distribuição de cestas para a população de extrema pobreza, o que corresponde a três vezes a população brasileira: seiscentos milhões de habitantes. No contexto asiático, uma simples análise poderá indicar que, se essas cestas básicas evitarem as migrações internas e externas, será atingido um excelente objetivo. Imaginemos movimentos migratórios de seiscentos milhões de famintos naquela região.

A questão, portanto, é muito mais ampla. O que a escola precisa fazer é informar o mais breve possível aos órgãos competentes sobre a ausência das crianças à escola. Nós não podemos contar com o apoio das famílias, visto que a visão da necessidade da educação por parte da maioria dos beneficiados é muito tênue, por causa do contexto histórico em que viveram e vivem.

No entanto, se a escola for uma aliada dos mecanismos governamentais, as crianças serão beneficiadas com mais educação, o que representará para elas e para o País uma possível e necessária transformação, tendo em vista um futuro em que a força de trabalho deverá ser mais bem preparada por causa da grande quantidade da população brasileira que comporá a terceira idade.

A nossa escola pública precisa entender essa complexidade.

 

Artigo publicado na edição de julho de 2014.

http://www.profissaomestre.com.br/index.php/colunistas-pm/hamilton-werneck/974-cesta-basica-e-educacao-pros-e-contras

 




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