Que tipo de pressa nos interessa?

Que tipo de pressa nos interessa?

Luiz Araujo

 

Hoje, durante a sessão da Comissão de Constituição e Justiça do Senado se instalou uma polêmica no seio dos parlamentares de das entidades presentes sobre a justeza de votar logo ou não o relatório apresentado.

A liderança do PT lançou uma nota com o seguinte teor:

Um esforço político para acelerar a definição do Plano Nacional de Educação (PNE) - PLC 103/2012 - garantiu a leitura do relatório do senador Vital do Rêgo (PMDB-PB) na reunião da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, nesta quarta-feira (19). A ideia era aprovar o texto para que ele pudesse ser apreciado com urgência pela comissão encarregada de analisar o mérito da matéria: a Comissão de Educação (CE). A CCJ é encarregada de analisar se a matéria é ou não constitucional. Mas a tentativa de agilizar a tramitação acabou barrada pelo senador Randolfe Rodrigues (PSOL-AP), que pediu prazo (vistas) para analisar o relatório. A votação para semana que vem.

Cabe aprofundar este debate:
 

1. Em junho, como resposta às manifestações dos jovens brasileiros, o presidente do Senado fez um acordo para agilizar a tramitação do Plano Nacional de Educação, que havia completado um ano de tramitação na Casa. O acordo previa a apresentação do relatório do Senador Vital do Rego na CCJ na semana seguinte, audiência pública na subsequente e votação na Comissão de Educação em seguida. Como todos sabem "não houve recesso" oficial, mas o Senado e a Câmara desaceleraram suas atividades (sempre é possível fazê-lo!!).

2. O governo, que não controla a Comissão de Educação, dirigida pelo PSDB e onde o PNE terá como relator o tucano Álvaro Dias, ensaiou nos bastidores segurar a tramitação até mudar comando da referida Comissão ou então conseguir a adesão dos líderes para levar o projeto direto para o plenário sem análise da comissão de mérito.


3. O senador Vital do Rego chegou a inserir o seu relatório no sistema público de consulta (03 de julho), mas em seguida o retirou, sem dar explicações para este gesto inusitado. Ou seja, havia um relatório pronto há exatos 77 dias.


4. Hoje, por volta de 9:30 min, o relator protocolou o seu relatório. Ou seja, os parlamentares só tiveram conhecimento do teor dele quando já estavam na reunião ordinária da CCJ. E começou uma pressão do governo para votar de qualquer jeito o texto. O referido relatório é composto de 82 páginas.


5. Usando o seu direito de ler e fazer juízo de valor sobre o que é votado no parlamento, o Senador Randolfe Rodrigues (PSOL/AP) pediu vistas, procedimento que adia a votação por 5 dias. Como outros parlamentares também o acompanharam, obrigatoriamente a matéria estará na pauta na quarta-feira que vem.


Acho risível a nota da liderança do PT (do governo, não esqueçamos!) afirmar que o pedido de vistas impediu a celeridade da tramitação. A culpa do PNE não andar no Senado é do governo, pois ele tem maioria nas comissões e quando lhe interessa as matérias tramitam com velocidade alucinante.


Mas pergunta que deve ser feita é a seguinte: por que será que o governo foi acometido de tão saudável pressa?


1º. Por que o relatório do senador Vital atende aos desejos mais profundos do governo, mantendo a redução dos recursos obrigatórios para investimento público na rede pública;


2º. Por que o relatório enfraquece o pouco que se tinha avançado na materialização do pacto federativo;


3º. Por que o conhecimento do inteiro teor do texto pode aumentar a resistência a sua aprovação e votá-lo sem leitura prévia seria uma forma de "agilizar" os interesses governamentais.


Eu sou um ardoroso defensor de mais breve aprovação do PNE, mas antes de tudo, luto por um Plano Nacional de Educação que seja pra valer, que destine mais recursos para a educação, que comprometa o poder público com percentuais de crescimento da oferta no ensino profissional e superior, que consagre o custo aluno qualidade como referência do financiamento educacional,  dentre outras providências.


Neste caso, vale o ditado popular: a pressa é inimiga da perfeição e levaria mais rápido o texto do PNE a perdição.

 

Às favas com a voz das ruas

Depois de ler atentamente as oitenta e duas páginas do Relatório do Senador Vital do Rego ao PLC 103 de 2012, que estabelece o novo PNE, me veio a cabeça nominar este post da forma acima.

O PNE vai completar aniversário de três anos em dezembro e já completou um ano de tramitação no Senado Federal. A sua única votação, realizada na Comissão de Assuntos Econômicos, foi feita um pouco antes das manifestações de junho, ou seja, em momento em que o governo "pintava e bordava" e não precisava prestar contas com o povo brasileiro sobre o que fazia.

A expectativa era que, da mesma forma que vários projetos saíram da gaveta e foram pautados pelo parlamento após as manifestações, o vento que soprou das ruas mudasse de rumo o debate do Plano Nacional de Educação. eu também comunguei deste otimismo. Mas, ao ler o relatório da CCJ, tenho que admitir que a capacidade  do governo e dos parlamentares de esquecerem dos desejos das ruas é imenso, quase infinito.

O Senador Vital do Rego conseguiu a proeza de piorar ainda mais o que havia sido aprovado na Comissão de Assuntos Econômicos. De maneira resumida:

1. Reforça a estratégia governista de inserir nos 10% do PIB tudo que é aplicado de dinheiro público com a iniciativa privada. Ele aperfeiçoou a redação, deixando explícito que além dos recursos gastos na rede pública, entrarão na conta:

a)os programas de expansão da educação profissional e superior, inclusive na forma de incentivo e isenção fiscal,

b) as bolsas de estudos concedidas no Brasil e no exterior,

c) os subsídios concedidos em programas de financiamento estudantil

d) o financiamento de creches, pré-escolas e de educação especial na forma do art. 213 da Constituição Federal.

2. Em nome da preservação do pacto federativo o relator retirou a obrigação de que ocorram Conferências Municipais e Estaduais antes da Conferência Nacional de Educação.

3. Retirou  o prazo de um ano para a confecção dos planos estaduais e municipais de educação. Agora, em tese, podem ser feitos até o último dia de vigência do novo plano.

4. Retirou o prazo de dois anos para que estados e municípios estabelecessem a regulamentação da gestão democrática.

5. Retirou a obrigação do Executivo enviar até o primeiro semestre do nono ano o Projeto de Lei do próximo plano.

6. Retirou o prazo de dois anos para que o governo institua o Sistema Nacional de Educação.

7. Ele apresenta uma nova redação a Meta 4, expressando o "acordo" de parte das entidades da sociedade civil com o governo e Apaes, segundo a qual enfraquece a prioridade de atendimento inclusivo dos portadores de deficiência.

8. Retira do texto a estratégia que previa complementação da união para estados e municípios que não alcançassem o valor do custo aluno qualidade inicial. E manteve o termo "definir o CAQ" ao invés de "implantar o CAQ" em dois anos.

Além destas mudanças descritas acima, o relator não mexeu nas principais imperfeições introduzidas pela Emenda Substitutiva aprovada na CAE, especialmente:

1. Manteve a retirada do avanço conquistado na Câmara dos Deputados de que expansão das matrículas do ensino profissional deveriam ser 50% públicas.

2.  Manteve a retirada do avanço conquistado na Câmara dos Deputados de que expansão das matrículas do ensino superior deveriam ser 40% públicas.

3. Manteve a supressão da palavra 'pública" na meta 20, retirada que derrubou a destinação de 10% do PIB para a rede pública e inseriu todos os penduricalhos de desvio de recursos públicos para escolas privadas.

Considero que a única forma da voz das ruas não serem jogadas às favas é elas se fazerem ouvir e com força. E urgentemente! 

http://rluizaraujo.blogspot.com.br/




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